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ASPECTOS LÉXICOS, MORFOLÓGICOS E
MORFOSSINTÁTICOS DO FALAR CEARENSE.
Lorena da Silva Rodrigues1 (UFC)
RESUMO: As peculiaridades dos falares regionais brasileiros é sempre objeto de estudo acerca da
linguagem, sobretudo no que diz respeito à Dialetologia, uma vez que marcam no sistema linguístico
traços socioculturais de cada uma das comunidades linguísticas a que se refere um dado modo de falar.
Um exemplar desses falares é o falar cearense, conhecido popularmente como cearês, o qual será objeto
de análise deste artigo. A pesquisa sobre o falar cearense, conforme Aragão (2005), é caracterizada por
abordar, muita vezes, o folclore cearense; por serem pautadas em obras regionalistas, em textos de
cantadores ou poetas populares; ensaios, estudos e elaboração de dicionários entre outros. Sabendo disso,
nossa pesquisa se propõe analisar traços léxicos, morfológicos e morfossintáticos da fala do Ceará, a
partir da coleta e análise de quatro textos humorísticos que circulam pela internet e caracterizam o
indivíduo cearense por seu falar. Apesar de uma “globalização” da linguagem provocada pelo grande
acesso à informação pelos meios de comunicação em massa, acreditamos que algumas marcas
permaneçam como característica própria do povo cearense, como o uso de expressões de caráter
intensificador, expressões adverbiais e marcadores discursivos e elementos fonológicos peculiares.
Palavras-chave: Falar cearense, aspectos léxicos, aspectos morfológicos e aspectos morfossintáticos.
ABSTRACT: The peculiarities of the Brazilian regional dialects is always an object of study of the
language, especially with regard to Dialectology, since they mark the sociocultural linguistic system
features of each language communities referred to as a way of speaking. A copy of these dialects is
speaking Ceará, popularly known as cearês, which will be analyzed in this article. Research on the talk
Ceará, as Aragon (2005), is characterized by address, many times, folklore Ceará, to be guided in
regionalist works on texts by popular singers or poets, essays, studies and preparation of dictionaries and
more. Knowing this, our research aims to analyze traces lexical, morphological and morphosyntactic
speech of Ceará, from the collection and analysis of four humorous texts that circulate on the internet and
characterize the individual Ceará by his talk. Although "globalization" of language caused by greater
access to information by means of mass communication, we believe that some brands remain as
characteristic of the people of Ceará, as the use of expressions of character enhancer, adverbial
expressions and discourse markers and phonological elements peculiar.
Keywords: Talking Ceará, lexis aspects, morphology aspects and morphosyntactic aspect.
1. Introdução
No Brasil, a língua falada pela maioria da população é o português, entretanto,
esse português apresenta um elevado grau de variabilidade por conta de diferenças
regionais, sociais, de registro, etárias, entre outras. Dessa forma, ouve-se falar em
“dialeto caipira”, “mineirês”, “falar cearense” etc.
Dentro dessa realidade linguística brasileira, destacamos o peculiar “falar
cearense” com suas características fonético-fonológicas, morfossintáticas, semânticas e
1 Mestre pelo Programa de Pós-graduação em Linguística da Universidade Federal do Ceará e
professora da SEDUC – CE.
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lexicais próprias, as quais são alvo de diversos estudos como os de Alencar (1997),
Aragão (2005) e Monteiro (2009).
Com base nesses estudos, este artigo propõe-se a estudar os aspectos léxicos do
falar cearense em texto2 de circulação nacional que caracterizam o sujeito cearense a
partir de seu falar. Atualmente, com uma “linguagem globalizada” é provável que os
traços linguísticos de uma região ocorram em outras. Contudo, alguns dos traços dos
autênticos cearensismos, mostram-se passíveis de análise por suas particularidades. Por
fim, produziremos um breve glossário, a partir da análise de nosso corpus.
2. Língua, dialeto e falar
Para se chegar à caracterização do falar cearense, é necessária a conceituação de
língua, dialeto e falar, termos-chave nos estudos dialetais.
Historicamente, os seres humanos organizam-se em sociedade através de um
sistema de comunicação de base fundamentalmente oral, ou seja, através da língua.
Desta inter-relação entre língua e sociedade, concebe-se a língua como um sistema
diversificado e variável do mesmo modo que os falantes também são diversificados
social, cultural e geograficamente.
Uma língua apresenta pelo menos três tipos de diferenças internas, a saber:
Diferenças no espaço geográfico ou variação diatópica;
Diferenças entre estratos sociais ou variação diastrática;
Diferenças entre os tipos de registro ou variação diafásica.
A esses três tipos acrescentamos as diferenças etárias ou variação diacrônica e
as diferenças convencionadas a partir de inúmeros gêneros textuais ou variação
diamésica.
Segundo Cunha e Cintra (1985), somente a partir da concepção de língua com
um diassistema, isto é, sistemas linguísticos, no qual se correlacionam diversos sistemas
e subsistemas:
Tornou-se possível o esclarecimento de numerosos casos de polimorfismo, de
pluralidade de normas e de toda a inter-relação dos fatores geográficos,
2 Os textos serão descritos em seção a seguir referente à metodologia.
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históricos, sociais e psicológicos que atuam no complexo operar de uma língua
e orientam sua deriva. (p.3).
Dentro de suas variações geográficas, observam-se as unidades sintópicas,
comumente, identificadas com dialetos. Assim, de um modo geral, os dialetos são
conceituados como as formas características de uma língua regional. (CUNHA E
CINTRA, 1985). Entretanto, alguns linguístas diferenciam as unidades sintópicas em
dialetos e falares.
Para os lingüistas que fazem essa diferença, dialeto seria “as estruturas
linguísticas, simultânea de outra, que não alcançam a categoria de língua”.
(ALVAR,1961 apud CUNHA E CINTRA, 1985, p.4). Já falar corresponderia a um
subsistema “de traços pouco diferenciados, mas com matizes próprias dentro da
estrutura regional a que pertencem cujos usos estão limitados a pequenas circuncisões
geográficas”. (Idem, ibidem).
A partir dessa diferenciação, ao tratarmos da diversidade do português brasileiro,
adotaremos o conceito de falar para as unidades sintópicas.
3. Algumas considerações sobre o falar cearense
O falar cearense mostra-se altamente produtivo com várias expressões de caráter
intensificador que, segundo Monteiro (2009), funcionam como se formassem o grau
aumentativo ou superlativo no caso dos substantivos e adjetivos. Assim temos
expressões como “calor de rachar o quengo” equivalendo a “calorão” ou “calor muito
forte” (MONTEIRO, op. cit., p.23).
Observam-se ainda expressões adverbiais e marcadores discursivos, revelando
uma motivação semântica de acordo com o propósito comunicativo expressivo. A
exemplo disso, têm-se expressões como “lá na baixa da égua” e “pense”.
Outra marca do falar cearense que merece destaque são suas características
fonológicas3 segmentais e supra-segmentais. Uma vez que o cearense é conhecido por
“falar cantando” e por traços como a transformação da fricativa surda em laringal, a
exemplo de “rei”, “corra” e “mermo” e da supressão, a exemplo de “fulerage”.
3 Os traços fonológicos não serão contemplados nessa pesquisa, a não ser nos em que esses
fenômenos forem essenciais para a compreensão de algum vocábulos.
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Para a melhor caracterização dos vocábulos que estruturam o falar cearense,
destacaremos, a seguir, aspectos morfológicos e lexicais, assim como aspectos
morfossintáticos.
3.1. Aspectos morfológicos e lexicais
Segundo Monteiro (2009, p. 26 e 27), merecem destaque, no campo morfológico
e lexical do falar cearense, fenômenos poucos freqüentes em outras regiões do país
como:
A formação de verbos derivados por sufixação a partir de bases nominais, a
exemplo de assuntar etc;
A aplicação do sufixo diminutivo, com valor afetivo, em bases não
nominais, a exemplo de aquelezinho, dormidinho (ou dormindinho);
A alternância entre as formas –inho e –im, esta última bem mais frequente, a
exemplo de livrim, bichim, sozim;
O emprego dos prefixos –in e –a com valor protético, a exemplo de
intropicão (“tropeção”), intropicar (“tropeçar”), abastar;
A formação de verbos mediante acréscimo de prefixo e sufixo, a exemplo de
desmastrear (“humilhar”, “derrubar”);
O uso do sufixo aumentativo para formar adjetivos a partir de verbos, a
exemplo de poupão (“boi que se poupa”);
A permuta de sufixos para atribuição de valor pejorativo, a exemplo de
cafedório, poveiro, piauizeiro, paroara, ceariba;
A derivação sufixal a partir de sintagmas, a exemplo de semodagem (de
“sem modos”), semancol (de “se mancar”), caradurismo (de “cara dura”);
A formação de adjetivos mediante derivação regressiva, a exemplo de
estrompa (“sujeito violento”);
A flexão de gênero para substantivos ou adjetivos normalmente de gênero
único, a exemplo de diaba, peixa, cearensa;
Uma grande quantidade de termos alterados ou produzidos com intuito
expressivo, a exemplo de chubata, lagalhé (“pessoa ínfima e desprezível”),
coxia (“sarjeta”), bribado (de “briba”, por “víbora”), escalafobético,
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dismilinguir, canelal, figança, alvação (“gado branco”), manhecença, bodete
(diminutivo de “bode”), soltura (“diarreia”), mamimolência, estrovenga,
bafafá, espritado, nhenhenhém, fulustreco etc.
3.2. Aspectos morfossintáticos
Nesse campo, constam-se construções que tomadas em conjunto define a
particularidade do falar cearense. Sobressaindo um vasto repertório de frases feitas ou
expressões gramaticalizadas, a exemplo de:
“ter de um tudo”
“botar banca”
“arre égua!”; “arre diabo!”
“andar nos trinques”
“desembuche”
Além dessas expressões, cabe ressaltar duas características sintáticas:
O advérbio de negação depois do verbo: “carece não”.
A reiteração do advérbio de negação: “Não vou não”.
4. Metodologia
Para esta análise, foram selecionados quatro humorísticos que caracterizam o
cearense através de seu falar. Textos esses que circulam pela internet e ganham
destaque por seu caráter humorístico.
Os textos escolhido foram: Conselhos cearenses para 2009, Homenagem de
Fortaleza, Cearês e Cada lugar tem seu jeito de roubar, reproduzidos a seguir.
Optamos por utilizar a grafia original do texto quando essa reflete algum traço
fonológico do falar cearense.
Texto 1:
"Conselhos" de cearense para 2009
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1. Você já é um cagado por estar vivo, pense nisso e agradeça a Deus,
2. Não fique arrudiando para estar junto de quem você gosta, se avexe...
3. Não bote boneco no trabalho, seja paciente, pois...
4. Pra você ficar estribado é preciso trabalhar, não fique frescando, respeita a
poliça, com os colegas, funcionário que não dá um prego numa barra de sabão não fica
não, mas....
5. Se você tiver mesmo a fim de sair porque não agüenta mais aquele seu chefe véi
fulerage, aquele cabra que te deixa fumando numa quenga, tenha calma pois não
adianta ficar ispritado porque ele não reconhece que você rala o bucho no trabalho, vá
procurar algo melhor e cape o gato na hora H,
6. Mesmo que seus objetivos estejam lá na baixa da égua, vale a pena buscá-los e dê
uma rabiçaca para os maus pensamentos, pois pra gente conseguir o que quer tem é Zé...
7. Dê um desconto para aquele cabra que só bate fofo com você, vale a pena investir
pois de tanto insistir pode nascer um bruguelo ou um minino réi amarelo,
8. Quando quiser algo, seja o cão chupando manga e vá em frente, não desista e dê
uma pinóia pros maus pensamentos,
9. Você é um(a) corralinda, é importante que você ame a si próprio.
10. Não vá bulir em coisa que tá dando certo, deixe quieto, pois de tanto coisar com
uma, coisar com outra, vc pode ganhar um chapéu de touro, seu mói de chifre!! e se
quiser matar o verme, procure o doidim/doidinha que está a seu lado...porém se....
11. Você ainda não tem ninguém, não pegue qualquer marmota, escolha uma
corralinda igual a você, e não rebole no mato as boas oportunidades,
12. Pras vitalinas (aquelas que o cabra não pode nem triscar que já ficam igual a uma
barata num bico de uma galinha) fiquem pastorando até encontrar alguém pai dégua,
não escolha um cabra peba ou malamanhado, o segredo é pelejar e não desistir, não
peça pinico e deixem quem quiser mangar, um dia seu machoréi vai encontrar,
13. Não fique batendo o quengo pensando em besteira, tenha pensamentos positivos e
diga: Sai mundiça !!!
14. Se algo não sair como você planejou, não fique de lundu, saia com aquele magote
de amigos seus pra tomar um merol ou uma meiota,
15. E na noite da entrada do ano, coma aquela gororoba prá dar sorte até encher o
bucho, mas não demais senão dá gastura, ah! não esqueça do grito de guerra pra dar
mais sorte ainda: Queima raparigal !!!!!
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16. Aí é torcer que 2009 vai ser só o mi disbuiado e respeite como ele vai ser bom!!
Texto 2:
Homenagem a Fortaleza
Pense numa cidade pai d'égua!
O ano todo com um calor de rachar o quengo.
Toda noite tem comédia e o povo é bonequeiro que só!
Tá pra nascer quem é de Fortaleza que não é amancebado com esse lugar.
Tem é zé prum cabra conhecer aqui e depois querer capar o gato.
Pode ser liso, estribado, vir de perto ou lá da baixa-da-égua.
Qualquer um fica arriado os quatro pneu quando vê as praias daqui.
Fica logo todo breado de areia, depois se imbioca no mar e num quer mais sair nem a
pau.
Depois de conhecer a negrada, então, vixe!
Se a cidade é boa assim, avalie o povo!
Tem gente de todo jeito: do fresco ao invocado, do batoré ao galalau, dos
gato réi às ispilicute, do cabra-macho ao fulerage e muitas outras marmotas.
Bom que nem presta. É por isso que nas férias dá uma ruma de turista tudo
doido por uma estripulia , porque sabem que Fortaleza não é de se rebolar no mato.
Só precisa dar um grau ou uma guaribada aqui ou ali, mas, mermo assim, tá de
parabéns.
Arre égua, ô corra linda, mah , essa cidade!
(Assis Coelho)
Texto 3:
Cearês
Cearense não briga... ele risca a faca!
Cearense não vai em festa... ele vai raparigar!
Cearense não vai embora... ele vai pegá o beco!
Cearense não bebe um drink... ele toma uma!
Cearense não joga fora... ele rebola no mato!
Cearense não discute... ele bota boneco!
Cearense não é sortudo... ele é cagado!
Cearense não corre... ele faz carrera!
Cearense não ri... ele se abre!
Cearense não brinca... ele fresca!
Cearense não compra garrafinha de cachaça... ele compra um celular!
Cearense não toma água com açúcar... ele toma garapa!
Cearense não calça as sandália.... ele calça as opercata!
Cearense não exagera... ele alopra!
Cearense não percebe... ele dá fé!
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Cearense não vigia as coisas... ele pastora!
Cearense não sai apressado... ele sai desembestado!
Cearense não agarra a mulher... ele arroxa!
Cearense não dá volta... ele arrudêia!
Cearense não espera um minuto... ele espera um pedaço!
Cearense não é distraído... ele é ariado!
Cearense não fica encabulado... ele fica todo errado!
Cearense não comete gafe... ele dá uma rata!
Cearense não sobe na arvore... ele se trepa no pé de pau!
Cearense não passa a roupa... ele engoma a roupa!
Cearense não ouve barulho... ele ouve zuada!
Cearense não acompanha casal de namorados... ele segura vela!
Cearense não dá cantada... ele quêxa!
Cearense não é esperto... ele é desenrolado!
Cearense não é rico... ele é estribado!
Cearense não é homem... ele é MAXO!
Texto 4:
Cada lugar tem seu jeito de roubar
(...)
ASSALTANTE CEARENSE
Ei Macho, isso é um assalto!
Deixe de marmota, arriba os braços, não se bula nem faça mungango.
Bora logo abestado, me dê logo a céda que eu sei que tu tá estribado.
E num bote boneco não, senão eu papoco uma mãozada no teu
pé-do-ouvido! Arriégua, só isso! Penseeeee num fi-duma-égua liso!
Agora vai, vai, vai timboooora carniça. Pega o beco, pega o beco!
5. Expressões do falar cearense
Abestado: abobalhado
Aloprar: exagerar
Ariado: distraído, desnorteado
Arri égua: interjeição que indica espanto
Arribar: levantar
Arrudiar: fazer rodeios; não ser direto
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Arroxar: agarrar alguém
Atrepar: subir
Avexar-se: apressar-se
Bater fofo: deixar na mão
Batoré: pessoa baixa
Botar boneco: fazer confusão
Breado: suado.
Bulir: mexer em algo
Cabra: homem
Calor de rachar o quengo: calor muito forte
Capar o gato: ir embora
Cão chupando manga: algo muito feio ou muito ruim
Céda: Cédula, dinheiro
Celular: garrafa de cachaça
Corra linda: coisa linda
Dar fé: perceber
Dar uma rata: cometer uma gafe
Desembestar: apressado, atrapalhado
Desenrolado: esperto
Doidim (doidinha): pessoa sem muita importância
Engomar: passar roupa
Esperar um pedaço: esperar algum tempo
Espilicute: (Do inglês spiel cute) pessoa que conversa de forma esperta; menina
“descolada”
Estribado: rico
Fazer Carrera: correr
Fi duma égua: xingamento equivalente a filho de uma égua.
Ficar de lundu:
Ficar todo errado: ficar sem graça
Frescar: tirar sarro
Fulerage: alguém ou algo que não presta
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Fumando uma quenga: raivoso
Galalau: pessoa alta
Garapa: água com açúcar
Gato réi: mulher fácil
Invocado: com raiva, irado
Ir raparigar: sair para festa
Ispritado: enfurecido
Liso: sem dinheiro
Magode: grande quantidade
Malamanhado: desajeitado, mal arrumado, desengonçado
Mangar: rir, fazer chacota
Macho (mah): homem
Marmota: desajeitado, mal arrumado, desengonçado
Matar o verme: saciar a vontade
Meiota: meio litro de cachaça
Minino réi amarelo: criança. Utilizado para se referir à coisas própria da
imaturidade infantil.
Mói de chifre: corno
Mundiça: diz-se de alguém de baixa qualidade
Mungango: desengonçado
Não dá um prego numa barra de sabão: ser preguiçoso
Negrada: turma
Nem a pau: de modo algum
Opercarta: sandália
Pai d’égua: muito bom
Papocar: estourar
Pastorar: vigiar
Pé de pau: árvore
Pedir penico: dar-se por vencido
Peba: muito ruim
Pegar o beco: ir embora
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Pelejar: tentar fazer algo
Pense: marcador discursivo
Queima raparigal: Grito de guerra, incentivo para as meninas agitarem
Quêxar: dá uma cantada
Rabissaca: virar o rosto em gesto de desprezo
Ralar o bucho: suar, dançar
Rebolar no mato: jogar fora
Respeitar o poliça: ter respeito por uma autoridade
Risca faca: briga
Se abrir: rir
Ser cagado: ter sorte
Só o mi disbuiado:
Tem é Zé: difícil. Expressão adverbial para dimensionar o grau de dificuldade
de algo.
Véi fulerage: ruim
Vitalino: pessoa que não casou
Zuada: barulho
6. Considerações finais
Observamos que a variação diatópica é bastante produtiva no Ceará. Dessa
forma, expressões como “botar boneco” e “rebolar no mato” tão comuns em todo o
estado, independente de variáveis como sexo, idade, grau de escolaridade ou classe
social.
Além de uma grande variação lexical, esse falar apresenta distinções relevantes
em aspectos morfológicos e morfossintáticos, como ilustrado anteriormente.
Entretanto, cabe ressaltar que atualmente, os traços de uma região ocorram em
outra. Mesmo assim, os termos pertencentes ao autêntico falar cearense continuam em
destaque como objeto de estudos dialetais, uma vez que ressalta relações entre língua,
sociedade e cultura.
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No que diz respeito ao caso específico do léxico, podemos observar, ao longo
dos exemplos supracitados, que o dia-a-dia desse povo, suas crenças, seus costumes,
suas práticas socioculturais, entre outros, são refletidos linguisticamente, trazendo para
a linguagem todo o bom-humor e entusiasmo do povo cearense.
Referências
ALENCAR, M. Silvana M. de. Aspectos fonético-lexicais da linguagem regional/popular na
obra de Patativa do Assaré. Fortaleza, 1997. Dissertação (Mestrado em linguística) – UFC.
ARAGÃO, M. do Socorro Silva. A variação fonético-lexical em atlas linguísticos do Nordeste.
Revista do GELNE. Fortaleza. Ano I. n°2. 1999.
______Os estudos fonético-fonológicos no estado do Ceará. 57ª Reunião Anual da SBPC.
Fortaleza, 2005.
CUNHA, Celso; CINTRA, Lindley. Nova Gramática do Português Contemporâneo
2ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.
FERREIRA, Carlota; CARDOSO, Suzana Alice. A dialetologia no Brasil. São Paulo:
Contexto, 1994.
MONTEIRO, José Lemos. Considerações sobre o falar (dialeto) cearense. Revista de
Humanidades. Fortaleza, v. 24, n.1, p. 21-30, jan./jun. 2009
Recebido Para Publicação em 30 de junho de 2012.
Aprovado Para Publicação em 15 de julho de 2012.