COMISSÃO DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
IINNIICCIIAATTIIVVAASS DDAA CCMMVVMM
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Fevereiro/2008
2
ÍNDICE
• Sumário Executivo……………………………………………………………………………………..…..……3
• Abuso de Informação Privilegiada………………………………………………………………………21
• Manipulação do Mercado…………………………………………………………………………..……….39
• Entendimentos da CMVM sobre a Divulgação
de Informação Privilegiada por Emitentes……………………………………….……….……...51
• Entendimentos da CMVM sobre Comunicação
de Operações Suspeitas e Defesa do Mercado………………………………………………….71
• Guia Rápido para Comunicação de Operações Suspeitas………………..…….………..87
• Comunicação de Operações Suspeitas (Público em Geral)……….……….…………….99
• Procedimentos gerais de supervisão com vista à determinação
da prestação de esclarecimentos e divulgação
de informação privilegiada relativa a emitentes………………………...……………….103
• Procedimentos gerais de supervisão com vista à determinação
da prestação de esclarecimentos e divulgação de informação
privilegiada relativa a emitentes - Fluxograma de Procedimentos……………...111
• Recomendações da CMVM Relatórios de Análise Financeira
sobre instrumentos financeiros (Research)………………………………………………..…117
• Contratos de liquidez como prática de mercado aceite………………………………..129
3
I. SUMÁRIO EXECUTIVO
A negociação em mercado com base em informação privilegiada e a
manipulação de mercado – práticas que no seu conjunto são normalmente
conhecidas como “abuso de mercado” ou pela designação inglesa “market abuse” –
têm profundas implicações na confiança dos investidores e na integridade dos
mercados, o que se reflecte no seu próprio desenvolvimento.
A CMVM, na sua missão de garantir a integridade, a credibilidade e a
segurança do mercado de instrumentos financeiros tem vindo a mobilizar meios e
sistemas cada vez mais desenvolvidos com vista à prevenção e ao combate ao
abuso de mercado. O objectivo tem sido prevenir e dissuadir este tipo de
comportamentos, tornar mais rápida e eficaz a sua detecção e a sua investigação e
contribuir para que os infractores sejam sancionados de modo adequado. Ainda
assim, é necessário avaliar continuamente a eficácia das práticas de supervisão e
congregar o esforço de todos os profissionais, entidades financeiras, investidores e
instituições públicas e privadas do mercado português no sentido da sua
integridade.
Foram estes pressupostos que levaram o Conselho Directivo da CMVM a
criar, em Maio de 2007, um grupo de trabalho interno que, partindo da
identificação e caracterização dos mecanismos e das práticas de supervisão
actualmente instituídos para a prevenção, detecção e prova de práticas de abuso de
mercado, teve como objectivos:
propor medidas que permitam melhorar esses mecanismos e práticas de
supervisão e de fiscalização;
propor novos mecanismos e práticas de supervisão e fiscalização que
permitam aumentar a eficácia da CMVM na prevenção, detenção e prova
de práticas de abuso de mercado;
propor medidas que contribuam para que as práticas de apresentação de
recomendações de investimento se conformem com critérios de
imparcialidade e para que seja assegurado o cumprimento das regras de
divulgação de conflitos de interesses;
4
propor medidas que facilitem e conduzam a um maior envolvimento dos
profissionais das diversas áreas que se relacionam com os mercados de
capitais, dos investidores e do público em geral no combate ao abuso de
mercado e na comunicação de transacções suspeitas;
identificar e caracterizar eventuais práticas de mercado que devam
passar a ser aceites.
As novas medidas de prevenção e combate ao abuso de mercado agora
aprovadas pelo Conselho Directivo da CMVM são o resultado das propostas
apresentadas por essa taskforce.
Sem embargo das contribuições e das alterações resultantes do processo de
consulta pública sobre estas medidas que vai decorrer até 31 de Março e no qual se
espera uma ampla participação de todos os profissionais do mercado, a CMVM
centra assim as suas preocupações de forma prioritária na prevenção das seguintes
condutas:
A. Utilização de informação privilegiada, designadamente a relacionada com:
Operações societárias (exemplos: OPAS, fusões, compra e venda de
participações qualificadas)
Apresentação pela sociedade de informação económico-financeira, previsões
de resultados e mudança de políticas, tais como em matéria de dividendos,
quando se afastem significativamente do previsto
B. Manipulação da cotação ou negociação mediante:
Difusão de informação ou rumores falsos ou enganosos
Manipulação mediante operações de mercado (designadamente, quando
estejam previstos aumentos de capitais, OPV, aquisição de acções,
distribuição de dividendos, etc)
Difusão de análise financeira sobre a sociedade ou acção sem respeitar as
normas de conduta
No âmbito desta iniciativa, a CMVM divulga também um conjunto de elementos
informativos nos quais se traça o essencial do regime legal, se esclarecem aspectos
do concreto funcionamento do sistema e se sugerem as formas de actuação que
melhor satisfazem os objectivos de protecção do mercado de valores mobiliários.
5
II. NOVAS INICIATIVAS DA CMVM SOBRE PREVENÇÃO
E COMBATE AO ABUSO DE MERCADO
1. Sistema Informático de Vigilância de Abuso de Mercado (SIVAM)
Tem vindo a ser desenvolvido um novo sistema informático de
vigilância de abuso de mercado (SIVAM) que identifica padrões
anormais de comportamento:
– das cotações/retornos dos activos,
– dos volumes transaccionados,
– do número de negócios,
– das ofertas (incluindo o cancelamento), e
– dos intermediários financeiros;
– e dos comitentes.
Este instrumento informático permite:
– analisar a negociação em tempo real com base em dois modelos
(browniano e market model);
– proceder a uma análise pós-fecho da negociação mediante a
realização de testes de largo espectro e de testes específicos;
– detectar de padrões anormais de negociação previamente e na
sequência da divulgação de informação privilegiada de que podem
emergir suspeitas de “insider trading”. A análise do historial de testes
diariamente calculados pelo SIVAM desempenha um papel crucial na
identificação das sessões de bolsa em que se podem ter praticado os
abusos ocorridos em sessões posteriores.
SIVAM Real Time - Análise da Negociação em Tempo Real
Para cada instrumento financeiro são aplicadas variantes dos dois
modelos de acordo com parâmetros independentes e específicos.
Ambos os modelos de análise emitem um alerta sempre que o preço
do último negócio efectuado se situe fora dos limites de um determinado
intervalo de confiança (bandas de oscilação).
O alarme de quantidade, por sua vez, indica que o volume
transaccionado para o activo em causa, desde o início da sessão é anormal.
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SIVAM t+1 - Análise Pós-Fecho da Negociação
Os testes de largo espectro emitem alertas relacionados com a
análise das seguintes variáveis:
Preços/retorno
Número de negócios
Volume de negócios/quantidades
Concentração das transacções por intermediário financeiro
Concentração das transacções pelos primeiros comitentes
(com base no sistema de reporte de transacções – TREM)
Estão já em funcionamento 15 sinais de alerta e está em
desenvolvimento o estudo de outras variáveis. A análise de concentração de
negócios por comitente apenas poderá ser implementada a partir do início
do reporte à CMVM, pelos intermediários financeiros, da identificação dos
clientes de primeira linha (Julho deste ano).
Os testes específicos visam detectar práticas de manipulação de
mercado, tais como:
Marcação do preço de fecho
Concentração na sequência de OPS
Abuso de posição dominante
Sustentação do preço
Controlo do spread
Manipulação inter-mercados
Disseminação de informação falsa ou enganosa através dos
media com intenção de produzir uma alteração no preço do
instrumento financeiro
Compra seguida de disseminação de informação falsa e de
venda
Venda seguida de disseminação de informação falsa e de
compra
Abrir uma posição e fechá-la imediatamente após a sua
divulgação
Foram já concebidos e encontram-se em desenvolvimento 56 testes
específicos. Os testes baseiam-se em informações negócios, ofertas e
comitentes.
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SIVAM t+k - Análise da Negociação Após Divulgação de Informação
Relevante
O SIVAM permite que, quando ocorre um determinado facto
relevante (por exemplo, o anúncio de informação privilegiada), se analise se
a ocorrência desse facto origina comportamentos anormais nos preços e nas
transacções, bem como permite analisar se esses movimentos anormais
foram perceptíveis nos dias que antecederam a sua divulgação pública.
A análise do historial de testes quotidianamente calculados pelo
SIVAM desempenha um papel crucial na identificação das sessões de bolsa
(t) em que se podem ter praticado os abusos relacionados com o evento
ocorrido k sessões mais tarde.
2. Abuso de Informação Privilegiada
É publicado um texto sobre abuso de informação privilegiada que
descreve o regime do crime de abuso de informação, o seu âmbito de
aplicação, as condutas proibidas, as linhas de orientação internacionais na
matéria, os mecanismos preventivos e faz uma súmula das decisões dos
tribunais portugueses sobre o tema.
3. Manipulação do Mercado
É publicado um texto sobre manipulação do mercado em que se
descreve o regime penal da manipulação do mercado, se definem conceitos,
se apresentam os comportamentos proibidos, e ainda se apresentam as
tipologias de manipulação do CESR e se faz uma súmula das decisões dos
tribunais portugueses sobre este tipo de casos.
4. Entendimentos da CMVM sobre a Divulgação de Informação
Privilegiada pelos Emitentes
Foi aprovado um projecto de Novos Entendimentos da CMVM
sobre a Divulgação de Informação Privilegiada pelos Emitentes que,
na sua versão definitiva, irão rever e actualizar os Entendimentos da CMVM
de 2006, agora à luz do novo regime legal da informação privilegiada e das
orientações do CESR de 2007.
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A CMVM densifica os critérios que devem ser seguidos pelos
emitentes para identificar quando é que a informação:
lhe diz respeito directa ou indirectamente ;
é precisa;
pode ser considerada pública;
é idónea para influenciar o preço em mercado.
A CMVM fornece também 42 exemplos concretos de informação
privilegiada e estabelece:
os procedimentos que as sociedade cotadas devem adoptar na sua
divulgação;
os procedimentos que as sociedades cotadas devem evitar;
as condutas que devem ser adoptadas por terceiras entidades que
divulguem informação que indirectamente respeite aos emitentes;
em que casos é que os emitentes tem de confirmar ou desmentir
rumores.
5. Procedimentos de supervisão com vista à determinação da prestação
de esclarecimentos e divulgação de informação privilegiada relativa
a emitentes
O objectivo é tornar conhecidos de todos os agentes do mercado os
procedimentos desencadeados pela CMVM quando:
Detecte anomalias na negociação (evolução dos preços e
volumes);
Verifique ter sido publicada uma notícia ou um rumor sobre
determinado emitente relevante de per si (e que não
corresponda a informação privilegiada já divulgada);
Detecte a circulação de um rumor sobre determinado
emitente (que igualmente se considere relevante e não
corresponda a informação já divulgada).
Nesse sentido, apresenta-se um conjunto de procedimentos que podem
conduzir à determinação da prestação de esclarecimentos e divulgação de
informação privilegiada relativa a emitentes e clarifica as condições que
determinam a suspensão da negociação. Divulga-se também um fluxograma
que sintetiza aqueles procedimentos.
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O documento descreve detalhadamente todos os procedimentos
adoptados pela CMVM tais como:
análise do impacto material da informação
análise da informação anteriormente prestada pelo emitente
contacto com o emitente
análise dos esclarecimentos prestados pelo emitente
avaliação do dever de publicação de informação privilegiada
publicação pela CMVM de anúncios sobre a solicitação de
informação ao emitente e sobre a eventual suspensão da
negociação
análise e avaliação da informação privilegiada publicada pelo
emitente
suspensão da negociação, manutenção ou levantamento da
suspensão.
6. Entendimentos da CMVM sobre comunicação de operações suspeitas
e defesa do mercado e formulário para comunicação de operações
suspeitas
Divulgação do projecto de entendimentos da CMVM sobre
comunicação de operações suspeitas e defesa do mercado em que se
descreve o regime legal, onde se identificam as pessoas sujeitas ao dever
legal, as operações a comunicar, os sinais de alerta, de acordo com a
enunciação do CESR, adaptada à nossa realidade, onde se resolvem dúvidas
sobre o destinatário da informação, se explica o regime de segredo, se
apresenta um formulário para comunicação de operações suspeitas e se
formulam várias recomendações de organização dirigidas aos intermediários
financeiros neste domínio.
Entre os sinais de alerta de indício de abuso de informação e
manipulação de mercado, indicam-se, nomeadamente, os seguintes:
Concentração anormalmente elevada de operações num
instrumento financeiro por um ou mais investidores
qualificados com ligação ao emitente;
Repetição não usual de operações entre um número reduzido
de clientes num curto espaço de tempo;
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Concentração anormalmente elevada de operações ou ordens
num só cliente ou em diferentes contas de um instrumento
financeiro no mesmo cliente ou número limitado de clientes
Abertura de conta e realização imediata de uma operação
significativa por um cliente com urgência de execução antes
de um momento por ele especificado
Operações significativas por parte de titulares de participações
qualificadas ou outros “insiders” antes do anúncio de
informação privilegiada pelo emitente
Ordens sem outra justificação que não seja fazer subir ou
descer o preço do instrumento financeiro ou aumentar a
quantidade, em particular quando a operação deva ser
executada perto do momento em que se forma o preço de
referência.
7. Guia rápido para a comunicação de operações suspeitas
Publicação do guia rápido para a comunicação de operações
suspeitas, versão simplificada do texto anterior, feita a pensar nos
funcionários dos intermediários financeiros e das entidades gestoras. Não
cita normas legais nem tem explicações jurídicas, mas descreve um
conjunto de regras de actuação que permitem cumprir o regime legal.
8. Formulário para a comunicação de operações suspeitas pelo público
em geral
Disponibilização no site da CMVM na Internet de um formulário
para a comunicação de operações suspeitas pelo público em geral
9. Sistema de supervisão do processo de emissão de recomendações de
investimento
Foi também aprovada a adopção de um novo modelo de risco para a
supervisão do processo de emissão de recomendações de investimento por
parte dos analistas financeiros, designadamente no que diz respeito à
consistência de metodologias e pressupostos adoptados.
11
10. Recomendações sobre Relatórios de Análise Financeira (research)
A CMVM aprovou ainda o projecto de 19 Novas Recomendações
sobre Relatórios de Análise Financeira (research) dirigidas a
emitentes, jornalistas e investidores.
Aos emitentes a CMVM passa a recomendar que:
divulguem no seu site a lista dos analistas financeiros que
participaram em roadshows da empresas nos últimos 12 meses ou
que demonstraram interesse em emitir recomendações de
investimento sobre a empresa nos últimos 12 meses;
convidem para os roadshows e apresentações, com antecedência
adequada, todos os analistas constantes dessa lista;
divulguem a todos os analistas constantes da lista a informação
divulgada nos roadshows ou noutras apresentações, mesmo que
estes não tenham estado presentes;
não respondam de improviso a questões que lhes sejam colocadas de
modo a evitar a divulgação de informação privilegiada;
divulguem através do seu site as datas dos roadshows e encontros
com analistas e que os transmitam através do site em
videoconferência em tempo real sempre que existam limitações à
presença física;
se abstenham de nomear para cargos ou contratar analistas que
tenham estado envolvidos na cobertura da empresa nos últimos 2
anos;
cumpram todas estas recomendações, ainda que não sejam
empresas cotadas, quando estejam a perspectivar ou a preparar uma
oferta pública inicial, e que assegurem que os analistas dos
intermediários financeiros encarregues da colocação da oferta não
dispõem de mais informação do que a que foi prestada ao mercado.
Aos investidores, a CMVM recomenda que:
leiam, no relatório de research, a informação que respeita às
participações e relações comerciais entre a empresa analisada e a
empresa produtora do research;
confirmem junto do representante do emitente para as relações com
o mercado a validade da informação apresentada no relatório de
research;
12
consultem o seu intermediário financeiro para que este lhes preste a
informação necessária para uma tomada de decisão de investimento
ou desinvestimento esclarecida.
E aos jornalistas é recomendado pela CMVM que:
sempre que elaborem notícias sobre relatórios de research, procurem
reproduzir os respectivos resumos de modo a traduzir com rigor a
opinião dos seus autores;
sempre que elaborem notícias com base em informações que lhes sejam
transmitidas oralmente pelos autores do research ou por outras fontes,
confirmem se essas informações correspondem ao teor dos relatórios;
evitem redigir títulos que se limitem à indicação do preço-alvo ou da
recomendações de investimento e que sejam susceptíveis de transmitir
uma percepção errada da análise efectuada no relatório;
sempre que redijam títulos que mencionem o preço-alvo ou a
recomendação de investimento, salientem no lead os principais
pressupostos que condicionam a sua verificação;
mencionem a existência de conflitos de interesses, destacando
nomeadamente os identificados no relatório;
mencionem os limites inferiores e superiores do intervalo de preço-alvo e
respectivo horizonte temporal, tal como constam do relatório, e não
apenas o preço-alvo máximo ou a recomendação de investimento;
sempre que noticiem um novo preço-alvo ou uma nova recomendação,
mencionem os anteriores preços-alvo e recomendações efectuadas pelo
mesmo autor nos 12 meses anteriores e indiquem os desvios dos preços-
alvo face aos preços de mercado e o grau de acerto das recomendações;
sempre que noticiem um novo preço-alvo ou uma nova recomendação,
mencionem os anteriores preços-alvo e recomendações emitidos por
outras entidades para o instrumento financeiro em causa nos 3 meses
antecedentes.
11. Contratos de liquidez como prática de mercado aceite
A CMVM deliberou ainda iniciar o processo de reconhecimento dos
contratos de liquidez como prática de mercado aceite à semelhança do
que acontece em já alguns dos principais mercados internacionais. Tal
processo traduz-se no envio ao CESR (Comité Europeu de Reguladores) da
proposta constante do documento “Contratos de liquidez como prática de
13
mercado aceite” que inclui a lista dos factores de avaliação dos contratos de
liquidez como prática de mercado aceite.
Este reconhecimento implica que determinadas práticas que
poderiam configurar manipulação de mercado passem a ser consideradas
como aceites desde que preencham determinadas condições.
III. EVOLUÇÃO RECENTE DA LEGISLAÇÃO NO ÂMBITO DO COMBATE
AO ABUSO DE MERCADO
1. Os mercados de valores mobiliários são segmentos do sistema financeiro e,
nessa medida, são bens públicos que permitem também a realização de diversos
interesses individuais. O seu bom e regular funcionamento não pode por isso ser
adulterado por práticas nocivas que o procurem instrumentalizar e submeter a
pretensões individuais ilegítimas.
Os elevados interesses públicos e privados que confluem no mercado de valores
mobiliários determinaram que o legislador português – há cerca de vinte anos,
através de uma alteração ao Código das Sociedades Comerciais ocorrida em 1987 –
tivesse consagrado os crimes de abuso de informação privilegiada e de manipulação
do mercado para proteger as condições básicas do seu bom funcionamento. O
lastro desta tutela sancionatória é mais antigo, mas este é um marco essencial na
protecção penal dos mercados financeiros. Depois, em 1991, o Código do Mercado
de Valores Mobiliários reorganizou todo o mercado e criou a CMVM, mantendo as
proibições penais referidas. Em 1999 este diploma foi revisto, numa linha de
continuidade mas também de inovação, ao ponto de antecipar muitas das soluções
que ao nível comunitário vieram a ser acolhidas nas directivas do abuso de
mercado de 2003. Estas directivas, adiante descritas, foram transpostas em
Portugal em 2006, tendo implicado algumas novidades no campo da supervisão e
do sistema sancionatório de que adiante se dá conta.
2. O novo regime comunitário do abuso de mercado abrange a Directiva n.º
2003/6/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de Janeiro de 2003,
relativa ao abuso de informação privilegiada e à manipulação de mercado, e os
seguintes diplomas comunitários de concretização (nível 2):
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Directiva n.º 2003/124/CE da Comissão, de 22 de Dezembro de 2003, que
estabelece as modalidades de aplicação da Directiva n.º 2003/6/CE, no que
diz respeito à definição e divulgação pública de informação privilegiada e à
definição de manipulação de mercado;
Directiva n.º 2003/125/CE da Comissão, de 22 de Dezembro de 2003, que
estabelece as modalidades de aplicação da Directiva n.º 2003/6/CE, no que
diz respeito à apresentação imparcial de recomendações de investimento e à
divulgação de conflitos de interesses;
Directiva n.º 2004/72/CE da Comissão, de 29 de Abril de 2004, relativa às
modalidades de aplicação da Directiva n.º 2003/6/CE, no que diz respeito às
práticas de mercado aceites, à definição da informação privilegiada em
relação aos instrumentos derivados sobre mercadorias, à elaboração de
listas de iniciados, à notificação das operações efectuadas por pessoas com
responsabilidades directivas e à notificação das operações suspeitas; e
Regulamento (CE) n.º 2273/2003 da Comissão, de 22 de Dezembro de
2003, que estabelece as modalidades de aplicação da Directiva n.º
2003/6/CE no que diz respeito às derrogações para os programas de
recompra (share buyback) e para as operações de estabilização de
instrumentos financeiros.
3. O regime contido nestas Directivas foi transposto para o nosso ordenamento
jurídico através do Decreto-Lei n.º 52/2006, de 15 de Março, que introduziu e
incorporou as alterações no Código dos Valores Mobiliários de 1999 (CdVM,
aprovado pelo Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de Novembro). As novidades e
alterações ao sistema jurídico nacional não foram tão extensas ou profundas como
noutros países que adoptaram o novo regime do abuso de mercado, porque uma
parte significativa das novas soluções já tinha sido antecipada pelo CdVM de 1999.
As principais alterações decorrentes da transposição para o ordenamento jurídico
interno das Directivas enunciadas prendem-se com deveres de informação (dever
de divulgação de informação privilegiada, dever de elaboração de listas de insiders,
deveres relativos à elaboração e divulgação de informação contendo
recomendações de investimento), uma vez que a definição de abuso de informação
privilegiada e de manipulação de mercado não se distanciam, no essencial, do
regime já antes previsto no Código dos Valores Mobiliários de 1999, muito embora
a definição do crime de abuso de informação tenha sido objecto de algumas
alterações pontuais.
15
4. No que respeita concretamente ao regime do abuso de informação e da
manipulação de mercado, as principais alterações decorrentes da transposição
foram as seguintes:
Para além dos tipos incriminadores previstos no artigo 378.º do Código dos
Valores Mobiliários, que se mantêm no essencial, passou, em consequência
da transposição da Directiva 2003/6/CE, a prever-se no n.º 4 do artigo
248.º (conjugado com o art. 394.º, n.º 1 al. i) uma contra-ordenação muito
grave pela utilização indevida de informação privilegiada que,
diferentemente do que sucede no caso do crime, é imputável também a
título de negligência e a pessoas colectivas;
No elenco das fontes relacionadas com a informação privilegiada do artigo
378.º passou a prever-se a prática de um facto ilícito;
Foi eliminada no artigo 378.º a exigência da ligação (ainda que indirecta) do
agente a uma fonte interna do emitente;
Acrescentou-se no artigo 311.º, relativo ao dever de defesa do mercado, um
conjunto de situações que apresentem sinais indiciadores de suspeitas de
manipulação de mercado e das quais decorre para os intermediários
financeiros um dever reforçado de análise;
Os intermediários financeiros com sede em Portugal passaram a ter um
dever de comunicação à CMVM de operações que apresentem sinais que
levem a suspeitar de manipulação de mercado ou de abuso de informação
(art. 382.º, n.º 2 e 4);
Quer para o abuso de informação, quer para a manipulação de mercado
prevê-se a possibilidade de demandar como parte civil no processo crime
um terceiro, seja pessoa singular seja uma pessoa colectiva, cuja carteira
esteja envolvida nas transacções, para efeito da apreensão das vantagens
do crime ou da reparação de danos (arts 378º, n.º 7 e 379.º, n.º 5).
5. Os tipos incriminadores do abuso de informação privilegiada e da manipulação
de mercado vigoram no nosso ordenamento jurídico, no âmbito do mercado de
valores mobiliários, já desde 1987, como se referiu, com a entrada em vigor do
Código das Sociedades Comerciais, tendo sido as incriminações depois revogadas e
substituídas pelo Código do Mercado de Valores Mobiliários, de 1991. E vigoram
actualmente com um campo de aplicação mais vasto do que aquele que tinham
16
inicialmente, porque se aplicam não apenas a mercados de valores mobiliários
regulamentados, como também a outro tipo de mercado (por exemplo, aos
instrumentos financeiros negociados no mercado eléctrico).
Por outro lado, as denúncias apresentadas pela CMVM às autoridades judiciárias
competentes, deram nos últimos anos origem a diversos processos-crime, que
culminaram com julgamentos quer pela prática de abuso de informação privilegiada
(6 julgamentos), quer de manipulação de mercado (2 julgamentos). Estão ainda
em curso mais dois julgamentos por abuso de informação privilegiada que deverão
terminar apenas entre Janeiro e Fevereiro de 2008. No âmbito destes processos
foram proferidas importantes decisões pelos Juízos Criminais de Lisboa e pelo
Tribunal da Relação de Lisboa, bem como pelo Tribunal Constitucional. A
identificação destas decisões judiciais, o seu conteúdo e o sentido da decisão
encontram-se nos relatórios anuais divulgados pela CMVM. Nos textos “Abuso de
Informação Privilegiada” e “Manipulação de Mercado” apresenta-se uma súmula
sobre o essencial das decisões proferidas relativamente a cada um dos crimes
(manipulação de mercado e abuso de informação privilegiada).
Pode por isso afirmar-se que o sistema criado em 1991, reorganizado em 1999 e
actualizado em 2006, está a funcionar em todas as suas vertentes: desde a lei em
vigor, à detecção e investigação dos casos pela CMVM, à sua tramitação judicial,
passando pela intervenção de tribunais de todos os níveis. Estes elementos
evidenciam também uma interiorização importante dos valores e dos interesses
associados à protecção do bom funcionamento dos mercados de valores mobiliários
por todos os intervenientes no sistema.
Não obstante, a emergência a nível europeu de um regime harmonizado relativo
ao abuso de mercado torna útil que se proceda a uma identificação de algumas das
situações típicas de abuso de mercado, por forma clarificar o campo de aplicação
das normas e a orientar os agentes no cumprimento dos deveres que delas
decorrem.
Esta tarefa foi já em grande parte levada a efeito no âmbito do CESR, através da
emissão de orientações divulgadas em 2004 (cfr. CESR/04-505 b) e em 2007 (cfr.
CESR/06-562b, ambos os documento disponíveis em www.cesr.eu).
Uma parte do conjunto de documentos divulgados no âmbito da presente
iniciativa baseia-se nessas orientações, explicitando concretamente as fontes legais
nacionais de enquadramento e consequências legais, bem como algumas
particularidades do nosso sistema quer ao nível das soluções legais, quer ao nível
da prática judiciária.
17
IV. ABUSO DE MERCADO E DIVERSIDADE DE ILÍCITOS
1. As Directivas do abuso de mercado contemplam sob esta designação não
apenas as situações específicas de abuso de informação privilegiada e de
manipulação do mercado, como também um conjunto de outras práticas nocivas
que, sob essa referência genérica, pretendem ver proibidas nos diversos Estados-
membros. Contudo, as Directivas comunitárias não impunham que a proibição
desses comportamentos fosse convertida em crime, apenas exigiam a criação das
proibições e a cominação dos factos com sanções adequadas e proporcionadas.
Em Portugal o mercado de valores mobiliários está normativamente organizado
com instrumentos legislativos coerentes, unificados e articulados desde 1991. Essa
organização conjuga três grandes áreas: a supervisão dos agentes e dos mercados,
a tutela sancionatória através da figura das contra-ordenações e a tutela penal. Por
isso, uma parte dos comportamentos que as directivas pretendem proibir já eram
entre nós ilícitos de mera ordenação social, sancionados com coimas, sanções
acessórias e perda de benefícios económico (arts. 388.º, 404.º e 406.º do CdVM),
ficando os crimes reservados para as situações mais graves (arts 378.º, 379.º,
380.º e 380.º-A), de acordo com a nossa tradição jurídica e o princípio
constitucional da intervenção mínima em matéria penal. As coimas e as sanções
acessórias pela prática de contra-ordenações são aplicadas num processo específico
pela CMVM (processo de contra-ordenação) e a sua decisão pode depois ser
impugnada, numa fase facultativa, pelos arguidos junto dos tribunais judiciais (arts
408.º e ss do CdVM).
A CMVM divulga no seu site estatísticas (em regra) trimestrais sobre a actividade
sancionatória em processos de contra-ordenação, bem como as decisões que
imputam contra-ordenações muito graves e respectivas coimas e sanções
acessórias (ao abrigo e por força do disposto no art. 422.º do CdVM).
2. Assim, algumas situações que as directivas designam genericamente como
abuso de mercado já eram ou são em Portugal ilícitos de mera ordenação social
(contra-ordenações), como acontece com os seguintes factos:
A violação do regime de divulgação, reserva e proibição de uso indevido de
informação privilegiada: contra ordenação muito grave (arts 248.º e 394.º,
al. i), que ficará preterida se o facto em causa constituir crime de abuso de
informação;
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A violação do dever de reserva sobre uma oferta pública de distribuição, já
decidida ou meramente projectada, e do dever de segredo sobre a
preparação duma OPA: contra-ordenações muito graves e graves (art. 174.º
e 393.º, n.º 1, al. a) e n.º 2 al. e));
A violação dos deveres de defesa do mercado: contra-ordenação muito
grave (arts. 311..º e 398.º, d) );
A comunicação de informação sobre decisões de investimento de um cliente
a terceiros: contra-ordenação muito grave (art. 304.º e 398.º, a));
A utilização de informação sobre a decisão de investimento do cliente para
proveito próprio ou de terceiro: contra-ordenação muito grave (art. 309.º,
n.º 3 e 397.º, n.º 2 al. b);
A violação de deveres quanto à qualidade da informação a divulgar ao
público, às entidades de supervisão ou às entidades gestoras dos mercados:
contra-ordenações simples, graves e muito graves (art. 398.º conjugado
com os diversos deveres de informação contidos no código);
A violação do dever específico de comunicar transacções de dirigentes e
pessoas com eles relacionadas: contra-ordenação muito grave (art. 248.º-B
e 389.º n. 3, al. c));
A violação do regime da informação que contenha recomendações de
investimento e das regras sobre conflitos de interesses com aquela
relacionados: contra-ordenação muito grave (art. 7.º, n.º 1 e 2 e art. 389.º,
n.º 1) e contra-ordenação grave (arts 12.º-A a 12.º-E e 389.º, n.º 3 al. e),
respectivamente.
A violação dos deveres de não realizar operações contrárias às
recomendações (art. 309.º-D, n.º2) ou antes da divulgação das
recomendações (art. 309.º-D, n.º 3): contra-ordenação muito grave (art.
395.º, n.º 1, al. b).
V. O PROCESSO DE CONSULTA PÚBLICA
Como vem sendo habitual neste tipo de intervenções da CMVM, antes da aprovação
final dos textos com natureza recomendatória ou com influência na conformação
dos comportamentos dos participantes do mercado, estes são submetidos a
escrutínio público para que todos os agentes do mercado se possam pronunciar,
transmitindo comentários ou sugestões em relação aos documentos apresentados.
19
Convida-se, assim, os participantes do mercado, os investidores, os académicos e o
público em geral a pronunciar-se sobre os seguintes documentos:
Entendimentos da CMVM sobre a Divulgação de Informação
Privilegiada pelos Emitentes;
Entendimentos da CMVM sobre a Comunicação de Transacções
Suspeitas e Defesa do Mercado;
Formulário para a Comunicação de Transacções Suspeitas pelo
Público em Geral;
Guia Rápido para a Comunicação de Transacções Suspeitas;
Recomendações da CMVM sobre Relatórios de Análise Financeira
(Research) dirigidas a Emitentes, Intermediários Financeiros e
Analistas;
Regime dos Contratos de Liquidez e seu reconhecimento como
prática de mercado aceite
e ainda os Procedimentos Gerais de Supervisão com Vista à
Determinação da Prestação de Esclarecimentos e Divulgação de
Informação Privilegiada Relativa a Emitentes.
As respostas ao presente documento de consulta devem ser submetidas à CMVM
até ao dia 29 de Março de 2008.
Os contributos devem ser remetidos, preferencialmente, para o endereço de correio
electrónico [email protected]. As respostas à consulta pública podem igualmente ser
expedidas, por correio normal, para a morada da CMVM (Avenida da Liberdade, n.º
252, 1056-801 Lisboa; telefax n.º 21 353 70 77/78).
Atendendo a razões de transparência, a CMVM propõe-se publicar os contributos
recebidos ao abrigo desta consulta. Assim, caso o respondente se oponha à referida
publicação deve comunicá-lo expressamente no contributo a enviar. Qualquer
dúvida ou esclarecimento adicional sobre a presente consulta pública poderá ser
elucidada pelo Dr. Paulo Câmara, Director do Departamento Internacional e de
Política Regulatória.
21 de Fevereiro de 2008
20
21
ABUSO DE INFORMAÇÃO PRIVILEGIADA
CONCEITOS, COMPORTAMENTOS PROIBIDOS,
CONSEQUÊNCIAS LEGAIS, LINHAS DE ORIENTAÇÃO
E DECISÕES JUDICIAIS
CMVM
2008
22
SUMÁRIO
1. Fundamento 23
2. Definição de informação privilegiada 23
3. Fontes da informação privilegiada 27
4. Prevenção: comunicação de transacções e listas de insiders 28
5. Condutas proibidas 29
6. Âmbito subjectivo 30
7. Consequências legais 31
8. Casuística 32
9. Vigilância, investigação e denúncia pela CMVM 33
10. Decisões dos tribunais 33
23
1. Fundamento
Os mercados de valores mobiliários vivem de informação que é essencial para
as decisões dos investidores, das empresas e dos reguladores. Pela sua origem,
natureza e função uma parte dessa informação é, em certos momentos,
reservada a um círculo limitado de pessoas, ficando mais tarde acessível ao
público em geral. De igual modo, o seu conteúdo e a sua adesão à realidade
podem também variar. O momento da divulgação e a qualidade da informação a
divulgar, entre outros aspectos, condicionam e influenciam as decisões dos
agentes no mercado e têm reflexos significativos sobre os preços que se
formam.
A lei portuguesa proíbe a transmissão e o uso indevidos dessa informação
enquanto a mesma não for tornada pública. Antes disso, a sua utilização é
restrita ou mesmo proibida. Desta forma, procura-se garantir o acesso à
informação pela generalidade dos investidores em condições mínimas de
igualdade, usando para o efeito como referente temporal o momento em que a
informação é tornada pública. A transmissão ou utilização indevidas de
informação privilegiada, antes da sua divulgação pública, podem pôr em causa o
regular funcionamento do mercado, podem frustrar as operações em curso e
podem gerar vantagens ilegítimas para alguns investidores em detrimento dos
demais. Por isso a lei considera que tais factos constituem crime quando
praticados por pessoas singulares de forma dolosa.
Ao proibir penalmente estes factos a lei pretende reforçar a confiança dos
investidores no funcionamento dos mercados de valores mobiliários, regulando
as condições de circulação da informação relevante ou a possibilidade de uso
negocial da mesma.
2. Definição de informação privilegiada
Na sequência do que já dispunha a lei anterior, o n.º 3 do artigo 378.º do CdVM
define como informação privilegiada:
Toda a informação não tornada pública que, sendo precisa e dizendo
respeito directa ou indirectamente, a qualquer emitente ou a valores
mobiliários ou outros instrumentos financeiros, seria idónea, se lhe fosse
dada publicidade, para influenciar de maneira sensível o seu preço no
mercado.
24
Para a concretização do conceito de informação privilegiada na lei portuguesa é
também relevante o disposto no n.º 2 do artigo 248.º do Código dos Valores
Mobiliários (CdVM), que esclarece com mais pormenor o âmbito de alguns
elementos do conceito:
A informação privilegiada abrange os factos ocorridos, existentes ou
razoavelmente previsíveis, independentemente do seu grau de formalização,
que, por serem susceptíveis de influir na formação dos preços dos valores
mobiliários ou dos instrumentos financeiros, qualquer investidor razoável
poderia normalmente utilizar, se os conhecesse, para basear no todo ou em
parte, as suas decisões de investimento.
O conceito legal (art. 378.º, n.º 4, do CdVM) exige que a informação possua
quatro características para que possa ser considerada privilegiada: que seja
informação (1) não pública, (2) específica, (3) precisa e (4) idónea para
influenciar de maneira sensível o preço, de valores mobiliários ou outros
instrumentos financeiros, se fosse tornada pública. Estes quatro aspectos da
informação privilegiada têm sido pormenorizados pela doutrina, pela
jurisprudência, mas também pelos reguladores dos diversos países e por
instâncias internacionais como o CESR.
A informação é não pública quando não é acessível à generalidade dos
investidores;
E é específica quando diz respeito, directa ou indirectamente, a qualquer
emitente ou a valores mobiliários ou instrumentos financeiros.
Os outros dois requisitos do conceito legal, a natureza precisa e price sensitive
da informação, estão concretizados no art. 248.º, n.º 4 do CdVM, acima
transcrito, e têm sido aprofundados no segundo conjunto de orientações do
CESR sobre esta matéria (cfr. CESR/06-562 b, de Julho de 2007, disponível em
www.cesr.eu). Adiante enunciam-se alguns aspectos relevantes para a aferição
destas duas condições essenciais à qualificação da informação como
privilegiada.
A informação tem de ser precisa. A determinação de que se está perante
um facto ocorrido, existente ou razoavelmente previsível, caracteriza a
natureza precisa da informação, assim operando a distinção entre esta e
os meros rumores ou especulações.
Para que a informação seja precisa, não tem de ser completa, nem
definitiva: se a informação disser respeito a um processo que decorre em
25
várias fases (como é o caso da preparação de uma OPA), não só todo o
processo globalmente considerado mas também cada fase isolada pode
ser considerada informação precisa; o facto de o processo não estar
terminado não exclui que a informação sobre a ocorrência de uma fase
do processo seja considerada informação precisa.
Esta orientação do CESR corresponde ao entendimento que era já
seguido pelos tribunais portugueses (Juízos Criminais e Tribunal da
Relação de Lisboa) ao aplicarem o conceito de informação privilegiada
em processos negociais faseados (como seja a preparação de uma OPA
amigável), atribuindo relevância autónoma a cada etapa das decisões,
dos contactos e da negociação entre os intervenientes (considerando
cada grupo de factos em si mesmo informação privilegiada) e não
apenas ao resultado final da mesma ou a determinação do preço a
oferecer. O conhecimento dessas fases anteriores ao desfecho final do
negócio oferece, por si só, ao insider uma vantagem perante os demais
investidores que o mesmo não pode legitimamente usar.
A informação é precisa quando tem um grau de concretização que
permite que a mesma seja utilizada. Na formulação da lei, tal acontece
quando a informação permite retirar uma conclusão acerca do sentido do
seu eventual impacto nos preços, permitindo, em consequência, tomar
uma decisão de investimento que envolve um risco financeiro muito
reduzido.
A informação tem ainda de ser idónea para alterar significativamente o
preço (informação price sensitive).
A susceptibilidade de influência da informação sobre o preço dos valores
em mercado deve ser aferida ex ante, ou seja, deve ter-se em conta o
grau em que seria expectável que aquela informação tivesse efeito sobre
os preços no mercado, caso tivesse sido divulgada no momento em que
o facto aconteceu ou em que a informação foi usada antes de ser do
conhecimento público. A idoneidade da informação afere-se através de
um raciocínio hipotético: se o facto fosse conhecido do mercado nessa
altura produziria uma alteração significativa sobre o preço dos activos?
O critério para determinar essa susceptibilidade usa como referência o
padrão do investidor razoável: considera-se price sensitive a informação
que qualquer investidor razoável poderia normalmente utilizar, se a
26
conhecesse, para basear no todo ou em parte, as suas decisões de
investimento.
Na caracterização dessa susceptibilidade para influenciar os preços
devem ser tomados em consideração, nomeadamente, os seguintes
factores:
A magnitude previsível do facto em causa no contexto da actividade
da empresa;
A relevância da informação para as principais determinantes do preço
do instrumento financeiro;
A credibilidade da fonte;
As variáveis do mercado que influem sobre o preço do instrumento
financeiro em causa.
Existem diversos exemplos de indicadores de que a informação é susceptível
de ter impacto sobre o preço do instrumento financeiro:
O tipo de informação em causa é idêntico a informação que, no
passado, teve impacto sobre os preços;
O tipo de informação em causa é normalmente tomada em
consideração nas recomendações de investimento como factor a ter
em consideração na recomendação (designadamente para
determinação do price target);
A informação foi mantida expressamente em segredo;
O próprio emitente tratou no passado factos idênticos como
informação privilegiada.
A informação privilegiada que diga directamente respeito ao emitente (ou a
valores mobiliários por si emitidos) deve, em regra, ser imediatamente
divulgada ao mercado por aquele (art. 248.º, n.º 1, do CdVM), podendo, em
certos casos, tal divulgação ser diferida (art. 248.º-A do CdVM). Enquanto se
mantiver reservada, tal informação não pode ser nem usada nem transmitida
para lá do âmbito normal das funções de quem a conhece (art. 248.º, n.º 4 e
art. 378.º, n.º 1 e 2, todos do CdVM).
Em 2006, a CMVM deu a conhecer um conjunto de entendimentos da autoridade
de supervisão sobre este novo regime legal, incluindo o regime da divulgação e
diferimento da informação privilegiada, bem como os comportamentos a
27
adoptar e a evitar pelos emitentes com valores admitidos à negociação em
mercado regulamentado. No âmbito da iniciativa sobre o abuso de mercado,
esses entendimentos foram revistos e divulgados em documento autónomo: cfr.
Entendimentos da CMVM sobre a divulgação de informação privilegiada por
emitentes, CMVM, 2008. Uma análise mais casuística dos factos que podem
constituir informação privilegiada encontra-se neste documento.
3. Fontes da informação privilegiada
A lei portuguesa proíbe a transmissão e o uso de informação privilegiada quer a
insiders primários quer a insiders secundários, isso é, pessoas que recebem das
primeiras a informação relevante.
Após a transposição das directivas sobre abuso de mercado, em 2006, deixou
de se exigir que o conhecimento da informação privilegiada chegasse ao agente
por via de uma fonte interna do emitente (directa ou indirectamente), bastando
o seu conhecimento de que a informação de que dispõe é informação
privilegiada, independentemente, portanto, da fonte de onde proveio e dos
sucessivos elos que se interponham entre o detentor a informação e a sua
fonte. Este é o regime actualmente previsto no n.º 2 do artigo 378.º do CdVM.
Todavia, caso a informação provenha de uma das fontes referidas no n.º 1 do
mesmo artigo, a pena é maior, pelo que continua a ser relevante (para efeito da
determinação da moldura penal aplicável) a identificação da fonte do
conhecimento por parte do agente da informação privilegiada e que pode ser
(art. 378.º, n.º 1, do CdVM):
a. Devido à sua qualidade de titular de um órgão de administração ou de
fiscalização de um emitente ou de titular de uma participação no
respectivo capital; ou
b. Em razão do trabalho ou do serviço que preste, com carácter
permanente ou ocasional, a um emitente ou a outra entidade; ou
c. Que, por qualquer forma, tenha sido obtida através de um facto ilícito ou
que suponha a prática de um facto ilícito.
O disposto na alínea c) (do art. 378.º, n.º 1, do CdVM) abrange duas situações
novas em relação ao regime anterior: (i) o facto ilícito é a fonte da informação
privilegiada (por exemplo, um furto de documentos numa empresa) ou (ii) o
conhecimento de um facto ilícito que irá ocorrer e que, enquanto conhecimento
presente de um possível facto futuro, é em si mesmo informação privilegiada
28
(por exemplo, o conhecimento dos planos dum atentado terrorista, com
previsíveis repercussões nos mercados financeiros).
4. Prevenção: comunicação de transacções e listas de insiders
A reforma do abuso de mercado de 2006 reforçou os mecanismos de prevenção
do abuso de informação privilegiada, regulando, nomeadamente, a comunicação
de transacções de dirigentes de entidades emitentes (e de algumas pessoas
com eles relacionadas) e criando o dever de elaboração de listas de pessoas
com acesso a informação privilegiada (listas de insiders) no âmbito das
entidades emitentes ou pessoas que actuem por sua conta. O primeiro aspecto,
a comunicação de transacções de dirigentes, já vinha do regime anterior; o
segundo aspecto, as listas de insiders, foi uma inovação introduzida em 2006,
embora algumas práticas de supervisão a antecipassem casuisticamente ao
nível da investigação de crimes contra o mercado.
Comunicação de transacções: o artigo 248-B.º do CdVM exige que os
dirigentes societários descritos no preceito informem a CMVM, no prazo de
cinco dias úteis, sobre todas as transacções efectuadas por conta própria, de
terceiro ou por estes por conta daqueles que tenham como objecto acções
dessa entidade emitente ou instrumentos financeiros com elas relacionados.
O conteúdo desta comunicação encontra-se regulado no n.º 2 do mesmo
preceito e os demais números esclarecem o âmbito subjectivo do dever. O
regulamento da CMVM n.º 7/2007 veio concretizar os termos, condições e
conteúdo destes deveres de comunicação de transacções.
A violação do dever de comunicar transacções de dirigentes e pessoas com
eles relacionadas constitui contra-ordenação muito grave (art. 248.º-B e
389.º n. 3, al. c) do CdVM).
Listas de insiders: as entidades emitentes e as pessoas que actuem em seu
nome ou por sua conta têm, desde 2006, de elaborar uma lista de pessoas
que têm acesso a informação privilegiada, prevendo a lei um conjunto de
deveres específicos associados a esta obrigação (art. 248.º, n.º 6 e 7, do
CdVM), a saber:
Dever de elaborar a lista de pessoas com acesso a informação
privilegiada;
29
Dever de incluir nessa lista a identidade das pessoas, os motivos da sua
inclusão na listagem, a data da inclusão dessa pessoa na lista e qualquer
outra actualização relevante;
Dever de manter essa lista rigorosamente actualizada;
Dever de informar a pessoa cujo nome é referido na lista da sua inclusão
na mesma e das consequências legais previstas para a divulgação ou
utilização abusiva de informação privilegiada;
Dever de conservar essa lista pelo prazo de cinco anos;
Dever de enviar imediatamente a lista actualizada à CMVM sempre que
esta o solicitar.
A elaboração regular de listas rigorosas de pessoas com acesso a informação
privilegiada tem um valor preventivo do abuso de informação e tem
igualmente valor para a investigação dos casos. A inclusão do nome de
alguém numa lista desta natureza não a converte automaticamente em
suspeito, mas constitui uma garantia, para a própria entidade emitente, de
controlo sobre o circuito subjectivo da informação privilegiada quanto aos
insiders primários.
A violação de dever de elaborar a lista de insiders constitui uma contra-
ordenação muito grave, nos termos do art. 394.º, n.º 1 al. i) do CdVM. O
não cumprimento do dever de envio de uma lista de insiders à CMVM
constitui uma contra-ordenação grave, nos termos do art. 389.º, n.º 3, al.
c) do CdVM, sem prejuízo de lhe poder corresponder uma infracção mais
grave em função das particularidades do caso concreto.
5. Condutas proibidas
Além da proibição genérica de uso indevido de informação privilegiada, prevista
no n.º 4 do art. 248.º do CdVM, os tipos incriminadores do abuso de informação
do art. 378.º do mesmo diploma descrevem um conjunto de comportamentos
penalmente proibidos. Assim, quem esteja na posse de informação privilegiada
não pode:
Transmitir essa informação, fora do âmbito normal das suas funções;
Utilizar essa informação ou seja, concretamente, não pode com base
nela e relativamente a valores mobiliários ou instrumentos financeiros:
30
Negociar,
Aconselhar alguém a negociar,
Ordenar, para si ou para outrem, directa ou indirectamente, a
subscrição, aquisição, venda ou troca.
Do âmbito destas proibições ficam excluídas (art. 378.º, n.º 5 do CdVM):
As operações efectuadas pelo Banco Central Europeu, por um Estado,
pelo seu banco central ou por qualquer organismo designado pelo
Estado, por razões de política monetária, cambial ou de gestão da dívida
pública;
As transacções sobre acções próprias efectuadas no âmbito de programa
de recompra realizados nas condições legalmente permitidas.
Os factos descritos podem ser cometidos na forma consumada ou na forma
tentada e ainda em qualquer uma das modalidades de comparticipação
previstas no Código Penal (arts 22.º, 26.º e 27.º).
A proibição penal de uso da informação privilegiada é válida inclusivamente
quando as aquisições são realizadas por uma pessoa singular para a carteira do
próprio emitente, como resulta expressamente da letra e do espírito do art.
378.º, n.º 1 do CdVM e foi já confirmado pelos tribunais portugueses.
6. Âmbito subjectivo
O crime é imputável apenas a pessoas singulares e a título doloso.
Quando no facto estejam envolvidas pessoas colectiva ou pessoas singulares
agindo com mera negligência poderão incorrer no ilícito contra-ordenacional
previsto no artigo 248.º, n.º 4 (conjugado com o art. 394.º, n.º 1 al. i), ambos
do CdVM), por utilização indevida de informação privilegiada.
As pessoas colectivas podem ainda ser demandadas no processo criminal como
partes civis, nos termos e para os efeitos do art. 378.º, n.º 7 do CdVM.
No caso de os mesmos factos constituírem simultaneamente crime e contra-
ordenação e forem imputáveis ao mesmo agente, pelo mesmo título de
imputação subjectiva, há lugar apenas ao procedimento criminal (art. 420.º, n.º
2 do CdVM).
31
7. Consequências legais
O crime de abuso de informação privilegiada é punido com penas principais,
penas acessórias e com consequências jurídicas especiais ao nível da perda das
vantagens económicas do crime, concretamente:
É punível com pena de prisão até três anos ou com pena de multa (que pode
ir de 10 dias a 360 dias de multa, nos termos do art. 47.º do Código Penal),
nos casos em que a informação privilegiada chegue ao conhecimento do
agente em virtude de uma das circunstâncias descritas no n.º 1 do artigo
378.º do CdVM;
É punível com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240
dias, no caso previsto no n.º 2 do artigo 378.º do CdVM;
São igualmente aplicáveis as penas acessórias de (a) interdição temporária
do exercício de profissão, actividade ou funções relacionadas com o crime
cometido, por um prazo não superior a cinco anos, e (b) publicação da
sentença condenatória a expensas do arguido (art. 380.º do CdVM);
Além disso, à semelhança do que sucede no caso da manipulação de
mercado, existe a possibilidade de demandar como parte civil no processo
crime um terceiro, seja pessoa singular, seja pessoa colectiva, cuja carteira
esteja envolvida nas transacções, para efeito da apreensão das vantagens
do crime ou da reparação de danos (art. 378.º, n.º 7, do CdVM).
As vantagens económicas obtidas com o crime devem ser apreendidas e
declaradas perdidas a favor da reparação dos lesados, do Estado e do
sistema de indemnização dos investidores (art. 380.º-A do CdVM e 111.º e
seguintes do Código Penal). O Código da Sociedades Comerciais contempla
ainda mecanismos especiais de reparação de danos (art. 449.º) e
procedimentos para a destituição judicial de titulares de órgãos sociais que
utilizem informação privilegiada (art. 450.º).
O envolvimento em factos desta natureza é ainda relevante para a aferição
das condições concretas de idoneidade profissional sempre que a lei a exija.
32
8. Casuística
A partir da experiência existente a nível nacional e internacional, é possível
identificar grupos de casos que correspondem a hipóteses de abuso de informação
privilegiada:
O administrador de uma entidade emitente propõe ao órgão de
administração um projecto de venda de uma das empresas do grupo, o que
vai originar um elevado encaixe financeiro. Durante o processo decisório
dessa operação esse administrador compra acções dessa sociedade emitente
para si ou para terceiro, sabendo que a divulgação da operação vai originar
uma subida do valor das acções.
Um membro do conselho fiscal de uma entidade emitente inicia uma
averiguação interna que revela a existência de casos de falsificação da
contabilidade da empresa e de fraude fiscal que serão conhecidos em breve.
Antes de concluído o relatório vende as acções que tem da empresa. Quando
o facto é conhecido do público as acções desvalorizam.
Uma entidade emitente inicia o processo de eventual lançamento de uma
oferta pública de aquisição sobre uma empresa concorrente. Antes da
decisão final vários administradores compram para si e para a própria
empresa acções da entidade visada.
O gestor de um fundo de investimento reúne com a administração de uma
entidade emitente e consegue obter informação privilegiada sobre os
projectos de investimento em curso, que só mais tarde serão apresentados
à assembleia geral, nomeadamente uma parceria a realizar com uma
empresa congénere na América Latina. Antes disso acontecer, o gestor
reforça a participação do fundo de investimento nessa entidade emitente,
prevendo uma valorização dos activos.
Um jurista é contratado para acompanhar uma operação de fusão entre
duas empresas. Antes de a operação ser divulgada ao público, revela o
projecto a um familiar que adquire acções de uma das empresas que serão
valorizadas com o anúncio da fusão.
Um “pirata informático” entra na rede de uma empresa e consegue ter
acesso à documentos do conselho de administração e ao agendamento das
propostas de deliberação, donde consta um reforço da posição accionista
numa empresa doutro sector económico. Vende essas informações a uma
33
empresa concorrente que as usa para adquirir em bolsa activos da empresa
visada, vendendo-os depois a preços mais elevados.
O gerente de um restaurante ouve uma conversa entre dois administradores
de uma empresa que ocorre numa sala reservada. Usa essa informação para
comprar acções da empresa visada pela operação que é objecto de conversa
entre os dois clientes.
9. Vigilância, investigação e denúncia pela CMVM
Como parte das competências de supervisão dos mercados de valores
mobiliários, a CMVM acompanha o seu funcionamento em tempo real, quer com
o recurso a sistemas informáticos, quer com recurso a meios humanos
especialmente afectos a essas tarefas.
A vigilância do mercado e o acompanhamento da informação sobre os factos e
os agentes económicos permitem identificar operações que fogem a padrões de
normalidade negocial, sujeitas depois uma análise mais rigorosa em função,
nomeadamente, da informação existente, da forma de negociação, dos
intermediários financeiros e dos investidores envolvidos.
Os casos suspeitos são objecto de investigação subsequente que termina em
denúncia da CMVM ao Ministério Público sempre que os elementos recolhidos
revelem fundadas suspeitas de corresponderem ao uso ilegal de informação
privilegiada. Nos últimos anos foram participados mais de duas dezenas de
casos suspeitos de abuso de informação. O relatório anual da CMVM contém
dados estatísticos sobre estas participações.
A tramitação subsequente do processo é da responsabilidade das autoridades
judiciárias. Nestes processos criminais a CMVM não tem parte activa oferecendo
apenas a sua colaboração de acordo e em função das solicitações das
autoridades judiciárias.
10. Decisões dos tribunais
Desde a reforma legislativa de 1999, existem cinco condenações pela prática do
crime de abuso de informação privilegiada e uma absolvição. Concretamente,
foram a julgamento seis casos de abuso de informação, tendo sido proferidas
quatro sentenças condenatórias e duas sentenças absolutórias em primeira
instância. Em todos os casos houve recurso da decisão final (interposto pela
34
defesa ou pelo Ministério Público). Das duas sentenças absolutórias um recurso
está pendente, a aguardar decisão na Relação de Lisboa; no outro processo este
Tribunal revogou a decisão absolutória substituindo-a por uma decisão
condenatória.
Em suma, quatro dos seis casos terminaram com uma decisão condenatória, já
transitada em julgado, estando pendentes dois recursos no Tribunal da Relação
de Lisboa (um recurso de uma decisão condenatória e outro de uma decisão
absolutória).
As autoridades judiciárias devem comunicar à CMVM as decisões proferidas em
processos por crimes contra o mercado (art. 387.º do CdVM quanto a todas as
decisões e art. 422.º do CdVM quanto às sentenças e acórdãos). Desde Março
de 2006, a CMVM divulga no seu site as sentenças e acórdãos proferidos após
esta data pelos Tribunais portugueses, em processos que tenham como objecto
crimes contra o mercado (e contra-ordenações muito graves), nos termos do
art. 422.º do CdVM.
Os tribunais portugueses têm proferido decisões que salvaguardam a
importância de preservar as justas condições de funcionamento do mercado, a
igualdade entre os investidores e evidenciam a lesão que o abuso de informação
causa aos investidores que negoceiam com as pessoas que usam informação
privilegiada.
Os casos são sumariamente os seguintes:
Aquisições de um administrador durante o processo de celebração
dum negócio que iria dar origem a uma OPA.
O presidente de uma empresa cotada detinha um lote maioritário de acções.
Uma outra empresa, igualmente cotada, iniciou contactos com ele,
manifestando interesse em comprar esse lote maioritário, desde que
conseguisse, através do lançamento de uma oferta pública subsequente,
adquirir no mínimo 90% do capital da empresa visada. Os contactos e
negociações prolongaram-se por vários meses, tornando-se o negócio viável
a partir de certa altura, pois o presidente da empresa visada assegurou
informalmente aos interessados que os demais accionistas venderiam as
suas posições. O potencial oferente acordou pagar um preço que equivalia a
mais do dobro do valor da cotação das acções nesse momento. Antes de o
processo negocial descrito estar concluído, um administrador não executivo
da empresa visada, parente próximo do presidente desta entidade, contraiu
35
um empréstimo bancário para aquisição de acções (dessa empresa), que
foram dadas como garantia do empréstimo. Vendeu depois na oferta pública
o grande lote de acções que adquiriu, por um valor genericamente
equivalente ao dobro do preço que havia pago.
O Tribunal considerou que se tratava de um caso de abuso de informação
privilegiada por um insider primário, que tinha obtido a informação em
função do cargo que exercia e das relações familiares com o presidente da
empresa visada, condenando-o na pena de 18 meses de prisão e 120 dias
de multa (à taxa diária de 295 Euros) e subsidiariamente (caso a multa não
fosse paga) a 80 dias de prisão. A pena foi suspensa por um período de 3
anos, suspensão essa condicionada ao dever de entregar a três instituições
de solidariedade social um valor global de 499.000 Euros. O Tribunal da
Relação de Lisboa confirmou a decisão em recuso, limitando-se a alterar a
pena concreta de 18 para 16 meses de prisão. A decisão transitou em
julgado e foi já executada.
Aquisições de uma sociedade visada por uma OPA por um
administrador da empresa oferente.
O presidente de uma empresa oferente numa OPA amigável, com relações
profissionais com a entidade visada pela oferta, acompanhou o processo de
montagem da operação, com intervenção directa em alguns documentos
essenciais do processo. Antes de ser anunciada a operação, deu a um
corretor ordens de compra sobre acções da empresa visada (uma entidade
cotada) para a carteira de títulos de dois familiares seus. A OPA foi então
anunciada contemplando um prémio de cerca de 29% em relação à cotação
média anterior. Quando a cotação subiu o agente vendeu as acções
anteriormente adquiridas, com uma mais-valia significativa.
O Tribunal considerou que o arguido tinha usado informação privilegiada que
havia adquirido profissionalmente, quer por estar ligado à entidade oferente,
quer à entidade visada, condenando-o na pena de 180 dias de multa, à taxa
diária de 350 Euros. A defesa interpôs recurso que se encontra pendente no
Tribunal da Relação de Lisboa.
Aquisição de acções de uma empresa que ia realizar uma fusão por
incorporação com outra empresa.
Uma sociedade cotada iniciou um projecto de fusão (por incorporação) com
outra empresa cotada do mesmo sector. Antes de divulgar publicamente a
operação, apresentou-a, com exigência expressa de sigilo, a um órgão
36
consultivo para obter o seu acordo. Um accionista de referência com assento
nesse órgão informou telefonicamente um colaborador da sua empresa do
projecto que iria ser anunciado em breve. Esse colaborador deu ordens de
compra de acções de uma das empresas envolvidas, para a sua própria
carteira e para a carteira de títulos da empresa dirigida pelo accionista de
referência que tinha obtido a informação em primeira linha. Conseguiram
adquirir lotes significativos de acções antes de a operação ser anunciada e o
preço subir. Essas acções não só se valorizaram com o anúncio da operação,
como poderiam ser trocadas por acções da outra empresa envolvida na
fusão, com um acréscimo significativo de valor. O que veio a ser aproveitado
por ambos os arguidos, tendo um mantido as acções em carteira enquanto o
outro alienou as que havia adquirido.
O Tribunal considerou que os agentes cometeram em co-autoria o crime de
abuso de informação privilegiada, condenando cada um na pena de 180 dias
de multa (à taxa diária de 300 Euros) e, além disso, pelas aquisições
individuais que havia feito para a sua própria carteira, condenou ainda um
dos arguidos como autor singular da prática de outro crime de abuso de
informação privilegiada, na pena de 120 dias de multa (à taxa diária de 300
Euros). Em cúmulo jurídico a pena deste último arguido ficou em 260 dias
de multa (à taxa diária de 300 Euros). A defesa recorreu da decisão e o
Ministério Público interpôs recurso autónomo requerendo que fosse ainda
decretada a perda a favor do Estado das vantagens patrimoniais obtidas
com a prática do crime. O Tribunal da Relação de Lisboa negou razão à
defesa e deu razão ao Ministério Público, decretando a perda das vantagens
económicas do crime. A defesa recorreu para o Tribunal Constitucional, que
lhe negou razão em todos os pontos do recurso, baixando o processo para
execução.
Aquisição de acções de uma sociedade que seria visada por uma OPA
por um administrador da oferente para a carteira desta.
Uma empresa preparou uma operação que se traduzia em comprar um
grande lote de acções de uma sociedade cotada (mais de 44% do seu
capital), que estava na carteira de uma holding do grupo da sociedade
visada, lançando em seguida uma OPA sobre o restante capital ao preço que
pagaria pelo grande lote. A proposta foi formalizada junto da holding
detentora do grande lote e a execução da operação foi confiada, com um
amplo mandato, a um director geral da oferente, com responsabilidade na
37
área da execução de projectos de investimento bolsista, que acompanhou
todo o empreendimento desde o início. O director geral da oferente optou
por adquirir o grande lote referido em bolsa através dum encontro. Mas,
para o efeito, deu uma ordem telefónica superior ao volume do grande lote,
sabendo que dessa forma iria adquirir todas as demais acções que estavam
a ser oferecidas a preço inferior ao do grande lote. O que efectivamente veio
a acontecer: foi adquirido não só o grande lote, como também mais de
350.000 acções de outros investidores, o que se traduziu num ganho para a
oferente que não teve de comprar essas acções ao preço a que depois
lançou a OPA.
O Tribunal considerou que a decisão e execução da operação nestes termos
implicou necessariamente a aquisição de acções com informação privilegiada
e condenou o arguido na pena de 170 dias de multa (à taxa diária de 250
Euros). A defesa recorreu para a Relação que lhe negou razão confirmando a
sentença recorrida. A defesa recorreu novamente para o Tribunal
Constitucional que considerou o recurso improcedente. A sentença transitou
em julgado e já foi executada.
Aquisição de acções de uma sociedade cotada antes do anúncio de
lançamento de uma OPA.
Uma sociedade preparou e lançou uma OPA amigável sobre uma empresa
cotada, tendo o apoio de um banco de investimento como consultor do
projecto. O Ministério Público acusou e, depois de realizada a instrução, o
Tribunal de Instrução Criminal pronunciou dois arguidos por,
indiciariamente, terem adquirido antes do anúncio de lançamento da OPA
acções da entidade visada através de duas empresas off-shore. De acordo
com a acusação do Ministério Público e a pronúncia do Tribunal de Instrução
Criminal estas sociedades off-shore pertenciam a um parente de um
administrador do banco de investimento que assessorou a preparação da
operação que, por seu turno, seria alegadamente a fonte primária da
informação privilegiada. As acções adquiridas foram vendidas após o anúncio
da OPA gerando mais valias.
Realizado o julgamento, o Tribunal, apesar de expressar na sentença “sérias
suspeitas” sobre a forma como as coisas aconteceram, absolveu os arguidos
invocando uma dúvida razoável. O Ministério Público recorreu desta
sentença, alegando erros e nulidades na fundamentação da decisão,
encontrando-se o recurso pendente no Tribunal da Relação de Lisboa.
38
Aquisição de um lote de acções antes do lançamento de uma OPA
com tratamento diferenciado dos accionistas.
O Ministério Público acusou e, depois de realizada a instrução, o Tribunal de
Instrução Criminal pronunciou dois arguidos, administradores de uma
sociedade cotada, por indiciariamente terem adquirido a um fundo de
investimento um grande lote de acções de outra sociedade cotada quando,
na mesma altura, estavam preparar o lançamento de uma OPA e a negociar
a aquisição de outro grande lote a outro accionista por valor superior à
primeira aquisição referida. Este lote foi efectivamente adquirido a preço
superior e a OPA foi lançada nesse mesmo dia a esse preço.
O Tribunal considerou que, aquando da primeira aquisição ao fundo de
investimento, ainda não existia “informação precisa” que pudesse, por isso,
ser considerada informação privilegiada. Em função desse enquadramento
absolveu os arguidos. O Ministério Público discordou da decisão e dos seus
fundamento e interpôs recurso. O Tribunal da Relação de Lisboa apreciou o
recurso e revogou a decisão absolutória, com fundamento – entre outros
aspectos – numa errada apreciação da prova produzida e em erro de Direito
quanto ao entendimento do conceito legal de informação privilegiada. Em
consequência, o Tribunal da Relação de Lisboa condenou os arguidos na
pena de 180 dias de multa à taxa diária de 250 Euros, num total de 45.000
Euros cada multa. A decisão já transitou em julgado, encontrando-se em
fase de execução.
39
MANIPULAÇÃO DO MERCADO
CONCEITOS, COMPORTAMENTOS PROIBIDOS,
CONSEQUÊNCIAS LEGAIS, TIPOLOGIAS DE MANIPULAÇÃO
E DECISÕES JUDICIAIS
CMVM
2008
40
SUMÁRIO
Introdução 41
1. Fundamento 41
2. Condutas proibidas 42
3. Âmbito subjectivo 43
4. Consequências legais 43
5. Exemplos de práticas manipuladoras (tipologias) 44
6. Vigilância, investigação e denúncia pela CMVM 47
7. Decisões dos tribunais 48
41
Introdução
O presente texto descreve o regime da manipulação do mercado, abrangendo
alguns exemplos que, de acordo com a experiência dos últimos anos (nacional e
comunitária), têm vindo a ser enquadrados como casos de manipulação.
A tipologia de casos que se apresenta não pretende ser exaustiva, não
excluindo, assim, a possibilidade de outras situações poderem ser qualificadas
como manipulação do mercado. Pretende-se apenas ilustrar a manipulação do
mercado através de exemplos impressivos que têm vindo a ser detectados
através da actividade de supervisão e investigação dos vários reguladores
europeus.
O elenco de práticas de manipulação que se apresenta neste documento tem a
sua fonte essencial nas orientações emitidas pelo CESR, em 2004, a propósito
das novas directivas sobre abuso de mercado (documento do CESR n.º 04-
505b, disponível no site daquela entidade, em www.cesr.eu).
Como ponto prévio à enunciação dessa tipologia, apresenta-se uma breve
descrição do fundamento e conteúdo das disposições legais sobre o crime de
manipulação de mercado: condutas proibidas, âmbito subjectivo e
consequências penais.
A finalizar, descrevem-se as decisões que os tribunais portugueses proferiram
quanto a esta matéria, assim ilustrando o respectivo tratamento jurisprudencial.
1. Fundamento
A razão da criminalização das situações caracterizadas como manipulação de
mercado assenta, como é assumido nos considerandos da Directiva 6/2003/CE,
na necessidade de garantir a integridade dos mercados financeiros e promover
a confiança dos investidores, proibindo-se as práticas que coloquem em causa
essa integridade e que, nos termos do disposto no artigo 379.º, n.º 1, do
Código dos Valores Mobiliários (CdVM) se reconduzem a três grupos de
situações, conforme adiante se descreve.
As condições de regular funcionamento dos mercados de valores mobiliários
devem ser preservadas por diversas razões: quer pelo facto de serem
canalizadas para o mercado as poupanças dos investidores, quer por existir uma
relação entre a visibilidade da empresa emitente e o interesse gerado pelos
seus activos negociados no mercado, quer ainda pelo facto de a negociação, em
42
si mesma, gerar informação para os investidores ao nível das quantidades,
preços e tendências de mercado. Acresce que os preços que se formam em
mercado regulamentado são preços públicos de referência, utilizados em
inúmeras decisões públicas e privadas. Se a negociação ocorrer com respeito
pelo livre jogo da oferta e da procura as tendências de mercado que se formam
são reais. Caso contrário, poderão ser artificiais e induzir em erro os diversos
agentes económicos e entidades públicas. Garantir a veracidade de todos estes
aspectos é, portanto, essencial para que os investidores, empresas e
reguladores tomem decisões esclarecidas e consequentes.
2. Condutas proibidas
A lei portuguesa proíbe comportamentos negociais ou informativos que, pela
sua natureza ou consequências, sejam idóneos a criar uma situação enganadora
sobre um valor mobiliário ou sobre uma entidade emitente. De forma mais
precisa, o art. 379.º, n.º 1 do CdVM proíbe penalmente as seguintes condutas:
Divulgação de informações falsas, incompletas, exageradas ou
tendenciosas,
Realização de operações de natureza fictícia e
Execução de outras práticas fraudulentas
Que (em qualquer um dos casos) sejam idóneas para alterar artificialmente
o regular funcionamento do mercado de valores mobiliários ou de outros
instrumentos financeiros (aptidão da conduta).
Além destas modalidades de manipulação, a lei prevê (desde 1999) um crime
específico que pode ocorrer no âmbito de um intermediário financeiro: cometem
esse crime os titulares do órgão de administração e as pessoas responsáveis
pela direcção ou pela fiscalização de áreas de actividade de um intermediário
financeiro que, tendo conhecimento de factos que constituam manipulação e
que sejam praticados por pessoas directamente sujeitas à sua direcção ou
fiscalização e no exercício das suas funções, não lhes ponham imediatamente
termo (art. 379.º, n.º 3 do CdVM).
Os factos descritos podem ser cometidos na forma consumada ou na forma
tentada e ainda em qualquer uma das modalidades de comparticipação
previstas no Código Penal (arts 22.º, 26.º e 27.º).
Do âmbito das proibições estão excluídas:
43
As operações efectuadas pelo Banco Central Europeu, por um Estado,
pelo seu banco central ou por qualquer outro organismo designado pelo
Estado, por razões de política monetária, cambial ou de gestão de dívida
pública (n.º 6 do art. 379.º do CdVM);
As operações de estabilização de preços, quando sejam efectuadas nas
condições legalmente permitidas (n.º 6 do art. 379.º do CdVM);
As operações de fomento de mercado realizadas nos termos da lei (art.
348.º do CdVM e art. 28.º e seguintes do Regulamento CMVM 5/2000);
As práticas de mercado aceites, cuja identificação, divulgação e
comunicação seja realizada nos termos do art. 360.º, n.º 1 al. i) do
CdVM.
3. Âmbito subjectivo
O crime é imputável apenas a pessoas singulares e a título de doloso, em
qualquer uma das modalidades descritas no art. 14.º do Código Penal.
As pessoas colectivas podem ser demandadas no processo criminal como partes
civis, nos termos e para os efeitos do art. 379.º, n.º 5 do CdVM.
Quando no comportamento esteja envolvido um intermediário financeiro poderá
este incorrer num ilícito contra-ordenacional pela violação do dever de defesa
do mercado que lhe é imposto pelo artigo 311.º do CdVM. A imputação ao
intermediário financeiro da contra-ordenação aí prevista pode ser feita, não só a
título de dolo, mas também de negligência.
A relação entre este dever de defesa de mercado e o dever de comunicação de
operações suspeitas é desenvolvida em outro documento da CMVM (cfr.
Comunicação de operações suspeitas e defesa do mercado, CMVM, 2008).
4. Consequências legais
O crime de manipulação de mercado é punido com penas principais, penas
acessórias e com consequências jurídicas especiais ao nível da perda das
vantagens económicas do crime. Assim:
44
O crime de manipulação de mercado é punível com pena de prisão até três
anos ou com pena de multa (que pode ir de 10 dias a 360 dias de multa,
nos termos do art. 47.º do Código Penal).
Com penas acessórias de (a) interdição temporária do exercício de profissão,
actividade ou funções relacionadas com o crime cometido, por um prazo não
superior a cinco anos, e (b) publicação da sentença condenatória a expensas
do arguido (art. 380.º).
A omissão dolosa do dever de impedir de imediato práticas manipuladoras
no âmbito dos intermediários financeiros é punida com pena de prisão até 2
anos ou pena de multa até 240 dias, se pena mais grave não lhes couber
por força de outra disposição legal.
Além disso, o novo regime prevê a possibilidade de demandar como parte
civil no processo-crime um terceiro, seja uma pessoa singular seja uma
pessoa colectiva, cuja carteira esteja envolvida nas transacções, para efeito
da apreensão das vantagens do crime ou da reparação de danos.
As vantagens económicas obtidas com o crime devem ser apreendidas e
declaradas perdidas a favor da reparação dos lesados, do Estado e do
sistema de indemnização dos investidores (art. 380.º-A do CdVM e 111.º e
seguintes do Código Penal).
O envolvimento em factos desta natureza é ainda relevante para a aferição
das condições concretas de idoneidade profissional sempre que a lei a exija.
5. Exemplos de práticas manipuladoras (tipologias)
Descrevem-se a seguir um conjunto de práticas negociais que, a título de
exemplo, podem revelar casos de manipulação do mercado.
a) Transacções fictícias (wash trades): prática que consiste em efectuar
transacções em que não há qualquer alteração do beneficiário económico
do instrumento financeiro transaccionado.
b) Pintar a fita (Painting the tape): prática que consiste em efectuar uma
transacção ou uma série de transacções que adquirem visibilidade através
de meios acessíveis ao público, de forma a dar a impressão enganosa de
actividade ou movimentação do preço de um determinado instrumento
financeiro.
45
c) Acasalamento de ordens (Improper matched orders): prática que
consiste na introdução temporalmente próxima, pela mesma pessoa ou
por pessoas diferentes agindo em concertação, de ordens de compra e de
venda com o mesmo preço e quantidade (a menos que as transacções
sejam legítimas por serem efectuadas no âmbito do que é permitido pelas
regras do mercado em causa).
d) Introdução de ordens sem intenção de as executar: esta prática
consiste na introdução de ordens, especialmente em sistemas de
negociação electrónicos, a um preço mais alto ou mais baixo do que a
oferta de venda ou de compra anterior. A intenção não é de que a ordem
seja executada, mas sim a de dar a impressão de que existe oferta ou
procura daquele instrumento financeiro.
e) Marcação do preço de fecho (Marking the close): prática que consiste
na compra ou venda de instrumentos financeiros na altura do fecho do
mercado, de forma a influir na determinação do preço de fecho, em
particular quando este constitui preço de referência.
f) Concertação na sequência de Oferta Pública de Subscrição: esta
prática consiste na concertação entre pessoas que adquiriram
instrumentos financeiros numa Oferta Pública de Subscrição no sentido de
adquirirem mais instrumentos assim que se inicia a sua negociação em
mercado, por forma a fixar o seu preço num nível artificial, gerando
interesse dos restantes investidores, vendendo em seguida.
g) Abuso de posição dominante (Abusive squeeze): prática que consiste
em alguém que tem uma influência significativa sobre a oferta ou procura
de determinado instrumento financeiro, aproveitar-se dessa possibilidade
de forma a distorcer o preço de referência para o cumprimento de
obrigações decorrentes de operações sobre aqueles instrumentos
financeiros. Saliente-se, todavia, que a normal interacção entre a oferta e
a procura pode, em alguns casos, conduzir a um decréscimo da procura
em mercado, mas tal facto não constitui por si manipulação de mercado.
h) Sustentação do preço (Creation of a floor in the price pattern): esta
prática é normalmente levada a cabo por emitentes ou por entidades que
os controlam e consiste em realizar transacções ou emitir ordens de forma
a impedir que o preço desça abaixo de um determinado nível. Esta prática
tem de ser distinguida da realização de transacções no âmbito de
46
programas de recompra de acções próprias ou de estabilização, desde que
efectuadas dentro das condições legalmente permitidas.
i) Controlo do spread (Excessive bid-ask spreads): conduta que consiste
em intermediários financeiros (por exemplo, especialistas e market
makers), actuando concertadamente e aproveitando o seu poder de
mercado, designadamente pela ausência de concorrentes, introduzirem
ordens com o objectivo de alterar o spread ou mantê-lo a um nível
artificial.
j) Manipulação inter-mercados: prática que consiste em efectuar
transacções sobre um instrumento financeiro num mercado de forma a
influenciar o seu preço, ou o de um instrumento financeiro com ele
relacionado, noutro mercado (o que pode ser realizado, designadamente,
através de uma estratégia de marking the close).
l) Disseminação de informação falsa ou enganosa através dos media,
incluindo Internet, ou por qualquer outro meio de divulgação com a
intenção de produzir uma alteração no preço de um instrumento
financeiro. Esta prática pode articular-se com transacções sobre os
instrumentos financeiros visados pela informação ou instrumentos com
eles relacionados.
m) Compra seguida de disseminação de informação falsa e de venda
(Pump and dump): prática que consiste em adquirir uma posição longa
num instrumento financeiro e posteriormente disseminar informação
enganosa de natureza positiva acerca do instrumento financeiro em causa
com o objectivo de produzir um aumento do seu preço em mercado e o
interesse dos demais investidores, momento em que a posição é alienada.
n) Venda seguida de disseminação de informação falsa e de compra
(Trash and cash): prática oposta ao pump and dump. Consiste na
assunção de uma posição curta num instrumento financeiro e posterior
disseminação de informação enganosa negativa com o objectivo de fazer
baixar o preço do instrumento financeiro em causa, momento em que a
posição é fechada, ganhando-se na diferença entre o preço de venda e o
posterior preço de compra.
o) Abrir uma posição e fechá-la imediatamente após a sua divulgação.
Esta prática é normalmente desenvolvida por gestores de carteiras e
outros grandes investidores, cujas decisões de investimento são
47
normalmente tidas em consideração pelos outros investidores como sinais
relevantes da dinâmica do mercado. A prática consiste em estes
investidores venderem a sua posição imediatamente após terem divulgado
a sua detenção, enfatizando o facto de se tratar de um investimento a
longo prazo. Esta situação não abrange os casos em que a divulgação é
realizada em cumprimento de um dever de divulgação de participação
qualificada.
6. Vigilância, investigação e denúncia pela CMVM
Como parte das competências de supervisão dos mercados de valores
mobiliários, a CMVM acompanha o seu funcionamento em tempo real, quer com
o recurso a sistemas informáticos, quer com recurso a meios humanos
especialmente afectos a essas tarefas. Nas suas rotinas de supervisão
quotidianas a CMVM aplica procedimentos que visam detectar padrões anómalos
nos preços e nas quantidades transaccionadas, especificamente concebidos para
detectar transacções falsas ou enganosas, bem como práticas de manipulação
de preços. Além de outras, tais testes visam detectar as práticas negociais
descritas no ponto antecedente.
A vigilância do mercado e o acompanhamento da informação sobre os factos e
os agentes económicos permitem identificar operações que fogem a padrões de
normalidade negocial, sujeitas depois uma análise mais rigorosa em função,
nomeadamente, da informação existente, da forma de negociação, dos
intermediários financeiros e dos investidores envolvidos.
Os casos suspeitos são objecto de uma investigação subsequente que termina
em denúncia da CMVM ao Ministério Público sempre que os elementos
recolhidos apresentem fundadas suspeitas de corresponderem a práticas ou
condutas manipuladoras. Nos últimos anos foram participados alguns casos de
manipulação do mercado, quer por informação enganadora, quer por
negociação artificial.
A tramitação subsequente do processo é da responsabilidade das autoridades
judiciárias. Nestes processos criminais a CMVM não tem parte activa,
oferecendo apenas a sua colaboração de acordo e em função das solicitações
das autoridades judiciárias.
48
7. Decisões dos tribunais
Em Portugal foram a julgamento nos últimos anos dois casos de manipulação de
mercado, denunciados pela CMVM. Deram origem a duas decisões
condenatórias que foram objecto de recurso pela defesa: uma delas está
pendente no Tribunal da Relação de Lisboa e a outra transitou em julgado,
estando em fase de execução.
As autoridades judiciárias devem comunicar à CMVM as decisões proferidas em
processos por crimes contra o mercado (art. 387.º do CdVM quanto a todas as
decisões e art. 422.º do CdVM quanto às sentenças e acórdãos).
Desde Março de 2006, a CMVM divulga no seu site as sentenças e acórdãos
proferidos após esta data pelos Tribunais portugueses, em processos que
tenham como objecto crimes contra o mercado (e contra-ordenações muito
graves), nos termos do art. 422.º do CdVM.
Os tribunais portugueses têm proferido decisões adequadas aos interesses que
a lei visa proteger ao incriminar a manipulação do mercado. Numa breve e
genérica descrição, a factualidade dada como provada nas sentenças foi, no
essencial, a seguinte:
Operações de natureza fictícia e outras práticas fraudulentas: dois
arguidos adquiriram (legitimamente) uma participação qualificada numa
empresa. Posteriormente, iniciaram contactos com o bloco maioritário que
detinha a administração no sentido participarem de forma activa na vida da
empresa, formulando diversas exigências. Para o efeito, exerceram de forma
intensa os diversos direitos societários como bloco minoritário. Neste
contexto, procuram vender a sua posição ao bloco maioritário, por um preço
muito superior à cotação que as acções tinham em mercado. Enquanto
decorriam estas negociações, com avanços e recuos, os arguidos realizaram
centenas de transacções no mercado a contado, em concertação entre si ou
entre carteiras por si controladas, cruzando posições contrárias com poucos
segundos de intervalo. Com esta rotação intensiva de títulos aumentaram a
liquidez e o preço das acções ao longo do tempo. Valorizaram a participação
qualificada que detinham e diminuíram a diferença entre o preço de mercado
e o preço que pediam pelo seu lote aos accionistas maioritários. Algumas
das transacções marcaram a cotação de referência para o dia seguinte.
49
Em 2005 realizou-se o julgamento e Tribunal considerou que se estava
perante um caso de manipulação com diversas operações de circular
trading, matched orders e marking the close. Condenou os arguidos pela
prática em co-autoria do crime de manipulação de mercado, nas penas de
260 dias de multa (total de 12.740 Euros) e 240 dias de multa (total de
11.760 Euros). Aplicou ainda a pena de publicação acessória da sentença a
divulgar por extracto, a expensas dos arguidos, num jornal diário
especializado em matéria económica ou financeira de tiragem nacional e
numa publicação oficial do mercado de valores mobiliários, sob pena de
desobediência em caso de incumprimento. Determinou a perda a favor do
Estado das vantagens económicas obtidas com o crime, no montante de
1.902.249,36 Euros (calculado por aplicação do critério do custo médio
ponderado), por depósito à ordem dos autos no prazo de trinta dias a contar
do trânsito em julgado da decisão. Foram interpostos pela defesa diversos
recursos de decisões interlocutórias, bem como da decisão final. Este
encontra-se à data pendente no Tribunal da Relação de Lisboa.
Prática fraudulenta (ordens dadas com identidade falsa para fazer
subir a cotação e fechar negócio com uma oferta do arguido). Numa
sexta-feira à tarde, pouco antes do fecho da sessão de bolsa, um funcionário
de um intermediário financeiro usou uma identidade falsa e, a partir de um
telemóvel emprestado, deu uma ordem de venda telefónica a uma corretora.
Fê-lo usurpando o nome de uma empresa (que era cliente dessa corretora),
revelando conhecimento da empresa que dizia representar, tornando-se
desse modo convincente, e deu uma ordem de venda com uma quantidade e
um preço muito elevados. Minutos depois, nos últimos segundos da
negociação, deu uma ordem de compra sobre os mesmos activos, que
fechou negócio com a primeira e que, sendo executada no período de
consolidação de ofertas, arrastou para um nível de preço muito superior
todas as demais ofertas que estavam pendentes. Entre estas ofertas
encontrava-se uma oferta de venda introduzida por esse operador sobre
uma carteira que pertencia à sua mulher e que era gerida por si. O novo
preço chegou a ser publicado no boletim de cotações da segunda-feira
seguinte, apesar da CMVM e da entidade gestora da bolsa terem
(excepcionalmente) promovido a anulação das transacções.
50
Realizado o julgamento, em 2005, o Tribunal considerou que se tratava de
uma prática fraudulenta de natureza manipulatória e condenou o arguido na
pena de prisão de um ano e quatro meses, com a execução suspensa pelo
período de quatro anos, acrescida da sanção acessória de inibição do
exercício da actividade profissional por um período de três anos. O arguido
recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa que confirmou a decisão
recorrida, tendo transitado em julgado.
51
ENTENDIMENTOS DA CMVM SOBRE
A DIVULGAÇÃO DE INFORMAÇÃO
PRIVILEGIADA POR EMITENTES
CONCEITOS, LINHAS DE ORIENTAÇÃO, EXEMPLOS
E CONDUTAS A ADOPTAR
CMVM
2008
52
SUMÁRIO
Introdução 53
I. O regime legal: traços essenciais 54
II. Entendimentos da CMVM quanto à divulgação de informação privilegiada 55
A. Informação (especifica) directa 55
B. Informação (específica) indirecta 56
C. Informação precisa 57
D. Informação não pública 59
E. Informação idónea para influenciar o preço 60
F. Alterações a informação anteriormente divulgada 61
G. Exemplos de factos que podem constituir informação privilegiada 61
III. Possibilidade de diferimento da divulgação de informação privilegiada 64
A. Regime legal da divulgação diferida 64
B. Entendimentos da CMVM sobre a divulgação diferida 65
IV. Regras de conduta 66
A. Que condutas devem as sociedades cotadas adoptar? 66
B. Que condutas devem as sociedades cotadas evitar? 68
C. Que condutas devem adoptar as terceiras entidades? 69
53
Introdução
Os presentes Entendimentos da CMVM, relativos ao dever dos emitentes
divulgarem informação privilegiada, constituem uma revisão e actualização dos
Entendimentos anteriores, publicados em 2006, após a transposição das
Directivas do abuso de mercado para o nosso ordenamento jurídico.
A revisão dos Entendimentos é ditada, não por uma inflexão de orientações,
mas sim pela necessidade de ter em linha de conta a riqueza de novos casos
concretos na compreensão dos deveres legais e pelo propósito de incorporar as
linhas de orientação entretanto divulgadas pelo CESR, em Julho de 2007 (cfr.
CESR/06-562b, documento disponível em www.cesr.eu).
Em função da experiência destes últimos dois anos, os Entendimentos foram
simplificados e depurados, na medida do possível, pois uma parte significativa
do enquadramento normativo foi já interiorizada pelos destinatários dos regimes
legais.
Através dos presentes Entendimentos a CMVM divulga não apenas o regime
legal vigente na matéria, como também a interpretação que segue na
compreensão de alguns deveres, ilustra as diversas situações com casos
concretos adequados ao universo das entidades emitentes e descreve os
comportamentos que, na sua perspectiva, podem ser adoptados para atingir os
fins visados pela lei. Ao fazê-lo por referência a documentos internacionais
emanados pelo CESR, cria-se também um nível harmonizado de concretização
das soluções legais nos diversos ordenamentos jurídicos da Europa.
O cumprimento dos deveres legais de divulgação de informação privilegiada por
emitentes constitui uma matéria de primordial importância para a integridade
do mercado de instrumentos financeiros e um pressuposto da necessária
eficiência do mesmo. Do seu cumprimento rigoroso depende, tanto o regular
funcionamento do referido mercado, como a confiança pública no mesmo.
A publicação deste documento não prejudica a necessidade de cumprimento dos
entendimentos que tenham sido ou venham a ser transmitidos directa a
determinada empresa ou grupos de empresas, em função da especificidade do
sector ou sectores de actividade em que operam.
54
I. O regime legal: traços essenciais
Por informação privilegiada entende-se (art. 378.º, n.º 3 do CdVM) toda a
informação que:
Diga directa ou indirectamente respeito aos emitentes ou aos valores
mobiliários por si emitidos,
Tenha carácter preciso,
Não tenha sido tornada pública,
Se lhe fosse dada publicidade, seria idónea para influenciar de maneira
sensível o preço desses valores mobiliários ou dos instrumentos
subjacentes ou derivados com estes relacionados.
Para sintetizar estas quatro exigências, é habitual afirmar-se que a informação
tem de ser, respectivamente, específica, precisa, não pública e idónea para
alterar de maneira sensível o preço (price sensitive). A informação específica
pode dizer directa ou indirectamente respeito aos emitentes ou aos valores
mobiliários por si emitidos, o que se afigura relevante para delimitar o dever de
divulgação imediata como adiante se verá.
O conceito de informação privilegiada abrange os factos ocorridos, existentes ou
razoavelmente previsíveis, independentemente do seu grau de formalização,
que, por serem susceptíveis de influir na formação dos preços dos valores
mobiliários ou dos instrumentos financeiros, qualquer investidor razoável
poderia normalmente utilizar, se os conhecesse, para basear, no todo ou em
parte, as suas decisões de investimento (n.º 2 do artigo 248.º do CdVM).
O dever de divulgação de informação privilegiada a cargo dos emitentes,
previsto no artigo 248.º, n.º 1 do CdVM, abrange apenas a informação
privilegiada que lhes diga directamente respeito ou aos valores mobiliários por
si emitidos.
O dever de divulgação abrange ainda qualquer alteração à informação tornada
pública em cumprimento dos termos previstos no n.º 1 do artigo 248.º do
CdVM.
Fora do dever de divulgação fica a informação privilegiada relativa a factos que
apenas digam indirectamente respeito aos emitentes e aos valores mobiliários
por si emitidos, enquanto tais factos mantiverem essa característica.
55
Estão obrigados ao dever de divulgar a informação referida todos os emitentes,
independentemente da lei pessoal a que se encontram sujeitos, de valores
mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado situado ou a
funcionar em Portugal, ou que tenham requerido a respectiva admissão a um
mercado dessa natureza.
Desenvolvimentos sobre o conceito legal de informação privilegiada, o seu
regime e o significado que possui para os agentes e para os mercados encontra-
se no documento da CMVM intitulado “Abuso de informação privilegiada”.
II. Entendimentos da CMVM quanto à divulgação de informação
privilegiada
Com os presentes entendimentos a CMVM organiza um conjunto de elementos de
natureza diversa que podem auxiliar na interpretação dos critérios que orientam o
dever de divulgação de informação privilegiada a cargo dos emitentes.
A. Informação (específica) directa
1. A informação privilegiada relevante a divulgar pelas entidades emitentes
abrange dois núcleos essenciais de factos:
Os factos directamente relacionados com os emitentes; e
Os factos directamente relacionados com valores mobiliários por si
emitidos.
2. A informação não tem de se relacionar exclusivamente com o emitente ou
com os valores mobiliários por si emitidos. Com efeito, pode tratar-se de
informação relacionada com vários emitentes ou com vários valores mobiliários
emitidos por múltiplos emitentes. Neste caso, os mesmos factos, por exemplo
relacionados com dois emitentes distintos, poderão dar lugar a outros tantos
deveres de divulgação de informação privilegiada, a cargo dos dois emitentes
envolvidos.
3. A título ilustrativo, as situações que tipicamente se relacionam de modo
directo com o emitente são as que respeitam:
À posição financeira ou resultados;
À estratégia e desenvolvimento do negócio;
À estrutura de capital e o respectivo controlo; e
56
As decisões, comunicadas aos emitentes, de âmbito particular de
autoridades de supervisão ou de regulação.
4. A informação que habitualmente se relaciona de modo directo com os
valores mobiliários emitidos diz essencialmente respeito:
Às condições de emissão e
Ao conteúdo dos mesmos.
B. Informação (específica) indirecta
5. A principal diferença entre os factos abrangidos pelo n.º 1 do artigo 248.º do
do CdVM e os factos que apenas indirectamente dizem respeito ao emitente ou
aos valores mobiliários por si emitidos reside na circunstância de, quanto aos
últimos, o emitente não poder controlar o momento da sua ocorrência, o seu
conteúdo, o momento da sua divulgação ao público ou a forma dessa
divulgação.
6. Na generalidade das situações o emitente apenas tomará delas
conhecimento juntamente com o restante público ou, mesmo que as conheça
antes, poderá encontrar-se impedido de divulgar publicamente as informações
relevantes antecipando-se à respectiva fonte.
7. Exemplos de informação privilegiada indirectamente relacionada com o
emitente:
Informações estatísticas divulgadas por organismos públicos;
Publicação (próxima) de relatórios de notação de risco;
Decisões do banco central relativas a taxa de juro;
Decisões governamentais relativas a enquadramento fiscal,
regulamentação sectorial, etc.;
Decisões da autoridade responsável pelo controlo da concorrência nos
mercados relevantes em que se insira o emitente;
Decisões relevantes do Governo e outros organismos públicos, de
natureza central, regional ou local.
8. Exemplos de informação privilegiada indirectamente relacionada com os
valores mobiliários emitidos:
57
Publicação (próxima) de relatórios de research, recomendações de
investimento ou análises referentes ao valor de instrumentos financeiros
cotados;
Decisões relativas à alteração das regras sobre composição de índices de
mercado;
Decisões relativas as regras aplicáveis aos mercados regulamentados ou
não regulamentados em que os instrumentos financeiros sejam
negociados;
Alteração no modo de negociação ou das condições de negociação (por
exemplo, alteração do segmento de mercado em que os instrumentos
financeiros são negociados, substituição do criador de mercado, etc.)
9. Apesar de a lei isentar os emitentes de divulgar a informação privilegiada
fundada em factos apenas indirectamente relacionados com o emitente ou com
os valores mobiliários por si emitidos, o emitente deve realizar uma análise
autónoma sobre as consequências dos referidos factos na sua actividade ou nos
valores mobiliários por si emitidos.
10. A partir do momento em que se apurem consequências directas na
actividade do emitente ou nos valores mobiliários por si emitidos e estas
consubstanciem informação que preenche os requisitos do n.º 1 do artigo 248.º
do CdVM, passa a existir um dever de divulgação imediata dessa informação.
11. Pode, por exemplo, surgir para um emitente o dever de divulgação de
informação privilegiada no seguimento de uma decisão (ainda que não
definitiva) da autoridade reguladora da actividade por ele desenvolvida relativa
ao enquadramento legal, regulamentar ou tarifário.
12. Os factos que apenas indirectamente se relacionam com o emitente ou com
os instrumentos financeiros por ele emitidos, têm normalmente a sua origem ou
a sua divulgação dependente de terceiras entidades, exteriores ao emitente. A
forma como essas terceiras entidades gerem a informação sobre tais factos tem
repercussões sobre os mercados financeiros. Por isso, no final deste documento
descrevem-se algumas regras de conduta que lhes são dirigidas.
C. Informação precisa
13. A avaliação do carácter preciso da informação exige uma análise
casuística em função das circunstâncias concretas. Podem, contudo, identificar-
se os seguintes critérios interpretativos:
58
14. No que toca a factos ocorridos, a informação é precisa sempre que se
baseie em elementos concretos por oposição a rumores ou especulação.
15. Quando os rumores não tenham qualquer substância, os emitentes não
estão legalmente obrigados a divulgar qualquer informação, a não ser quando a
CMVM assim o determine. Não obstante, é conveniente ponderarem o interesse
em divulgar imediatamente um comunicado de forma a evitar que persistam
equívocos no mercado que lhes digam respeito.
16. Diferentes são as situações em que tenha existido quebra, total ou
parcial, do dever de sigilo no emitente, e a informação ou parte dela comece a
circular para lá do circulo reservado dos intervenientes no processo,
nomeadamente um processo negocial, potenciando situações de insider trading.
17. Essa circunstância exige uma confirmação ou um desmentido da
entidade emitente, de modo a pôr cobro à inexactidão ou insuficiência da
informação e a cumprir o dever legal de divulgação imediata de informação
privilegiada.
18. A passividade do emitente neste caso não é aceitável porque, por um
lado, já existe uma assimetria informativa ilícita que tem origem na violação
dum dever de confidencialidade e, por outro lado, não é aplicável o regime do
deferimento da divulgação pois este pressupõe que a informação continua
confidencial, o que não se verifica no caso descrito.
19. Tanto a informação relativa a cada uma das fases de um processo
complexo, tal como a informação relativa ao processo como um todo, pode ser
por si só informação precisa.
20. A informação precisa não se confunde com informação completa, pelo
que mesmo antes de um processo negocial estar concluído existem diversos
factos precisos que podem ser informação privilegiada. A sua sujeição a um
regime de segredo pela entidade emitente é em regra um indicador da natureza
privilegiada da informação.
21. Como critérios norteadores da decisão sobre o carácter preciso da
informação podem identificar-se os seguintes:
Permitir a um investidor razoável a tomada de uma decisão com um risco
financeiro mais reduzido.
59
Informação com previsível impacto imediato no mercado, i.e., os
participantes no mercado passariam a negociar com base na informação
a partir do momento em que a mesma fosse tornada pública.
22. Qualquer avaliação a fazer reporta-se sempre ao momento em que se
tem acesso à informação privilegiada (um momento ex ante) e não a momentos
posteriores.
23. No que respeita a factos futuros, o critério distintivo consiste em saber
se no momento da avaliação é razoável a conclusão, com base na informação
disponível, de que os factos em questão ocorrerão.
D. Informação não pública
24. A informação só é privilegiada enquanto não tiver sido tornada pública. A
informação é pública quando está acessível à generalidade dos investidores.
25. Os termos e meios idóneos para divulgação de informação privilegiada
estão definidos n.º 4 e 5 do artigo 244.º do CdVM.
26. Caso a informação seja tornada pública sem que tenham sido cumpridas
as exigências legais, os emitentes continuam obrigados ao dever de divulgar
nos termos previstos no Código dos Valores Mobiliários e a omissão desse dever
constitui uma contra-ordenação muito grave (art. 394.º, n.º 1 al. h) do referido
diploma).
27. Neste caso, apesar de violado o dever de divulgação imediata pelo
emitente, já não se aplicam as proibições do n.º 4 do artigo 248.º do CdVM,
pois a informação já é pública.
28. Até ao momento da divulgação nos termos legalmente exigidos, os
emitentes devem guardar segredo sobre a existência e o conteúdo de
informação privilegiada, após o que a divulgação da referida informação pode
realizar-se através de outros meios de comunicação (artigo 6.º, n.º 2, do
Regulamento da CMVM n.º 4/2004).
29. Se, em contactos mantidos com a comunicação social, com investidores
ou com analistas, os responsáveis dos emitentes pretenderem emitir juízos ou
opiniões sobre as entidades que representam ou os valores mobiliários por elas
emitidos, devem ter o cuidado de, previamente, cumprir as suas obrigações de
informação, para que tais juízos ou opiniões assentem em dados sobre o
60
emitente ou sobre os valores mobiliários por si emitidos que sejam devidamente
conhecidos.
E. Informação idónea para influenciar o preço
30. Os emitentes que tenham informação privilegiada devem avaliar nesse
momento (ex ante) se essa informação pode ter um impacto sensível no preço
dos valores mobiliários emitidos pelos mesmos ou dos instrumentos subjacentes
ou derivados com estes relacionados, tomando por referência um investidor
razoável.
31. Devem ser tomados em consideração os seguintes critérios para avaliar
se um determinado acontecimento é idóneo a ter um impacto sensível nos
preços:
a magnitude esperada do facto ou assunto em questão no contexto da
actividade global do emitente;
a relevância da informação no que respeita aos principais factores
determinantes do preço do instrumento financeiro;
a fiabilidade da fonte da informação;
as variáveis de mercado que afectam o preço do instrumento financeiro
em questão. Estas variáveis podem incluir preços, retornos,
volatilidades, liquidez, relações de preço entre instrumentos financeiros,
quantidades, oferta, procura, etc..
32. Na aferição da idoneidade há ainda alguns indicadores práticos que, não
sendo absolutamente decisivos, devem ser tomados em consideração:
O tipo de informação é idêntico a informação que, no passado, teve um
impacto sensível nos preços;
A existência de relatórios de analistas e de opiniões indicando que o tipo
de informação em questão é idónea para influenciar o preço;
Ter o emitente tratado antes factos semelhantes como informação
privilegiada.
33. É ainda importante ter presente que o significado da informação varia
consoante a dimensão do emitente, desenvolvimentos recentes que se tenham
verificado, o sentimento do mercado face ao emitente e ao sector em que opera
e ainda consoante o tipo de instrumento que está em causa. Com efeito,
61
determinada informação poderá ser idónea para influenciar significativamente o
preço de uma acção e já não o preço de uma obrigação.
F. Alterações a informação anteriormente divulgada
34. Deve ser divulgada imediatamente qualquer alteração a informação
anteriormente divulgada em cumprimento do n.º 1 do artigo 248.º do CdVM,
seja por ocorrência de novos factos, seja por conhecimento superveniente de
factos anteriores.
35. O dever de divulgação de informação privilegiada implica que o emitente
divulgue também todas as correcções de inexactidões ou insuficiências de que a
informação privilegiada divulgada em momento anterior padeça.
36. Destaca-se, nesta sede, a correcção de previsões anteriormente
anunciadas, nomeadamente quanto aos resultados apurados ou internamente
redefinidos.
37. Nesta medida, se a informação financeira anual, semestral ou trimestral
revelar um desvio significativo em relação às previsões anteriormente
divulgadas pelo emitente, este está obrigado a difundir imediatamente um
comunicado sobre o desvio apurado.
38. No caso de esse desvio ser apurado na prestação anual de contas, tal
dever de informação poderá constituir-se ainda antes da aprovação formal das
contas pelo órgão de administração.
G. Exemplos de factos que podem constituir informação privilegiada
39. Não é possível enumerar de modo exaustivo os factos que constituem
informação privilegiada. Em qualquer caso, revela-se útil fazer uma descrição
exemplificativa de factos que, em regra, corresponderão a informação
privilegiada.
40. A inclusão de uma determinada situação na lista não significa a sua
automática qualificação como informação privilegiada. Em regra, é necessário
sujeitar a situação concreta às restantes exigências do conceito legal de
informação privilegiada.
41. Por outro lado, os factos que adiante se descrevem possuem por vezes
uma relevância distinta: alguns podem ser por si só considerados informação
62
privilegiada (por exemplo, a apresentação de um pedido de declaração de
insolvência), enquanto outros carecem de ser completados com elementos
adicionais (por exemplo, as encomendas de clientes).
42. Factos relacionados com a situação financeira ou com resultados:
Informação financeira periódica (note-se que a relevância da informação
não depende necessariamente da conclusão do processo societário
interno de aprovação, ou seja, a preparação de uma proposta de
documentos de prestação de contas pode configurar, desde logo,
informação privilegiada);
Emissão de obrigações;
Reestruturação ou reorganização que tenha efeitos nos activos, passivos,
situação financeira ou na rubrica dos proveitos e custos;
Apresentação de pedido de declaração de insolvência;
Disputas legais;
Revogação, cancelamento ou suspensão de linhas de crédito por um ou
mais bancos;
Alterações nos sistemas ou processos interno de reporte;
Dissolução ou verificação de causa de dissolução;
Alteração no valor dos activos;
Insolvência de devedores;
Redução do valor de activos imobiliários;
Destruição física de mercadorias não seguras;
Alteração no valor de instrumentos financeiros detidos em carteira;
Alteração do valor de patentes, direitos ou activos intangíveis devido à
inovação do mercado;
Responsabilidades incorridas por produtos vendidos ou por impactos
ambientais causados;
Alteração nos resultados esperados;
Mudança de auditor externo;
Política de dividendos.
63
43. Factos relacionados com estratégia e desenvolvimento do negócio:
Processos negociais;
Desempenho operacional;
Aquisição ou alienação de interesses accionistas ou de outros activos;
Celebração, alteração ou revogação de acordos de cooperação
estratégica;
Reorganizações internas;
Alterações da política de preços;
Novas licenças, patentes e registos de marcas;
Recepção de ofertas para a aquisição de activos;
Inovações em produtos ou processos;
Ordens recebidas de clientes, seu cancelamento ou alterações;
Retirada ou entrada em áreas de negócio;
Alterações na política de investimento.
44. Factos relacionados com estrutura de capital e controlo:
Alterações no controlo e acordos relativos ao controlo;
Alterações nos órgãos de administração e fiscalização;
Factos relacionados com o processo de eleição ou designação de titulares
de órgãos sociais;
Operações envolvendo o capital próprio;
Emissão de valores mobiliários que dêem o direito a adquirir ou
subscrever outros valores mobiliários;
Decisões de aumentar ou diminuir o capital social;
Fusões, cisões e spin-offs;
Decisões relativas a programas de buy-back ou transacções em outros
instrumentos financeiros admitidos à negociação em bolsa.
45. Factos relacionados com os valores mobiliários emitidos:
Modificação dos direitos de uma categoria de acções;
Stock-splits e reverse stock-split;
64
Anúncio relativo ao pagamento de dividendos, incluindo anúncio ou
alteração da data de dividendos.
III. Possibilidade de diferimento da divulgação de informação privilegiada
A. Regime legal da divulgação diferida
O artigo 248.º-A do CdVM permite o diferimento da divulgação imposta no
artigo anterior. A divulgação de informação privilegiada pode ser diferida
quando se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos (artigo 248.º-A,
n.º 1 do CdVM):
• A divulgação imediata da informação seja susceptível de prejudicar os
legítimos interesses do emitente;
• O diferimento não seja susceptível de induzir o público em erro; e
• O emitente demonstre que assegura a confidencialidade da informação.
Para assegurar a confidencialidade da informação cuja divulgação é diferida e
obstar à sua utilização indevida, o emitente adopta, pelo menos, as seguintes
medidas:
• Restringe o acesso à informação às pessoas que dela necessitem para o
exercício das suas funções;
• Garante que as pessoas com acesso a essa informação tenham
conhecimento da natureza privilegiada da informação, dos deveres e
proibições que decorrem desse conhecimento e das sanções a que podem
estar sujeitas pela divulgação ou utilização abusiva dessa informação;
• Adopta os mecanismos necessários à divulgação pública imediata da
informação quando haja quebra de confidencialidade.
Caso o emitente ou pessoa que actue em seu nome ou por sua conta
comuniquem, no âmbito do exercício normal da sua actividade, da sua profissão
ou das suas funções, informação privilegiada a um terceiro que não esteja
sujeito a dever de segredo, tal informação deverá ser tornada pública
simultaneamente, se a comunicação for intencional, ou imediatamente, se a
comunicação for não intencional (artigo 248.º-A, n.º 5 do CdVM).
Nos termos do n.º 2 do artigo 248.º-A do CdVM, é susceptível de prejudicar os
legítimos interesses do emitente a divulgação de informação privilegiada
nomeadamente nas seguintes situações:
65
• Decisões tomadas ou contratos celebrados pelo órgão de direcção de um
emitente, cuja eficácia dependa da aprovação de outro órgão do emitente,
desde que a sua divulgação antes da aprovação, mesmo acompanhada do
anúncio da pendência de aprovação, comprometa a correcta apreensão da
informação pelo público;
• Processos negociais em curso ou elementos com eles relacionados, desde
que a respectiva divulgação pública possa afectar os resultados ou o curso
normal dessas negociações.
B. Entendimentos da CMVM sobre a divulgação diferida
46. Os casos referidos no n.º 2 do artigo 248.º-A do CdVM são apenas
exemplos de situações em que há legitimidade para o emitente diferir a
divulgação da informação privilegiada. Os emitentes poderão diferir a
divulgação de informação noutras circunstâncias desde que sejam respeitadas
as condições previstas no artigo 248.º-A do CdVM.
47. Relativamente ao primeiro exemplo (decisões tomadas que requerem a
aprovação de outro órgão), entende-se que o mesmo abrange não só as
situações em que há processos de decisão complexos envolvendo vários órgãos,
como também vários níveis hierárquicos na organização dos emitentes se tal for
aplicável ao caso concreto.
48. No que respeita ao segundo exemplo (negociações em curso), entende-se
que o mesmo abrange as seguintes situações:
Exigências de confidencialidade relacionadas com uma situação de
concorrência (i.e. casos de negociações não concluídas em que a
divulgação da informação relativa às mesma coloque em risco a
celebração do contrato ou constitua risco de que o mesmo seja celebrado
com uma terceira entidade). A legitimidade desta situação de
deferimento da informação fica condicionada ao facto de o acordo de
confidencialidade entre o emitente e terceiro não impedir aquele de
cumprir as suas obrigações de divulgação;
Desenvolvimento de produtos, patentes, invenções, etc. em situações
em que o emitente precise de proteger os seus direitos, desde que
eventos significativos que afectem o desenvolvimento de produtos
importantes (por exemplo, os resultados de testes clínicos no caso de
66
novos produtos farmacêuticos) sejam divulgados tão cedo quanto
possível;
Quando o emitente decida vender uma participação importante noutro
emitente e o negócio possa falhar com a divulgação precoce da
informação;
Desenvolvimentos pendentes cuja divulgação possa colocar em causa a
sua conclusão.
49. Para poder ser diferida a divulgação de informação privilegiada não basta
estar em presença de um interesse legítimo do emitente. É necessário que se
verifiquem cumulativamente os outros dois critérios: o diferimento não seja
susceptível de induzir o público em erro; e o emitente demonstre que assegura
a confidencialidade da informação.
50. A decisão de diferimento da divulgação de informação privilegiada não
impede que a mesma seja comunicada pelo emitente à CMVM. Aliás, é
recomendável que tal aconteça, de forma a que a CMVM possa actuar de forma
célere em face de qualquer quebra de sigilo, minimizando os riscos daí
advenientes para o mercado e para a própria entidade emitente . Sugere-se
ainda que, logo no momento da decisão, o emitente registe as razões do
diferimento. Este cuidado será vantajoso para o emitente caso a CMVM requeira
que esta informação lhe seja fornecida.
51. Compete ainda ao emitente, além dos deveres previstos no n.º 4 do
artigo 248.º-A, avaliar continuamente a legalidade do diferimento da
divulgação, à luz dos 3 critérios legais.
IV. Regras de conduta
Perante factos que constituam informação privilegiada, o comportamento desejável
a adoptar pelos emitentes de valores mobiliários admitidos à negociação em
mercado regulamentado deve pautar-se pelas seguintes indicações:
A. Que condutas devem as sociedades cotadas adoptar?
Em caso de dúvida: divulgar;
Divulgar boas e más notícias o mais depressa possível;
Os comunicados divulgados devem ter um título que reflicta, de modo
claro e conciso, o seu conteúdo;
67
A informação deve ser completa mas cingir-se aos elementos relevantes,
não devendo ser acompanhada de dados ou aspectos menores que lhe
retirem a necessária clareza ou concisão;
A informação divulgada deve basear-se em dados objectivos;
O conteúdo dos comunicados deve ser claro e facilmente apreensível por
parte dos destinatários: uma informação completa mas susceptível de
criar dúvidas sobre o real alcance do facto comunicado pode potenciar
situações de especulação sobre a própria informação divulgada;
A informação divulgada deve permitir aos investidores tirar as suas
próprias conclusões;
As previsões ou expectativas apresentadas devem ser sempre
acompanhadas de informação clara e completa;
Divulgar todos os desvios das expectativas previamente divulgadas ou
alteração nos objectivos;
Usar termos reconhecidos e comummente utilizados pelos investidores;
Clarificar e/ou explicar os termos, indicadores e outros conceitos
utilizados;
Ponderar a hipótese de divulgar imediatamente um comunicado quando
a sua passividade perante um rumor que lhe diga directamente respeito
permitir a persistência de equívocos no mercado.
Divulgar imediatamente um comunicado quando um representante do
emitente (membro de órgão social ou outro) seja erroneamente citado
na imprensa relativamente a informação privilegiada;
Quando a informação pressuponha maiores ou posteriores averiguações
e/ou aprofundamentos, a informação disponível deve ser divulgada
imediatamente e os detalhes posteriores devem ser divulgados à medida
que venham a ser apurados;
Divulgar toda e qualquer informação privilegiada antes de ser
apresentada em entrevista ou conferência;
Divulgar imediatamente um comunicado quando seja divulgada
informação privilegiada durante uma entrevista ou apresentação, ainda
que tal ocorra de forma não intencional;
68
Divulgar os comunicados de informação privilegiada, preferencialmente,
antes do início da sessão de bolsa ou após o fecho, mantendo segredo
até à disseminação pública (não esquecendo, porém, a obrigação de
divulgação em tempo útil);
Tratar todos os investidores de forma equitativa: os investidores não
qualificados são tão importantes como os analistas ou os investidores
qualificados;
Quando beneficie de uma dispensa de divulgação da informação
privilegiada, o emitente deve assegurar a confidencialidade dos factos
em questão;
O representante do emitente para as relações com o mercado deve estar
permanentemente disponível para prestar os esclarecimentos adicionais
solicitados pela CMVM;
Quando num comunicado seja feita referência a informação privilegiada
anteriormente divulgada o teor desta deve ser repetido.
B. O que devem as sociedades cotadas evitar?
Prestar declarações públicas ou revelar informação que possa vir a ser
tornada pública durante o período de diferimento da divulgação da
informação ou da formação dos factos em causa, sobre qualquer questão
conexa, directa ou indirectamente, com a informação privilegiada;
Divulgar informação baseada em juízos subjectivos ou considerações
conclusivas;
Difundir expectativas;
Divulgar notícias com informação privilegiada durante apresentações,
entrevistas, etc.;
Referir, sem fundamento, notícias em meios de comunicação nas quais
se possa encontrar informação privilegiada adicional;
Referir informação relevante constante de comunicados precedentes sem
a actualizar devidamente;
Incorporar informação privilegiada em prospectos sem a divulgar, antes,
devidamente;
Divulgar apenas partes de informação privilegiada;
69
Adiar a divulgação de informação a fim de proteger a imagem do
emitente ou de algum dos seus administradores/colaboradores;
Divulgar informação privilegiada apenas às autoridades de supervisão;
Esconder, diluir ou dissimular más notícias no corpo da informação;
Divulgar efeitos ou possíveis soluções escondendo as razões ou causas;
Retardar a divulgação de informação privilegiada em função de outros
deveres legais de divulgar informação obrigatória.
Adiar a divulgação de más notícias até ao momento em que as mesmas
se encontrarem solucionadas, a menos que tal se revele um caso de
diferimento legítimo face à lei;
Adiar a divulgação de informação privilegiada por ainda não ser possível
prestar esclarecimentos integrais e definitivos sobre determinado
assunto;
Dar prioridade ou prevalência aos seus accionistas em detrimento dos
investidores em geral;
Divulgar informação dificilmente perceptível;
Incluir nos comunicados referências a outros locais onde se possa
consultar informação privilegiada adicional;
Assumir que os investidores não querem ser receber informação em
excesso.
Permitir o acesso a informação privilegiada por parte de potenciais
contrapartes negociais: os processos de due dilligence não justificam o
acesso por terceiros a informação privilegiada; assim que se apure a
existência de informação privilegiada, e não haja lugar ao diferimento da
sua divulgação, esta deve ser imediatamente divulgada.
C. Que condutas devem adoptar as terceiras entidades?
É aconselhável que as entidades – tais como (vd supra nº 7), organismos
públicos que produzem informações estatísticas, sociedades de notação de
risco, o Governo, a autoridade responsável pelo controlo da concorrência nos
mercados relevantes em que se insira o emitente e outros organismos públicos
- que produzam ou divulguem informação sobre factos indirectamente
relacionados com o emitente ou com os instrumentos financeiros por ele
emitidos (vd supra n.º 8) adoptem as seguintes condutas:
70
Restringir o conhecimento dessa informação até à sua divulgação
pública;
Anunciar previamente os calendários de divulgação desse tipo de
informação;
Divulgar publicamente essa informação após o encerramento dos
mercados; e
Divulgar essa informação simultaneamente a todo o público, sem
prejuízo das comunicações sujeitas a sigilo que tenham de ser feitas às
pessoas ou entidades relacionadas com os factos.
71
ENTENDIMENTOS DA CMVM SOBRE
COMUNICAÇÃO DE OPERAÇÕES
SUSPEITAS E DEFESA DO MERCADO
DEVERES DOS INTERMEDIÁRIOS FINANCEIROS
E DAS SOCIEDADES GESTORAS DE MERCADOS
OU DE SISTEMAS, SINAIS DE OPERAÇÕES SUSPEITAS,
COMUNICAÇÃO À CMVM, DEFESA DO MERCADO
E PROCEDIMENTOS INTERNOS DE ORGANIZAÇÃO.
CMVM
2008
72
SUMÁRIO
Introdução 73
1. Quem está obrigado a comunicar operações suspeitas? 74
2. Operações abrangidas 75
3. Sinais de alerta 76
4. A quem se comunicam as operações suspeitas? 78
5. Modo e conteúdo da informação (formulário) 79
6. Dever de segredo 80
7. Comunicação de operações e dever de abstenção 81
8. Procedimentos internos de organização 82
Anexo: formulário para comunicação de operações suspeitas 84
73
Introdução
Após a transposição das directivas do abuso de mercado, o Código dos Valores
Mobiliários passou a impor aos intermediários financeiros (art. 382.º, n.º 2) o
dever de comunicar imediatamente à CMVM os factos que possam vir a ser
qualificados como crime contra o mercado de valores mobiliários ou outros
instrumentos financeiros (designadamente, abuso de informação privilegiada e
manipulação de mercado).
Por outro lado, já antes da transposição das directivas do abuso do mercado, os
intermediários financeiros e os demais membros de mercado deviam abster-se
de participar em operações ou de praticar outros actos susceptíveis de pôr em
risco a regularidade de funcionamento, a transparência e a credibilidade do
mercado (art. 311.º, n.º 1, do Código dos Valores Mobiliários - CdVM). Mas com
a transposição das citadas directivas passaram a ter o dever de analisar com
especial cuidado e diligência as ordens e as operações que possam violar o
dever de defesa do mercado (art. 311.º, n.º 3, do CdVM).
Recentemente, outras entidades passaram a estar igualmente sujeitas a estes
deveres de defesa do mercado e de comunicação de operações suspeitas. O
Decreto-Lei n.º 357-C/2007, de 31 de Outubro - que regula o regime jurídico
das sociedades gestoras de mercado regulamentado, das sociedades gestoras
de sistemas de negociação multilateral, das sociedades gestoras de câmaras de
compensação ou que actuem como contraparte central, das sociedades gestoras
de sistema de liquidação e das sociedades gestoras de sistema centralizado de
valores mobiliários, doravante designadas como sociedades gestoras de
mercados ou sistemas - sujeita todas estas entidades aos deveres de defesa do
mercado e de comunicação de operações suspeitas à CMVM (cfr. arts 35.º. 42.º,
3 e 46.º, n.º 1 do diploma citado).
Os deveres de comunicar operações suspeitas e de defesa do mercado são
deveres profissionais com tutela sancionatória pública (cfr. nomeadamente arts
379.º, n.º 3, 398.º, al. e) e 400.º do CdVM) pois visam proteger a integridade
do mercado, enquanto bem público insusceptível de ser objecto de apropriação
individual, nomeadamente através de condutas abusivas. Além disso, os
deveres em causa correspondem a formas específicas de colaboração com a
autoridade de supervisão que constituem emanações de regras gerais vigentes
na matéria, também em nome dos interesses públicos legalmente protegidos
74
(v.g. art. 359.º, n.º 3 do CdVM e art. 35.º, n.º 3 do Dec.-Lei n.º 357-C/2007,
de 31 de Outubro).
No presente documento, a CMVM procura esclarecer os destinatários destes
deveres de comunicação de operações suspeitas sobre aspectos concretos
relacionados como o âmbito de aplicação dos deveres, os sinais a que os
agentes do mercado devem dar atenção, o conteúdo e a forma da comunicação,
o regime de segredo e a forma com o dever de comunicar operações suspeitas
se relaciona com a abstenção decorrentes dos deveres de defesa do mercado.
1. Quem está obrigado a comunicar operações suspeitas?
Estão obrigados a cumprir este dever junto da CMVM os intermediários
financeiros e as sociedades gestoras de mercado ou de sistemas que exercem
actividades em Portugal.
O dever legal vincula as entidades descritas e é cumprido quando a
comunicação da operação suspeita é feita em seu nome. Para o efeito deve ser
utilizado o formulário em anexo a este documento.
Podem proceder à comunicação, por exemplo, membros do conselho de
administração, elementos do compliance office, pessoas com cargos de direcção
ou acompanhamento de uma área de actividade em que os factos ocorram ou
funcionários em geral e, entre estes, os funcionários que realizam operações (a
título de ilustração, consultores, traders e gestores de carteiras) ou fiscalizam a
realização de operações.
O intermediário financeiro e as sociedades gestoras de mercados ou sistemas
devem organizar-se de forma a clarificar os procedimentos internos que
orientam a identificação, análise e comunicação de operações suspeitas.
Se alguém pretender comunicar uma operação suspeita a título individual deve
usar o formulário que se destina ao público em geral. Em tal caso, não se
considera que a comunicação é feita em cumprimento do dever legal do
intermediário financeiro ou da sociedade gestora de mercados ou de sistemas.
A pessoa singular que comunica a operação suspeita será, em princípio, o ponto
de contacto da CMVM para aquela comunicação.
75
Do regime anterior resultava já idêntico dever - que se mantém - para as
autoridades judiciárias, entidades policiais e funcionários.
2. Operações abrangidas
Os intermediários financeiros e as sociedades gestoras de mercados e de
sistemas devem comunicar os factos que possam indiciar suspeitas de crime de
abuso de informação ou de manipulação de mercado. Não se trata de denunciar
crimes, mas sim de comunicar factos suspeitos que devem ser analisados à luz
dos tipos incriminadores. Se tais factos poderão ou não ser qualificados como
crimes é algo que dependerá de uma avaliação posterior à luz de outros
elementos relevantes para a lei portuguesa.
A decisão de comunicar os factos é tomada pelo intermediário financeiro ou pela
sociedade gestora de mercados ou de sistemas, caso a caso, se estes
apresentarem características ou indícios que justifiquem uma suspeita de
manipulação de mercado ou de abuso de informação. Não é necessária a
certeza sobre a natureza ilícita do facto, bastando uma suspeita fundada. Não
têm de ser factos próprios, podendo ser operações de terceiros desde que
exista fundamento para as considerar suspeitas.
A comunicação de operações suspeitas deve ser imediata e ocorrer assim que
exista uma suspeita razoável de práticas abusivas, não se devendo aguardar a
compilação de toda a informação necessária, podendo a mesma ser
complementada posteriormente.
A comunicação automática e indiferenciada de todas as operações realizadas
através do intermediário financeiro não constitui o cumprimento do dever de
comunicação previsto no artigo 382.º do CdVM.
A comunicação deverá ser razoável e fundada, apresentando as razões da
suspeita (veja-se o formulário em anexo), sem prejuízo da possibilidade de
contacto telefónico prévio ao regulador em caso de urgência (art. 382.º, n.º 3 e
4, do CdVM) ou de envio preliminar do formulário incompletamente preenchido,
desde que seja patente a razão do envio da suspeita. O formulário
completamente preenchido deve ser enviado logo que possível.
A identificação de operações suspeitas pode decorrer de análises de operações
específicas e isoladas e de análises de conjuntos de operações realizadas em
determinadas janelas temporais. Em determinadas situações ordens ou
operações consideradas isoladamente podem não levantar qualquer suspeita
76
razoável, mas quando consideradas em conjunto com outras podem indiciar
práticas de abuso de mercado por denotarem um comportamento suspeito em
virtude, nomeadamente, da divulgação de informação ao mercado.
3. Sinais de alerta
Apresentam-se seguidamente um conjunto de sinais, quer para o abuso de
informação, quer para a manipulação de mercado, que devem desencadear a
análise legalmente exigida, por forma a decidir se a situação em causa
apresenta suspeitas de crime contra o mercado que justifique a respectiva
comunicação à CMVM.
O elenco de sinais não é nem exaustivo, nem determinante da existência de
crime contra o mercado, constituindo apenas um ponto de partida para a
análise a levar a efeito pelo intermediário financeiro.
Abuso de informação e manipulação de mercado
Concentração anormalmente elevada de operações num determinado
instrumento financeiro (estando, por exemplo, envolvidos um ou mais
investidores qualificados com ligações ao emitente ou alguém com um
particular interesse no emitente);
Repetição não usual de operações entre um pequeno número de clientes
durante um certo período de tempo;
Concentração anormalmente elevada de operações e/ou ordens num só
cliente ou em diferentes contas de instrumentos financeiros do mesmo
cliente ou num número limitado de clientes (especialmente se estes
estiverem relacionados uns com os outros).
Abuso de informação
O cliente abre conta e dá imediatamente ordem para execução de uma
operação significativa ou, no caso de um cliente não qualificado, dá
inesperadamente uma ordem para operação de uma grande quantidade de
um determinado instrumento financeiro, especialmente no caso de
insistência do cliente no sentido de que a ordem é muito urgente e deve ser
executada antes de um momento por ele especificado;
77
O comportamento do cliente ao nível das decisões de investimento é
incoerente com o comportamento anteriormente manifestado e com o seu
perfil (ex: tipo de instrumento financeiro em que investe, quantidade
investida, tempo de manutenção de participação adquirida);
O cliente solicita especificamente a imediata execução da ordem
independentemente do preço a que possa ser executada;
Operações significativas por parte de accionistas com participações
qualificadas e outros insiders do emitente antes do anúncio de informação
privilegiada;
Manipulação de mercado
Ordens ou operações sem outra justificação aparente que não seja a de
fazer subir ou descer o preço do instrumento financeiro ou de aumentar a
quantidade, particularmente no caso de a operação ser executada perto do
momento em que se forma o preço de referência;
Ordens que, em virtude da quantidade sobre que incidem em comparação
com o mercado para o instrumento financeiro em causa, terão um impacto
significativo sobre a oferta, a procura ou o preço daquele instrumento
financeiro, particularmente no caso de as ordens serem dadas perto de um
momento de formação de preço de referência;
Ordens ou operações que aparentem ter como objectivo fazer subir o preço
de um instrumento financeiro nos dias que antecedem a emissão de um
derivado com ele relacionado;
Ordens ou operações que aparentem ter como objectivo manter o preço de
um instrumento financeiro nos dias que antecedem a emissão de um
derivado com ele relacionado, quando a tendência do mercado seja de
descida;
Ordens ou operações que aparentem ter como objectivo manter o preço do
activo subjacente abaixo do preço de exercício de instrumento derivado
relacionado, na data da maturidade do instrumento derivado;
Ordens ou operações que aparentem ter como objectivo modificar o preço
do activo subjacente por força a que ultrapasse o preço de exercício de
instrumento derivado relacionado, na data da maturidade do instrumento
derivado;
78
Ordens ou operações que aparentem ter como objectivo modificar o preço
de liquidação de um instrumento financeiro derivado, quando este preço é
usado no cálculo das margens;
Ordens ou operações que aparentem ter como objectivo a modificação do
valor de uma posição, sem aumento nem diminuição da mesma;
Ordens ou operações que aparentem ter como objectivo fazer subir/descer o
preço médio ponderado da sessão ou de um determinado período da sessão;
Ordens ou operações que aparentem ter como objectivo fixar um preço de
mercado, quando a liquidez do instrumento financeiro ou a profundidade do
livro de ofertas não é suficiente para permitir a formação de um preço
durante a sessão (a menos que as regras de mercado ou as práticas de
mercado aceites e declaradas como tal pela autoridade de supervisão
permitam essas operações);
Operações que ultrapassem sistematicamente os limites de variação de
preços definidos;
Operações que modificam o spread bid-ask do livro de ofertas, quando esse
spread é factor determinante do preço das operações;
Ordens significativas dadas momentos antes do leilão de abertura/fecho e
cancelamento das mesmas alguns segundos antes de o livro de ofertas ser
fechado para a realização do leilão, de forma a que o preço de
abertura/fecho seja mais alto ou mais baixo do que seria sem a inserção e
retirada dessas ofertas, desde que este cancelamento não seja
motivado/justificado por divulgação de informação ao mercado.
4. A quem se comunicam as operações suspeitas?
A comunicação de operações suspeitas é dirigida à autoridade de supervisão.
Pode acontecer que a autoridade de supervisão competente para supervisionar
o mercado onde estão admitidos à negociação os instrumentos que são objecto
das transacções suspeitas não seja a do país onde o intermediário financeiro
tem a sua sede. Por isso, houve necessidade de esclarecer qual a autoridade de
supervisão destinatária da comunicação.
A solução comunitária adoptada (e reflectida no n.º 2 do artigo 382.º do CdVM)
é a de que o intermediário financeiro comunica as operações suspeitas à
79
autoridade de supervisão do país onde tem a sua sede ou onde a sua sucursal
está estabelecida, independentemente do mercado ou sistema onde os valores
estejam admitidos à negociação ou do local de onde as ordens foram dadas.
É à autoridade que recebe a comunicação que cabe depois reencaminhá-la para
a autoridade que seja a competente para a instrução do processo, em função do
mercado ou da origem das ordens.
Assim, só estão obrigados a comunicar à CMVM operações suspeitas os
intermediários financeiros e sociedade gestoras de mercados ou de sistemas
com sede estatutária, administração central ou sucursal em Portugal (artigo
382.º, n.º 2, do CdVM).
5. Modo e conteúdo da comunicação (formulário)
A comunicação poderá ser feita telefonicamente ou por qualquer outro meio
idóneo para o efeito, devendo todavia ser confirmada por escrito, a pedido da
CMVM, quando este não seja o meio adoptado inicialmente (artigo 382.º, n.º 3,
do CdVM).
Da comunicação deverão constar (art. 382.º, n.º 4, do CdVM) os seguintes
elementos, inseridos no formulário em anexo:
Descrição das operações: identificação das operações (data/hora, preço
e quantidade); ordens dadas, com expressa identificação do tipo de
ordem, momento em que é dada, momento da sua recepção, preços,
quantidades e condições de execução; identificação da estrutura de
realização da operação e modalidade de negociação.
Identificação dos comitentes: comitentes a quem a operação é imputada,
sua identificação (com indicação do nome, NIF ou código de cliente
usado internamente, podendo ainda ser indicada adicionalmente morada,
telefones, data de nascimento ou profissão); identificação das carteiras
envolvidas, códigos internos das mesmas, identificação das contas que
liquidam as operações; confirmação sobre se o comitente é ou não o
beneficiário económico da operação.
Identificação de terceiros: identificação de outras pessoas envolvidas na
operação (com indicação do nome, NIF ou código de cliente usado
internamente, podendo ainda ser indicada adicionalmente morada,
telefones, data de nascimento ou profissão) a que título intervém,
relação com os comitentes das operações. Identificação do beneficiário
80
económico da operação se for diferente do comitente. Contas de valores
e de títulos envolvidas.
Razões da suspeita: motivos que levam a suspeitar da operação;
distinção entre factos concretos e meras suspeitas.
Outra informação relevante: identificação de qualquer outro elemento
relevante não incluído nas descrições anteriores.
Qualidade da intervenção do intermediário financeiro na operação em
causa.
Identificação da pessoa que efectua a comunicação.
6. Dever de segredo
A comunicação realizada fica sujeita a segredo. Os intermediários financeiros e
as sociedades gestoras de mercados e de sistemas, bem como os seus
colaboradores, estão obrigados a segredo quanto à comunicação de operações
suspeitas, bem como quanto a qualquer informação relacionada com a mesma.
Este dever de segredo não obsta a que a pessoa que realiza a comunicação
transmita a informação a outros colaboradores da mesma entidade,
designadamente aos seus superiores hierárquicos, a pessoas responsáveis por
áreas de supervisão ou de controlo do cumprimento ou a outros membros do
órgão de administração, cujo contributo possa ser relevante para essa decisão.
Todos os que tenham conhecimento da comunicação da operação ficam sujeitos
ao dever de segredo sobre tal facto.
A lei impõe também a confidencialidade da identidade da pessoa que subscreve
a denúncia e da entidade para quem trabalha. Este regime de segredo só pode
ser quebrado por determinação judicial, nos termos previstos no Código de
Processo Penal, e o cumprimento de tal dever não dá origem a responsabilidade
(nos termos e condições dos n.ºs 5 e 6 do art. 382.º).
81
7. Comunicação de operações e dever de abstenção
Os intermediários financeiros e as sociedades gestoras de mercados e de
sistemas têm um dever de defesa de mercado que implica que se abstenham de
participar em operações ou de praticar actos susceptíveis de pôr em risco a
regularidade do funcionamento, a transparência e a credibilidade do mercado
(artigo 311.º, n.º 1 do CdVM e art. 35.º do Dec.-Lei n.º 357-C/2007, de 31 de
Outubro).
Para cumprimento deste dever é, ainda, imposto um especial dever de análise
de ordens e operações, cujas características se possam reconduzir,
designadamente a uma das situações descritas no n.º 3 do artigo 311.º. Estas
situações não representam por si só comportamentos manipuladores,
constituindo apenas um conjunto de indícios que justifica uma análise reforçada
das ordens, das ofertas ou das operações em causa.
No caso de, após a análise, o intermediário financeiro concluir que as ordens ou
operações são susceptíveis de pôr em risco a regularidade de funcionamento, a
transparência ou a credibilidade do mercado, deve abster-se de praticar
quaisquer actos que possibilitem a sua concretização.
O elenco do n.º 3 do artigo 311.º do CdVM é, assim dirigido ao cumprimento do
disposto do n.º 1 do mesmo artigo.
Pode, todavia, esta análise coincidir – por ter como objecto os mesmos factos –
com a que deverá ser realizada para efeito de comunicação à CMVM de
operações suspeitas, nos termos do artigo 382.º do CdVM.
Neste caso, concluindo o intermediário financeiro que as suspeitas são
fundamentadas, deverá adoptar um de dois comportamentos:
A operação ainda não se concretizou e para a concretizar é essencial
a intervenção do intermediário financeiro. Nesta circunstância o
intermediário financeiro deve abster-se de realizar a operação, nos termos
do n.º 1 do artigo 311.º, sob pena de violação do dever de defesa do
mercado e de o facto poder ter relevância criminal.
A operação já se concretizou, tendo sido os indícios detectados a
posteriori. Neste caso o intermediário financeiro deve comunicar
imediatamente os factos à CMVM, nos termos do disposto no artigo 382.º,
n.ºs 2 a 6 do CdVM.
82
O cumprimento dos deveres de abstenção e de comunicação de operações
suspeitas pode justificar a não execução das ordens do cliente, fundamentando
desse modo um caso de incumprimento lícito da execução da operação.
A comunicação de operações suspeita que não seja efectuada de má fé traduz-
se no cumprimento de um dever legal e, por isso, não pode fundamentar uma
pretensão indemnizatória por eventuais danos sofridos por terceiros
8. Procedimentos internos de organização
Os intermediários financeiros e as sociedades gestoras de mercados e sistemas
devem definir políticas e procedimentos de detecção e comunicação de
operações suspeitas de práticas abusivas ou de detecção de actos susceptíveis
de pôr em risco a regularidade do funcionamento, a transparência e a
credibilidade do mercado.
Além da definição de procedimentos deverão ainda sensibilizar os seus
colaboradores para a importância e cumprimento dessas políticas e
procedimentos.
O dever de detecção de ordens ou operações que possam configurar práticas de
abuso de mercado ou de actos susceptíveis de pôr em risco a regularidade do
funcionamento, a transparência e a credibilidade do mercado deverá estar
cometido não só aos colaboradores directamente envolvidos na área de
recepção e execução de ordens, mas também ao compliance officer nos termos
previstos na lei.
Os intermediários financeiros e as sociedades gestoras de mercados ou sistemas
devem instituir procedimentos internos que permitam:
A) Formar e treinar os seus colaboradores para que estes sejam capazes
de reconhecer actos susceptíveis de pôr em risco a regularidade do
funcionamento, a transparência e a credibilidade do mercado ou
sinais que razoavelmente indiciem práticas abusivas, nomeadamente,
sinais de abuso de informação privilegiada ou de manipulação de
mercado constantes elenco descrito no ponto 4 deste documento e
nas tipologias descritas no documento Manipulação do Mercado,
CMVM, 2008 (disponível em www.cmvm.pt);
B) Assegurar que os seus colaboradores sabem o que fazer quando
detectam sinais que razoavelmente indiciem práticas abusivas ou
83
actos susceptíveis de pôr em risco a regularidade do funcionamento,
a transparência e a credibilidade do mercado;
C) Assegurar que os seus colaboradores sabem o que, a quem e como
comunicar os sinais detectados;
D) Assegurar que as suas políticas e procedimentos internos obrigam os
seus colaboradores a cumprir as suas obrigações de detecção e
comunicação de sinais que razoavelmente indiciem práticas abusivas
e os obriguem a abster-se de praticar ou participar em actos
susceptíveis de pôr em risco a regularidade do funcionamento, a
transparência e a credibilidade do mercado;
E) Assegurar a fiscalização, nomeadamente, através do compliance
officer, e auditoria do cumprimento dos deveres de actuação e
conduta dos seus colaboradores, quer na detecção e comunicação de
sinais que razoavelmente indiciem práticas de abuso de mercado,
quer na abstenção de prática de actos susceptíveis de pôr em risco a
regularidade do funcionamento, a transparência e a credibilidade do
mercado;
F) Assegurar que os sistemas informáticos utilizados adoptam filtros,
sinais de alerta e outros mecanismos visando detectar práticas de
abuso de mercado e actos susceptíveis de pôr em risco a
regularidade do funcionamento, a transparência e a credibilidade do
mercado. Os parâmetros definidos deverão ser reavaliados
periodicamente;
G) Adoptar procedimentos sistematizados de análise a priori e a
posteriori de amostras representativas de ordens recebidas e de
operações realizadas.
84
FORMULÁRIO PARA COMUNICAÇÃO DE OPERAÇÕES SUSPEITAS
1. Descrição da operação: Identificação das operações (data, hora, preço e quantidade); ordens dadas, com expressa identificação do tipo de ordem, momento da sua recepção, preços quantidades e condições de execução; identificação da estrutura de realização da operação, modalidade de negociação.
2. Identificação dos comitentes: Comitentes a quem a operação é imputada, sua identificação (com indicação do nome, NIF ou código de cliente usado internamente, podendo ainda ser indicada adicionalmente morada, telefones, data de nascimento ou profissão); identificação das carteiras envolvidas, códigos internos das mesmas, identificação das contas que liquidam as operações; confirmação sobre se o comitente é ou não o beneficiário económico da operação.
3. Identificação de terceiros: Identificação de outras pessoas envolvidas na operação (com indicação do nome, NIF ou código de cliente usado internamente, podendo ainda ser indicada adicionalmente morada, telefones, data de nascimento ou profissão), a que título intervêm, relação com os comitentes das operações. Identificação do beneficiário económico da operação se for diferente do comitente. Contas de valores e de títulos envolvidas.
4. Razões da suspeita: Motivos que levam a suspeitar da operação; distinção entre factos concretos e meras suspeitas.
85
5. Outra informação relevante: Identificação de qualquer outro elemento relevante não incluído nas descrições anteriores.
6. Qualidade da intervenção do intermediário financeiro na operação em
causa.
7. Identificação pessoa que efectua a comunicação:
Nome:
Intermediário Financeiro/Sociedade gestora:
Cargo no Intermediário Financeiro/Sociedade gestora:
Telefone:
E-mail:
86
87
GUIA RÁPIDO
PARA
COMUNICAÇÃO
DE OPERAÇÕES SUSPEITAS
CMVM
2008
88
SUMÁRIO
Introdução 89
1. Quem está obrigado a comunicar operações suspeitas? 89
2. Operações abrangidas 90
3. Sinais de alerta 91
4. A quem se comunicam as operações suspeitas? 93
5. Modo e conteúdo da informação (formulário) 93
6. Dever de segredo 94
7. Comunicação de operações e dever de abstenção 94
Anexo: formulário para comunicação de operações suspeitas 96
89
Introdução
Os deveres de comunicar operações suspeitas e de defesa do mercado são
deveres profissionais previstos na lei.
No presente documento, a CMVM procura, de forma clara e sucinta, esclarecer
os destinatários destes deveres de comunicação de operações suspeitas sobre a
melhor forma de cumprir o disposto na lei.
Desenvolvimentos sobre este tema encontram-se no documento Comunicação
de Operações Suspeitas e Defesa do Mercado, CMVM, 2008.
1. Quem está obrigado a comunicar operações suspeitas?
Estão obrigados a cumprir este dever junto da CMVM os intermediários
financeiros e as sociedades gestoras de mercado ou de sistemas que exercem
actividades em Portugal.
O dever é cumprido quando a comunicação da operação suspeita é feita em
nome do intermediário financeiro ou da sociedade gestora de mercados ou de
sistemas. Para o efeito deve ser utilizado o formulário em anexo a este
documento.
Podem proceder à comunicação, por exemplo, membros do conselho de
administração, elementos do compliance office, pessoas com cargos de direcção
ou acompanhamento de uma área de actividade em que os factos ocorram ou
funcionários em geral e, entre estes, os funcionários que realizam operações (a
título de ilustração, consultores, traders e gestores de carteiras) ou que
fiscalizem a realização de operações.
Se alguém pretender comunicar uma operação suspeita a título individual (e
não em nome da entidade a que está ligado) deve usar o formulário que se
destina ao público em geral. Em tal caso, não se considera que a comunicação é
feita em cumprimento do dever legal do intermediário financeiro ou da
sociedade gestora de mercados ou de sistemas.
A pessoa singular que comunica a operação suspeita será, em princípio, o ponto
de contacto da CMVM para aquela comunicação.
Do regime anterior resultava já idêntico dever - que se mantém - para as
autoridades judiciárias, entidades policiais e funcionários.
90
2. Operações abrangidas
A decisão de comunicar os factos é tomada caso a caso, se as ordens ou
operações apresentarem características ou indícios que justifiquem uma
suspeita de manipulação de mercado ou de abuso de informação.
Não é necessária a certeza sobre a natureza ilícita do facto, bastando uma
suspeita fundada.
Não têm de ser factos próprios, podendo ser operações de terceiros desde que
exista fundamento para as considerar suspeitas.
A comunicação de operações suspeitas deve ser imediata e ocorrer assim que
exista uma suspeita razoável de práticas abusivas.
Não se deve aguardar a compilação de toda a informação necessária, podendo a
mesma ser complementada posteriormente.
A comunicação automática e indiferenciada de todas as operações realizadas
através do intermediário financeiro não constitui o cumprimento do dever.
A comunicação deverá ser razoável e fundada, apresentando as razões da
suspeita (veja-se o formulário em anexo).
Pode ser feito um contacto telefónico prévio ao regulador em caso de urgência
ou de envio preliminar do formulário incompletamente preenchido, desde que
seja patente a razão do envio da suspeita.
O formulário completamente preenchido deve ser enviado logo que possível.
A identificação de operações suspeitas pode decorrer de análises de operações
específicas e isoladas e de análises de conjuntos de operações realizadas em
determinadas janelas temporais.
Em determinadas situações ordens ou operações consideradas isoladamente
podem não levantar qualquer suspeita razoável, mas quando consideradas em
conjunto com outras podem indiciar práticas de abuso de mercado por
denotarem um comportamento suspeito em virtude, nomeadamente, da
divulgação de informação ao mercado.
91
3. Sinais de alerta
Apresentam-se um conjunto de sinais de alerta, quer para o abuso de
informação, quer para a manipulação de mercado, que devem desencadear a
análise exigida.
O elenco de sinais não é nem exaustivo, nem determinante da existência de
crime contra o mercado, constituindo apenas um ponto de partida para a
análise a levar a efeito pelo intermediário financeiro.
Abuso de informação e manipulação de mercado
Concentração anormalmente elevada de operações num determinado
instrumento financeiro (estando, por exemplo, envolvidos um ou mais
investidores qualificados com ligações ao emitente ou alguém com um
particular interesse no emitente);
Repetição não usual de operações entre um pequeno número de clientes
durante um certo período de tempo;
Concentração anormalmente elevada de operações e/ou ordens num só
cliente ou em diferentes contas de instrumento financeiro do mesmo cliente
ou num número limitado de clientes (especialmente se estes estiverem
relacionados uns com os outros).
Abuso de informação
O cliente abre conta e dá imediatamente ordem para execução de uma
operação significativa ou, no caso de um cliente não qualificado, dá
inesperadamente uma ordem para operação de uma grande quantidade de
um determinado instrumento financeiro, especialmente no caso de
insistência do cliente no sentido de que a ordem é muito urgente e deve ser
executada antes de um momento por ele especificado;
O comportamento do cliente ao nível das decisões de investimento é
incoerente com o comportamento anteriormente manifestado e com o seu
perfil (ex: tipo de instrumento financeiro em que investe, quantidade
investida, tempo de manutenção de participação adquirida);
O cliente solicita especificamente a imediata execução da ordem
independentemente do preço a que possa ser executada;
92
Operações significativas por parte de accionistas com participações
qualificadas e outros insiders do emitente antes do anúncio de informação
privilegiada.
Manipulação de mercado
Ordens ou operações sem outra justificação aparente que não seja a de
fazer subir ou descer o preço do instrumento financeiro ou de aumentar a
quantidade, particularmente no caso de a operação ser executada perto do
momento em que se forma o preço de referência;
Ordens que, em virtude da quantidade sobre que incidem em comparação
com o mercado para o instrumento financeiro em causa, terão um impacto
significativo sobre a oferta, a procura ou o preço daquele instrumento
financeiro, particularmente no caso de as ordens serem dadas perto de um
momento de formação de preço de referência;
Ordens ou operações que aparentem ter como objectivo fazer subir o preço
de um instrumento financeiro nos dias que antecedem a emissão de um
derivado com ele relacionado;
Ordens ou operações que aparentem ter como objectivo manter o preço de
um instrumento financeiro nos dias que antecedem a emissão de um
derivado com ele relacionado, quando a tendência do mercado seja de
descida;
Ordens ou operações que aparentem ter como objectivo manter o preço do
activo subjacente abaixo do preço de exercício de instrumento derivado
relacionado, na data da maturidade do instrumento derivado;
Ordens ou operações que aparentem ter como objectivo modificar o preço
do activo subjacente por força a que ultrapasse o preço de exercício de
instrumento derivado relacionado, na data da maturidade do instrumento
derivado;
Ordens ou operações que aparentem ter como objectivo modificar o preço
de liquidação de um instrumento financeiro derivado, quando este preço é
usado no cálculo das margens;
Ordens ou operações que aparentem ter como objectivo a modificação do
valor de uma posição, sem aumento nem diminuição da mesma;
93
Ordens ou operações que aparentem ter como objectivo fazer subir/descer o
preço médio ponderado da sessão ou de um determinado período da sessão;
Ordens ou operações que aparentem ter como objectivo fixar um preço de
mercado, quando a liquidez do instrumento financeiro ou a profundidade do
livro de ofertas não é suficiente para permitir a formação de um preço
durante a sessão (a menos que as regras de mercado ou as práticas de
mercado aceites e declaradas como tal pela autoridade de supervisão
permitam essas operações);
Operações que ultrapassem sistematicamente os limites de variação de
preços definidos;
Operações que modificam o spread bid-ask do livro de ofertas, quando esse
spread é factor determinante do preço das operações;
Ordens significativas dadas momentos antes do leilão de abertura/fecho e
cancelamento das mesmas alguns segundos antes de o livro de ofertas ser
fechado para a realização do leilão, de forma a que o preço de
abertura/fecho seja mais alto ou mais baixo do que seria sem a inserção e
retirada dessas ofertas, desde que este cancelamento não seja
motivado/justificado por divulgação de informação ao mercado.
4. A quem se comunicam as operações suspeitas?
A comunicação de operações suspeitas é dirigida à autoridade de supervisão do
país onde tem a sua sede ou onde a sua sucursal está estabelecida,
independentemente do mercado ou sistema onde os instrumentos estejam
admitidos à negociação ou do local de onde as ordens foram dadas.
5. Modo e conteúdo da comunicação (formulário)
A comunicação poderá ser feita telefonicamente ou por qualquer outro meio
idóneo para o efeito, devendo todavia ser confirmada por escrito, a pedido da
CMVM, quando este não seja o meio adoptado inicialmente.
Da comunicação devem constar os elementos inseridos no formulário em anexo.
94
6. Dever de segredo
A comunicação realizada fica sujeita a segredo. As operações e a comunicação
realizada não podem ser reveladas a mais ninguém.
Este dever de segredo não obsta a que a pessoa que realiza a comunicação
transmita a informação a outros colaboradores da mesma entidade,
designadamente aos seus superiores hierárquicos, a pessoas responsáveis por
áreas de supervisão ou de controlo do cumprimento ou a outros membros do
órgão de administração, cujo contributo possa ser relevante para essa decisão.
Todos os que tenham conhecimento da comunicação da operação ficam sujeitos
ao dever de segredo sobre tal facto.
A lei impõe também a confidencialidade da identidade da pessoa que subscreve
a denúncia e da entidade para quem trabalha.
Este regime de segredo só pode ser quebrado por determinação judicial e o
cumprimento de tal dever não dá origem a responsabilidade, exceptuando os
casos em que haja actuação de má-fé.
7. Comunicação de operações e dever de abstenção
Os intermediários financeiros e as sociedades gestoras de mercados e de
sistemas têm um dever de defesa de mercado que implica que se abstenham de
participar em operações ou de praticar actos susceptíveis de pôr em risco a
regularidade do funcionamento, a transparência e a credibilidade do mercado.
No caso de, após a análise, o intermediário financeiro concluir que as ordens ou
operações são susceptíveis de pôr em risco a regularidade de funcionamento, a
transparência ou a credibilidade do mercado, deve abster-se de praticar
quaisquer actos que possibilitem a sua concretização.
Neste caso, concluindo o intermediário financeiro que as suspeitas são
fundamentadas, deverá adoptar um de dois comportamentos:
A operação ainda não se concretizou e para a concretizar é essencial
a intervenção do intermediário financeiro. Nesta circunstância o
intermediário financeiro deve abster-se de realizar a operação, sob pena de
violação do dever de defesa do mercado e de o facto poder ter relevância
criminal.
95
A operação já se concretizou, tendo sido os indícios detectados a
posteriori. Neste caso o intermediário financeiro deve comunicar
imediatamente os factos à CMVM.
O cumprimento dos deveres de abstenção e de comunicação de operações
suspeitas pode justificar a não execução das ordens do cliente, fundamentando
desse modo um caso de incumprimento lícito da execução da operação.
A comunicação de operações suspeita que não seja efectuada de má fé traduz-
se no cumprimento de um dever legal e, por isso, não pode fundamentar uma
pretensão indemnizatória por eventuais danos sofridos por terceiros.
96
FORMULÁRIO PARA COMUNICAÇÃO DE OPERAÇÕES SUSPEITAS
1. Descrição da operação: Identificação das operações (data, hora, preço e quantidade); ordens dadas, com expressa identificação do tipo de ordem, momento da sua recepção, preços quantidades e condições de execução; identificação da estrutura de realização da operação, modalidade de negociação.
2. Identificação dos comitentes: Comitentes a quem a operação é imputada, sua identificação (com indicação do nome, NIF ou código de cliente usado internamente, podendo ainda ser indicada adicionalmente morada, telefones, data de nascimento ou profissão); identificação das carteiras envolvidas, códigos internos das mesmas, identificação das contas que liquidam as operações; confirmação sobre se o comitente é ou não o beneficiário económico da operação.
3. Identificação de terceiros: Identificação de outras pessoas envolvidas na operação (com indicação do nome, NIF ou código de cliente usado internamente, podendo ainda ser indicada adicionalmente morada, telefones, data de nascimento ou profissão), a que título intervêm, relação com os comitentes das operações. Identificação do beneficiário económico da operação se for diferente do comitente. Contas de valores e de títulos envolvidas.
4. Razões da suspeita: Motivos que levam a suspeitar da operação; distinção entre factos concretos e meras suspeitas.
97
5. Outra informação relevante: Identificação de qualquer outro elemento relevante não incluído nas descrições anteriores.
6. Qualidade da intervenção do intermediário financeiro na operação em
causa.
7. Identificação pessoa que efectua a comunicação:
Nome:
Intermediário Financeiro/Sociedade gestora:
Cargo no Intermediário Financeiro/Sociedade gestora:
Telefone:
E-mail:
98
99
COMUNICAÇÃO
DE OPERAÇÕES SUSPEITAS
(PÚBLICO EM GERAL)
CMVM
2008
100
FORMULÁRIO PARA COMUNICAÇÃO DE OPERAÇÕES SUSPEITAS Este formulário permite ao público em geral denunciar à CMVM eventuais operações suspeitas de que tenha conhecimento e que envolvam instrumentos financeiros. A CMVM analisa prioritariamente as comunicações com identificação do autor. As comunicações anónimas apenas são consideradas se aparentarem consistência. 1. Descrição da operação: (por favor inclua a seguinte informação sempre que possível: datas, instrumentos financeiros transaccionados, mercados relevantes, quantidades e preços das transacções)
2. Razões para suspeitar da operação que descreveu 3. Identificação dos intervenientes e/ou beneficiários directos ou indirectos da operação suspeita (nomes, moradas, contactos, localizações, etc.)
101
4. Outras informações significativas 5. (FACULTATIVO) Identificação do autor da comunicação (nome, morada, contacto, local de trabalho, etc.)
102
103
PROCEDIMENTOS GERAIS DE SUPERVISÃO
COM VISTA À DETERMINAÇÃO
DA PRESTAÇÃO DE ESCLARECIMENTOS
E DIVULGAÇÃO DE INFORMAÇÃO PRIVILEGIADA
RELATIVA A EMITENTES
CMVM
2008
104
I - Introdução
1. O presente documento descreve sinteticamente os procedimentos gerais de
supervisão com vista à determinação da prestação de esclarecimentos e divulgação
de informação privilegiada relativa a emitentes.
2. A divulgação destes procedimentos é vantajosa para os emitentes e para os
investidores. Os primeiros passam a ter conhecimento preciso dos seus
comportamentos esperados relativamente à divulgação da informação privilegiada.
Por sua vez, os investidores passam a saber o percurso que, em regra, é seguido
pela autoridade de supervisão tendo em vista garantir a imediata divulgação, em
termos completos, verdadeiros, actuais, claros e objectivos da informação
privilegiada relativa aos emitentes, contribuindo-se, assim, para a clarificação da
informação em que baseiam as suas decisões de investimento.
3. Ressalva-se, porém, que os procedimentos gerais constantes do presente
documento não constituem uma regra mecânica ou absoluta. Representando uma
orientação geral, eles são compagináveis com as adaptações e os procedimentos
específicos que sejam ditados pelas circunstâncias de cada caso concreto.
II - Condições de Activação Interna dos Procedimentos
4. Os procedimentos abaixo descritos devem ser desencadeados quando se
verifique uma das três seguintes situações:
(i) Detecção de variações anormais nos preços ou nas transacções;
(ii) Publicação de notícia ou rumor que se considere relevante de per si (e
que não corresponda a informação privilegiada já divulgada);
(iii) Rumor que circule no mercado, ainda que em circuitos restritos, de que
a CMVM tenha conhecimento.
5. Para o efeito de (i) deve considerar-se que existe uma anormalidade nos preços
e transacções desde que os preços correntemente praticados ou os volumes não
sejam explicados, nem pelas cotações de partida, nem pela evolução histórica
recente do activo, nem pela variação entretanto ocorrida noutros activos, nem pela
informação divulgada ao mercado pelo emitente.
105
6. As situações (ii) e (iii) devem apenas contemplar as notícias e os rumores
relativos a casos que previsivelmente sejam materialmente relevantes e que
respeitem a situações tidas a priori como enquadráveis no conceito de informação
privilegiada, considerando-se para este efeito, pelo menos, as seguintes:1
performance operacional; alterações no controlo e acordos relativos ao controlo;
alterações nos órgãos de administração, supervisão e fiscalização; alterações nos
auditores externos ou qualquer outra informação relacionada com a actividade do
auditor; operações envolvendo o capital próprio, a emissão de obrigações e a
emissão de valores mobiliários que dêem direito a adquirir ou subscrever outros
valores mobiliários; decisões de emitir ou diminuir o capital social; aquisições, splits
e spin-offs; compra ou alienação de interesses accionistas ou outros activos
relevantes ou ramos da actividade da empresa; reestruturação ou reorganização
que tenha efeito nos activos, passivos, situação financeira, proveitos ou custos da
empresa; decisões relativas a programas de buy-back ou transacções em outros
instrumentos financeiros admitidos à cotação em bolsa; alterações nos direitos das
acções cotadas; declaração de falência; disputas legais; revogação ou
cancelamento de linhas de crédito por um ou mais bancos; dissolução ou
verificação de causa de dissolução; alterações no valor dos activos; insolvência de
devedores relevantes; redução do valor dos activos imobiliários; destruição física de
mercadorias não seguras; novas licenças, patentes e registo de marcas; diminuição
ou aumento do valor da carteira de activos financeiros; diminuição no valor de
patentes, direitos ou activos intangíveis devido à inovação do mercado; recepção
de ofertas de aquisição para activos relevantes; inovações em produtos ou
processos; responsabilidades incorridas por produtos vendidos ou por impactos
ambientais causados; alterações nos resultados esperados ou perdas; ordens
recebidas dos clientes, seu cancelamento e alterações importantes; retirada ou
entrada em novas áreas de negócio; alterações na política de investimento do
emitente; data ex-dividend, alterações na data de pagamento de dividendos ou no
montante dos dividendos; alterações na política de dividendos.
1 Segue-se o documento Level 3 – Second set of CESR guidance and information on the common operation of the Directive to the market. Vd., mais desenvolvidamente, o documento “Entendimentos da CMVM sobre a Divulgação de Informação Privilegiada por Emitentes: Conceitos, Linhas de Orientação, Exemplos e Condutas a Adoptar”, 2008.
106
III - Passo 1: Procedimentos Preliminares
7. A CMVM desencadeia o procedimento de imediato após a ocorrência de uma das
situações descritas no n.º 4, verificando internamente se existe informação
privilegiada entretanto divulgada pelo emitente que justifique as situações
detectadas.
8. Além disso, sempre que entenda adequado, a CMVM contacta os intermediários
financeiros que se encontram mais activos no valor mobiliário em causa, de modo a
indagar sobre potenciais explicações para as anormalidades detectadas em termos
dos preços e/ou das quantidades transaccionadas.
9. Após estes procedimentos, a CMVM faz uma análise das circunstâncias concretas
do caso, e:
(i) Se concluir que o caso não tem nem é passível de ter impacto material
ou que os preços ou níveis de transacção anormais verificados se baseiam
exclusivamente nas expectativas dos investidores e em informação que já é
pública, dará por concluído o procedimento, sem mais diligências adicionais;
(ii) Se, pelo contrário, os resultados das diligências efectuadas não
permitirem concluir naquele sentido, passar-se-á à fase seguinte (Passo 2).
IV - Passo 2: Procedimentos subsequentes
A) Esclarecimentos pelo emitente e/ou terceiro
10. A CMVM contactará o representante do emitente para as relações com o
mercado e/ou o terceiro legalmente obrigado a prestar esclarecimentos (pe, um
investidor) com o fim de indagar o seu ponto de vista sobre a circunstância que
desencadeou o procedimento.
11. No caso de o representante para as relações com o mercado necessitar de
efectuar consultas internas, deverá responder de forma completa, total e
inequívoca à CMVM no prazo que esta lhe fixar, tendo em conta as circunstâncias
do caso (Prazo para Esclarecimento da CMVM).
107
12. Passar-se-á de imediato para o “Passo 3” (n.ºs 17 e ss.), no caso de a CMVM
não conseguir:
* Contactar o representante para as relações com o mercado em prazo
razoável;
* Contactar o terceiro legalmente obrigado a prestar a informação ou obter
junto dele os esclarecimentos necessários no prazo de 15 minutos.
B) Informação Preliminar ao Mercado
13. Se entender que tal é necessário para assegurar o bom funcionamento do
mercado, a CMVM pode determinar desde logo, ainda antes de recebidos os
esclarecimentos, a divulgação de informação ao mercado num prazo que fixe para o
efeito. Neste caso a CMVM pode informar os investidores de que contactou o
emitente e/ou o terceiro legalmente obrigado a prestar informação e lhes ordenou a
publicação de um comunicado no prazo fixado.
C) Hipóteses Quanto aos Esclarecimentos
14. Nos esclarecimentos prestados pelo emitente e/ou o terceiro legalmente
obrigado a prestá-los, além do que mais seja solicitado pela CMVM, e sem prejuízo
do completo esclarecimento da situação em termos consentâneos com a legislação
em vigor, a entidade emitente e/ou o terceiro devem indicar inequivocamente qual,
das seguintes hipóteses justifica, em seu entender, o facto que deu origem ao
procedimento:
• H1): trata-se da difusão prematura, parcial ou distorcida de um evento
real (ocorrido ou em curso);
• H2): trata-se de uma notícia ou um rumor sem fundamento em um
evento real (ocorrido ou em curso) ou que seja conhecido pelo emitente,
pelo que nada do que aconteceu ou está em curso na vida da empresa
nem qualquer facto que seja do seu conhecimento poderá justificar a
circunstância que deu origem ao procedimento;
• H3): trata-se de uma anormalidade nas cotações ou nos volumes de
transacção sem fundamento em um evento real (ocorrido ou em curso)
que não seja já totalmente conhecido do público, pelo que se deve
considerar que as transacções de mercado são exclusivamente baseadas
108
na informação já disponível e nas expectativas dos investidores.
D) Decisão da CMVM
15. Obtidos, analisados e avaliados os esclarecimentos obtidos, a CMVM decidirá
por uma das hipóteses seguintes:
(i) Dá por findo o procedimento, sem diligências adicionais, se concluir que o caso
não tem impacto material ou que os preços ou níveis de transacção anormais
verificados se baseiam exclusivamente nas expectativas dos investidores e em
informação que já é pública, como, em regra, sucederá, nomeadamente, na
hipótese H3) prevista no ponto anterior;
(ii) Caso se verifiquem as hipóteses H1) e H2) do ponto anterior, pode determinar,
se não o tiver feito anteriormente (n.º 13), ao emitente e/ou ao terceiro legalmente
obrigado a prestar informação que emita um esclarecimento ao mercado2, fixando-
lhes para o efeito um determinado prazo, de acordo com as circunstâncias do caso
(Prazo para Emissão de Esclarecimento ao Mercado). Tal pode ocorrer:
a) Sem suspensão da negociação do valor mobiliário.3 Neste caso a CMVM
pode, se os interesses dos investidores o justificarem, informar o mercado, através
do seu sítio da Internet, de que determinou a prestação de esclarecimentos pelo
emitente e/ou terceiro e o prazo em que estes os devem prestar;
b) Com suspensão da negociação do valor mobiliário, diligenciando a CMVM,
junto da entidade gestora do mercado, essa suspensão ou determinando-a ela
própria. Neste caso, a CMVM informa o mercado, através do seu sítio da Internet de
que determinou/solicitou a suspensão da negociação à entidade gestora do
mercado bem como a prestação de esclarecimentos pelo emitente e/ou terceiro e o
prazo em que estes os devem prestar.
2 Sendo caso disso, este esclarecimento pode, inclusivamente, consistir na informação ao mercado pela empresa ou pelo terceiro de que não conhece qualquer fundamento para a situação que desencadeou o procedimento. 3 Os Procedimentos constantes deste documento, quando envolvam a tomada de medidas sobre a negociação, deverão ser solicitados e articulados com a entidade gestora do mercado. Para este efeito, quando se utilizar a expressão “suspensão da negociação”, quer-se referir a suspensão ou outra medida de efeito semelhante adequada ao caso que possa ser adoptada pela entidade gestora, como a consolidação de ofertas.
109
E - Impossibilidade de Esclarecimento Antes do Início da Sessão de Bolsa
16. No caso de o procedimento ter sido desencadeado antes do início da sessão de
bolsa e de, até esta se iniciar, a CMVM não conseguir obter os esclarecimentos, por
razões não imputáveis à entidade emitente ou a terceiro, será
diligenciada/determinada a suspensão da cotação nas situações em que, atentas as
circunstâncias concretas do caso, seja previsível que a notícia ou o rumor venha a
ter impacto relevante nas cotações.
Esta suspensão pode ter lugar mesmo antes de desencadeado o contacto com o
representante para as relações com o mercado ou o terceiro (n.ºs 10 e ss).
V - Passo 3: Aviso Público de Determinação Urgente de Prestação de Informação
17. A CMVM pode emitir um Aviso Público de Determinação Urgente de Prestação
de Informação, designadamente quando, por causa que não lhe seja imputável, não
consiga contactar, num prazo razoável, a entidade emitente ou o terceiro ou não
tenham sido prestados por estes, no prazo fixado, os esclarecimentos devidos ou
publicada a informação solicitada, com os requisitos exigidos pelo artigo 7º do
Código dos Valores Mobiliários.
18. A Determinação é notificada ao emitente e/ou ao terceiro a que respeite. O
Aviso Público, que inclui o conteúdo da Determinação, deve ser feito através do site
da CMVM.
19. Este Aviso Público poderá ser precedido de suspensão da cotação, aplicando-se
a este respeito, com as devidas adaptações, o referido no Passo 2 (n.º 15).
VI - Passo 4: Levantamento da Suspensão da Negociação e Abertura de Processos
20. Nos casos em que tenha ocorrido a suspensão da negociação, a CMVM solicitará
à entidade gestora do mercado o seu levantamento, designadamente:
110
a) Após a entidade emitente ter informado o público de forma legalmente adequada
ao retomar do normal funcionamento do mercado, podendo fixar uma hora para o
reinício da negociação que conceda aos investidores um período não inferior a 10
minutos para análise e assimilação da nova informação;
b) Quando, mostrando-se incumpridos pelo emitente ou por terceiro os prazos
fixados para a prestação de informação ou de esclarecimentos ou uma ou outros
não tenham sido prestados de forma legalmente adequada, a continuação da
suspensão se mostre desproporcionada tendo em conta os interesses dos
investidores.
21. A CMVM publicará um aviso no seu site da Internet sobre a hora ou sessão em
que se prevê o levantamento da suspensão da negociação.
22. Adicionalmente, no caso previsto no n.º 20-b), a CMVM emitirá um alerta os
investidores de que não foi possível, por razões que não lhe são imputáveis, obter a
informação solicitada e recomendará particular cuidado nas decisões de
investimento ou desinvestimento.
VII - Passo 5: Abertura de Processos
23. Qualquer que seja a fase ou passo em que o procedimento se encontre, sempre
que se conclua que:
- Existem indícios de omissão de difusão de um evento real ou deste ter sido
objecto de difusão prematura, parcial, distorcida ou de qualquer outro
modo desconforme com o disposto no artigo 7º do Código de Valores
Mobiliários, a CMVM dará início a outros procedimentos destinados a
investigar, nomeadamente, a eventual prática de abuso de mercado;
- Existem indícios de se ter tratado de difusão de rumor ou de falsa notícia
com o intuito de manipular o mercado, a CMVM dará início a
procedimentos destinados a investigar e verificar essa eventual prática;
- Os emitentes ou terceiros não prestaram os esclarecimentos necessários
nos prazos determinados, a CMVM abrirá os competentes processos
sancionatórios.
111
PROCEDIMENTOS GERAIS DE SUPERVISÃO
COM VISTA À DETERMINAÇÃO
DA PRESTAÇÃO DE ESCLARECIMENTOS
E DIVULGAÇÃO DE INFORMAÇÃO PRIVILEGIADA
RELATIVA A EMITENTES
FLUXOGRAMA DE PROCEDIMENTOS
CMVM
2008
112
Procedimentos de Supervisão de Informação Privilegiada
Passo 1
Pressupostos para desencadear o procedimento
A. Detecção de anomalias
(preços/quantidades)
B. Publicação de notícia ou rumor
C. Circulação de rumor ou ou
CMVM verifica se há informação privilegiada divulgada pelo emitente que explique a
anomalia
SIM
O procedimento extingue-se
NÃO
CMVM contacta IF’s activos no mercado para indagar sobre explicações para a anomalia
CMVM analisa as explicações dos IF’s
1. O caso tem ou pode ter impacto material e 2. Os preços e quantidades anormais não são baseados exclusivamente nas expectativas dos investidores nem em informação pública
NÃO
O procedimento extingue-se
SIM
PASSO 2
Negociação Informação
CMVM verifica se se trata de informação que já tenha sido
comunicada anteriormente pelo emitente
SIM
O procedimento extingue-se
NÃO
113
Passo 2
CMVM contacta o representante do emitente para as relações com o mercado (RRM) para indagar sobre anormalidade e
integrar a situação em H1, H2 ou H3
CMVM consegue contactar o RRM em
15 minutos
CMVM não consegue contactar RRM em
15 minutos
RRM pede tempo para consultar o
órgão de administração
CMVM fixa prazo de resposta
Emitente não divulga ao mercado informação
com os requisitos e no prazo definidos pela
CMVM
RRM presta os esclarecimentos à
CMVM integrados em H1, H2 ou H3
PASSO 3
CMVM determina desde logo publicação
de informação ao mercado
CMVM não determina desde logo publicação
de informação ao mercado
CMVM pode informar os investidores de que
contactou o emitente e ordenou a publicação de informação no prazo “x”
Emitente divulga informação ao
mercado no prazo fixado e nos termos
do artigo 7º do CódVM
PASSO 4 O procedimento
extingue-se
Emitente presta informação à CMVM
no prazo que lhe tiver sido dado, integrada
em H1, H2 ou H3
114
Passo 3
CMVM analisa e avalia esclarecimentos que lhe foram prestados
CMVM determina ao emitente que emita um esclarecimento
ao mercado, fixa o prazo e diligencia junto da entidade
gestora do mercado ou determina ela própria a suspensão da negociação
CMVM informa o mercado no seu site que
solicitou/determinou a suspensão da negociação e a
divulgação de esclarecimentos pelo
emitente e em que prazo
Emitente divulga informação ao mercado
no prazo e de acordo com o artigo 7º do CódVM e
enquadrando-a em H1, H2 ou H3
PASSO 4
O procedimento extingue-se
CMVM determina ao emitente que emita um esclarecimento
ao mercado e fixa o prazo, sem que haja lugar à
suspensão da negociação
O procedimento extingue-se
Emitente não divulga ao mercado
informação com os requisitos e no prazo definido pela CMVM
CMVM pode publicar através do seu site informação de
que determinou a prestação de esclarecimentos pelo emitente e em que prazo
CMVM solicita à entidade gestora de mercado o
levantamento da suspensão da negociação
Emitente divulga informação ao mercado
no prazo e de acordo com o artigo 7º do CódVM e
enquadrando-a em H1, H2 ou H3
CMVM fixa uma hora para reinício da negociação que permita aos
investidores um período não inferior a 10 minutos para analisar
e assimilar a nova informação.
CMVM publica no seu site a hora ou sessão em que
prevê o levantamento da suspensão da negociação
O procedimento extingue-se
115
Passo 4
Emitente não divulga informação ao mercado com os requisitos e no prazo fixados
pela CMVM
CMVM não emite aviso público de que determinou a
prestação urgente de informação
Caso a negociação esteja suspensa e a manutenção da
suspensão seja desproporcionada face aos interesses dos
investidores, a CMVM solicita à entidade gestora do mercado o seu levantamento e emite um alerta aos investidores informando não
ter sido possível obter a informação solicitada e
recomendando particular cuidado nas decisões de investimento.
CMVM notifica emitente da determinação de prestação
urgente de informação
CMVM emite aviso público de que determinou a
prestação urgente de informação
Caso a negociação esteja suspensa e sua manutenção não
seja desproporcionada, mantém-se até que o emitente preste informação ao mercado.
ou
116
117
RECOMENDAÇÕES DA CMVM
RELATÓRIOS DE ANÁLISE FINANCEIRA
SOBRE INSTRUMENTOS FINANCEIROS
(RESEARCH)
CMVM
2008
118
SUMÁRIO
Introdução 119
I. Recomendações dirigidas às entidades emitentes 121
II. Recomendações dirigidas aos intermediários financeiros
e outros analistas 123
III. Recomendações dirigidas a jornalistas 125
IV. Recomendações dirigidas aos investidores 126
119
Introdução
1. A elaboração de estudos de investimento, análise financeira ou outras
recomendações genéricas relacionadas com operações em instrumentos
financeiros (research) é um serviço auxiliar dos serviços de investimento, nos
termos da alínea c) do artigo 291.º do Código dos Valores Mobiliários (CdVM),
com a redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de Outubro
de 2007.
A actividade de research é uma actividade com valor para o mercado de capitais
na medida em que os estudos elaborados pelos analistas financeiros, enquanto
análise do valor dos emitentes, contribuem para o aumento da visibilidade dos
mesmos e do próprio mercado onde os instrumentos financeiros estão admitidos
à negociação.
A informação respeitante a instrumentos financeiros e a emitentes deve, em
geral, ser completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita, o que inclui a
informação inserida em relatório de análise financeira de determinado emitente
ou de valores mobiliários por este emitidos (art. 7.º, n.º 1 e 2 do CdVM). Por
outro lado, a informação contida em relatório de análise financeira e as
recomendações para investimento dele constantes são susceptíveis de
influenciar as decisões do público investidor.
2. Todos os intervenientes no mercado de instrumentos financeiros,
nomeadamente os emitentes de valores mobiliários e os intermediários
financeiros, devem adoptar, nas relações que estabelecem entre si e com o
público investidor, uma política equitativa e de transparência, actuando de
acordo com elevados padrões de diligência e lealdade e orientando a sua
actividade de modo a evitar ou reduzir ao mínimo o risco de ocorrência de
conflito de interesses. As exigências legais quanto à divulgação de informação
pelos emitentes visam evitar, entre ouros aspectos, assimetrias injustificadas no
acesso à informação privilegiada. Por isso, qualquer facto ocorrido na esfera de
actividade do emitente que não seja do conhecimento público e que seja
susceptível de influir, de maneira relevante, no preço dos valores mobiliários ou
outros instrumentos financeiros é obrigatoriamente divulgado pelo emitente, em
termos imediatos, ao público investidor. Se tal não acontecer a informação deve
120
manter-se num círculo reservado, por exigência legal, pelo que a colaboração
prestada pelo emitente com vista a assegurar a qualidade da informação
contida em relatório de análise financeira não abrange a prestação de
informação confidencial.
3. Estão sujeitas à supervisão da CMVM todas as pessoas ou entidades que
exerçam, a título principal ou acessório, actividades relacionadas com a
negociação de instrumentos financeiros, nomeadamente, de análise financeira.
Compete à CMVM, na supervisão que realiza, contribuir para o reforço e o
controlo da qualidade da informação, incluindo a divulgada em relatório de
análise financeira, visando nomeadamente a protecção do público investidor.
Para efeitos das presentes Recomendações, entende-se por research a
actividade de pesquisa e análise de determinado emitente ou instrumentos
financeiros com vista à elaboração de um relatório onde se formula uma opinião
sobre o emitente e/ou os instrumentos analisados; uma previsão quanto ao
respectivo desempenho ou evolução; ou uma recomendação genérica, directa
ou indirecta, de investimento ou desinvestimento sobre um emitente, valores
mobiliários por ele emitidos ou outros instrumentos financeiros.
As presentes Recomendações substituem as anteriores sobre o mesmo tema e
não excluem nem se sobrepõem aos deveres decorrentes da lei nesta matéria,
nomeadamente aos decorrentes dos artigos 7.º, 12.º-A e ss, 309.º e ss, 378.º,
379.º e 389.º do CdVM.
Nestes termos e com os fundamentos expostos, a CMVM, ao abrigo do artigo
370.º do CdVM, aprova as seguintes recomendações:
121
Parte I. Recomendações às entidades emitentes
Recomenda-se aos emitentes que no âmbito da relação com os analistas financeiros
para a elaboração de relatórios de análise financeira e quanto à informação que
lhes é prestada:
1. Contribuam para que os analistas financeiros avaliem de forma correcta e
isenta a empresa analisada e os valores mobiliários por esta emitidos,
nomeadamente explicando e fazendo compreender a sua estratégia e
objectivos empresariais.
2. Diferenciem claramente a informação respeitante à actual situação económica
e financeira da empresa, dos objectivos, previsões ou perspectivas
relativamente à sua actividade, negócios ou resultados.
3. Indiquem, com clareza e objectividade, os pressupostos e os critérios utilizados
na formulação dos objectivos, previsões ou perspectivas que realizam.
4. Actualizem as informações que tenham sido anteriormente transmitidas aos
analistas financeiros, nomeadamente através da sua revisão periódica.
5. Se abstenham de exercer, nesse momento ou no futuro, qualquer influência
sobre o analista financeiro, em relação ao conteúdo do relatório de análise
financeira e ao sentido das recomendações a formular pelo analista financeiro.
6. Elaborem uma lista com a identificação dos analistas financeiros que
demonstraram interesse em emitir recomendações de investimento, nos
últimos 12 meses, sobre a empresa ou valores mobiliários por ela emitidos,
para divulgação na área pública do seu site, identificando ainda os analistas
financeiros que participaram em roadshows da empresa realizados, nos
últimos 12 meses.
7. Convidem, com a antecedência adequada, todos os analistas financeiros
constantes das listas referidas no ponto anterior para participar em sessões de
apresentação no âmbito de roadshows ou reuniões de analistas promovidas
directa ou indirectamente pela empresa.
8. Divulguem a todos os analistas financeiros referidos no ponto 6 anterior, a
informação apresentada nos roadshows ou reuniões realizadas
122
independentemente da sua presença nessas reuniões, sem prejuízo da
informação pública a divulgar oportunamente.
9. Não respondam de forma improvisada a questões que lhes sejam colocadas de
forma a evitar divulgar informação privilegiada.
10. No final de cada reunião, difundam um resumo das respostas dadas, quando
não se trate de reiterar informação que já seja pública.
11. Utilizem o seu site para dar a conhecer ao público em geral as reuniões e
encontros que organizam com os seus analistas, e transmitam em tempo real
através do seu site, sempre que possível, essas reuniões e encontros, sendo
particularmente recomendada essa transmissão nos casos em que haja
alguma forma de limitação de acesso por presença física.
12. As empresas que se abstenham de nomear ou contratar técnicos analistas
que tenham estado envolvidos na cobertura da empresa nos últimos 2 anos.
13. As empresas que perspectivem ou preparem ofertas públicas iniciais, com as
necessárias adaptações, cumpram igualmente com as recomendações
constantes dos pontos anteriores e assegurem que os analistas do sindicato
de colocação não disponham de mais informação relevante sobre a sociedade
que o resto do mercado, nem a ela acedam antecipadamente ou com maior
detalhe.
123
Parte II. Recomendações aos intermediários financeiros e outros analistas
Recomenda-se aos intermediários financeiros e outros analistas que na elaboração
e divulgação de relatórios de análise financeira:
1. Sejam destacados, entre outros, os seguintes aspectos na informação que
devem legalmente constar na publicação das recomendações de investimento:
1.1. A ligação do intermediário financeiro, ou do analista financeiro, com o
emitente dos valores mobiliários objecto da recomendação de investimento a
quem tenha, nomeadamente, prestado serviços bancários ou mantido outras
relações comerciais;
1.2. A participação em consórcio ou em contratos de consórcio para
assistência ou colocação dos valores mobiliários emitidos pelo emitente,
independentemente da qualidade da participação, nos 12 meses anteriores à
elaboração da recomendação;
1.3. Os acordos materialmente relevantes estabelecidos entre o emitente e o
autor da recomendação de investimento, susceptíveis de influenciar a análise
dos investidores;
1.4. A detenção de instrumentos financeiros objecto de recomendação por
parte dos analistas financeiros e/ou dos intermediários financeiros dos quais
são colaboradores;
1.5. A indicação expressa sobre se o emitente tomou ou não conhecimento da
recomendação e da eventual validação dos pressupostos apresentados no que
se refere à informação pública sobre o emitente, antes da divulgação.
2. Insiram, nos relatórios de análise financeira, alertas dirigidos aos investidores
não profissionais para o risco inerente à recomendação efectuada e para o
facto de a mesma ser susceptível de alteração face à evolução do meio
envolvente da empresa analisada ou à modificação das previsões,
pressupostos e métodos utilizados.
3. Quando emitam publicamente uma sugestão de investimento ou
desinvestimento em valores mobiliários de determinado emitente:
124
3.1. Disponibilizem o relatório de análise financeira subjacente à
recomendação efectuada ou indiquem a localização ou o endereço informático
onde e a partir de que momento pode o relatório ser consultado;
3.2. Mencionem se o relatório teve, previamente, algum destinatário
específico, não sendo necessário a sua identificação;
3.3. Preparem um resumo do relatório que traduza com rigor o seu conteúdo,
para permitir que quem o divulga (de forma sintética) possa reproduzir
fielmente e sem distorções a opinião dos seus autores, designadamente no
que respeita aos principais factores que condicionam o preço-alvo (price
target) ou a recomendação de investimento, e possa informar sobre a
existência de situações de conflitos de interesse.
4. Validem sistematicamente a coerência dos modelos de análise financeira,
designadamente no que se refere ao método de avaliação e aos pressupostos
utilizados.
5. Divulguem, com um intervalo temporal de 3 meses, na área pública do seu
site, o histórico das recomendações de investimento elaboradas e divulgadas
nos últimos 12 meses, organizado por entidade emitente, com informação
relativa à data de divulgação da recomendação, o preço-alvo, o sentido da
recomendação, o horizonte temporal do preço-alvo e da recomendação, a
identificação do analista que emitiu a recomendação, a análise dos desvios
dos preços-alvo face aos preços de mercado verificados e o grau de acerto das
recomendações emitidas.
6. Divulguem, em disclaimer, informação relativa à presença do analista
financeiro em reuniões de preparação da participação do intermediário
financeiro na colocação ou assistência em ofertas públicas de valores
mobiliários emitidos pelo emitente objecto da recomendação.
125
Parte III. Recomendações aos jornalistas
Recomenda-se aos jornalistas que divulgam relatórios de análise financeira que:
1. Sempre que elaborem notícias sobre relatórios de análise financeira,
procurem reproduzir os respectivos resumos de forma a traduzir com rigor a
opinião dos seus autores.
2. Sempre que elaborem notícias com base em informações que lhe são dadas
oralmente pelos autores dos relatórios de análise financeira ou outras
fontes, confirmem que essas informações correspondem efectivamente ao
teor dos relatórios.
3. Evitem redigir títulos que se limitem à indicação do preço-alvo ou da
recomendação de investimento e sejam susceptíveis de induzir uma
percepção errada da análise efectuada no relatório de análise financeira, e
sempre que redijam títulos que mencionem o preço-alvo ou a recomendação
de investimento salientem no texto imediatamente subsequente (led) os
principais pressupostos que condicionam a sua verificação.
4. Noticiem a existência de conflitos de interesse, destacando designadamente
os identificados no relatório de análise financeira.
5. Noticiem os limites inferiores e superiores do intervalo de preço-alvo e o
respectivo horizonte temporal constante do relatório de análise financeira, e
não apenas o preço-alvo máximo ou a recomendação de investimento.
6. Sempre que noticiarem um novo preço-alvo ou uma nova recomendação de
investimento, de igual modo noticiem os anteriores preços alvo e
recomendações de investimento efectuadas por essa entidade ou autor para
o valor mobiliário em causa nos 12 meses antecedentes, e igualmente
informem sobre os desvios dos preços-alvo face aos preços de mercado
verificados e sobre o grau de acerto das recomendações.
7. Sempre que noticiarem um novo preço-alvo ou uma nova recomendação de
investimento, de igual modo noticiem os preços-alvo, as recomendações de
investimento, e os respectivos horizontes temporais emitidos por outras
entidades para o valor mobiliário em causa nos três meses antecedentes.
126
Parte IV. Recomendações aos investidores
Recomenda-se aos investidores que habitualmente baseiem as suas decisões de
investimento em relatórios de análise financeira que:
1. Diversifiquem as fontes de informação, nomeadamente os relatórios de
análise financeira, para a tomada de decisões de investimento.
2. Utilizem fontes de informação credíveis.
3. Procedam a uma análise do histórico de recomendações efectuadas pelo
intermediário financeiro e pelo analista financeiro, nomeadamente face à
rendibilidade resultante dessas recomendações.
4. Analisem a totalidade do relatório de análise financeira, nomeadamente os
pressupostos, as previsões e perspectivas do analista financeiro, as datas de
início, conclusão e divulgação do relatório e as conclusões, assim como o
horizonte temporal para o qual o preço-alvo e respectiva recomendação são
apresentados.
5. Dêem atenção aos alertas dirigidos, nos relatórios de análise financeira, aos
investidores não profissionais relativos a riscos e eventuais alterações das
previsões, pressupostos e métodos utilizados na realização de
recomendações.
6. Dêem atenção à análise da sensibilidade de variação dos pressupostos
utilizados nos relatórios de análise financeira.
7. Leiam a informação divulgada no relatório de análise financeira relativamente
às participações e relações comerciais da entidade que emite a
recomendação com o emitente objecto de recomendação, nomeadamente:
7.1. Existência de relações e circunstâncias susceptíveis de prejudicar a
objectividade da recomendação, designadamente a divulgação de
interesses do intermediário financeiro ou analista no instrumento
financeiro;
7.2. Existência de situações de potencial conflito de interesses;
127
7.3. Participações qualificadas detidas pelo autor da recomendação ou
por qualquer pessoa colectiva com ele relacionada;
7.4. Participação em contratos de consórcio para assistência ou
colocação dos valores do emitente em que o autor da recomendação
tenha participado ou participa;
7.5. Existência de acordos materialmente relevantes entre o emitente e
o autor da recomendação relativos a prestação de serviços bancários;
7.6. Relação existente entre a remuneração das pessoas envolvidas na
preparação ou elaboração da recomendação e operações bancárias de
investimento ou actividades de intermediação financeira prestadas ao
emitente objecto de recomendação;
7.7. Divulgação de informação relativa a operações bancárias de
investimento realizadas pelo intermediário financeiro autor da
recomendação relacionadas com o emitente objecto da recomendação;
7.8. Divulgação de informação relativa à presença do analista financeiro
em reuniões de preparação da participação do intermediário financeiro
na colocação ou assistência em ofertas públicas de valores mobiliários
emitidos pelo emitente objecto da recomendação.
8. Considerem a possibilidade de a recomendação constante do relatório de
análise financeira poder não ser adequada ao seu perfil de risco, à
diversificação da carteira de instrumentos financeiros, à sua experiência ou
disponibilidade para a gestão do investimento em instrumentos financeiros.
9. Tenham em consideração que o período de tempo decorrido entre a data de
elaboração de recomendações constantes de relatório de análise financeira e
a sua divulgação pública poder ter anulado o valor económico das mesmas.
10. Dêem especial atenção aos relatórios de análise financeira difundidos em
datas próximas de eventos relevantes para a empresa objecto de análise ou
para os mercados de valores mobiliários (tais como decisões de lançamento
de ofertas públicas ou aumentos de capital) atendendo à acrescida
susceptibilidade de verificação de conflito de interesses em tais situações.
128
11. Confirmem, se necessário, com o representante das relações com o
mercado, a validade da informação pública relacionada com o emitente
apresentada no relatório de análise financeira.
12. Consultem o seu intermediário financeiro, o qual tem deveres de diligência
e de lealdade para com o investidor e deveres de prestação da informação
necessária, para a tomada de uma decisão esclarecida de investimento ou
desinvestimento.
129
CONTRATOS DE LIQUIDEZ
COMO PRÁTICA DE MERCADO ACEITE
CMVM 2008
130
O processo de declaração da prática junto do CESR
A documentação necessária para desencadear o processo de declaração da prática
junto do CESR inclui a lista de factores de avaliação. Está em português por dever
ser submetido a consulta pública em Portugal, pelo que uma versão posterior em
inglês é essencial.
Descrição da PMA Nacional:
A prática de mercado aceite denomina-se “contrato de liquidez”. Uma sociedade aberta (o
emitente), cujas acções estejam admitidas à negociação num mercado regulamentado em
Portugal, pode celebrar um contrato (“contrato de liquidez”) com um intermediário financeiro
(instituição de crédito ou empresa de investimento), através do qual o emitente coloca à
disposição do intermediário financeiro (“IF”) uma certa quantidade de acções próprias ou uma
dada quantia, de forma a habilitar o IF a realizar operações de compra e venda no mercado a
contado, por conta do emitente, sobre acções por si emitidas.
As transacções a realizar por conta do emitente têm como objectivo aumentar a liquidez das
acções no mercado, seja através do aumento das quantidades transaccionadas e do número de
negócios executados, seja através de uma redução nos spreads entre as ofertas de compra e de
venda, de uma redução da volatilidade dos preços na negociação diária no mercado, em linha
com as tendências gerais do mercado.
Tem de ser respeitado o princípio da exclusividade, só podendo haver um contrato de liquidez
activo para cada categoria de acções e por cada IF e não se pode celebrar novo contrato com o
mesmo ou outro IF enquanto o contrato anterior não estiver terminado. Contudo, não é objectivo
do IF centralizar os negócios de compra e de venda, sendo salutar a sua ausência do mercado
nos momentos em que os investidores transaccionam com a regularidade pretendida.
O emitente só pode celebrar contrato de liquidez com um IF após obtida a autorização da
assembleia geral de acordo com o estipulado nos seus estatutos. A deliberação deve prever o
prazo máximo do contrato, incluindo prorrogações, o qual deve ser consentâneo com os
objectivos prosseguidos. As acções adquiridas em execução de contrato de liquidez não podem
ter outro fim que não seja a sua ulterior alienação em outra operação executada ao abrigo do
contrato. O prazo máximo de execução do contrato de liquidez, incluindo as possíveis
131
prorrogações não deve ser superior a 12 meses.
Os contratos de liquidez só podem ser celebrados com IF que sejam membros do mercado
regulamentado em que as acções estão admitidas à negociação e deve responsabilizar-se pela
independência dos seus colaboradores adstritos à execução do contrato de liquidez.
Todas as acções adquiridas pelo IF no mercado, em execução do contrato são levadas a uma
conta criada para o efeito, aberta em nome do emitente, e correspondem a acções próprias
sendo-lhes aplicado o regime previsto no Código das Sociedades Comerciais. Isto significa que
o contrato de liquidez deve prever que não seja ultrapassado o limite de 10% do capital em
acções próprias.
A conta de valores mobiliários terá como contrapartida uma conta de valores monetários,
também, aberta em nome do emitente onde são lançadas as importâncias pagas e recebidas na
execução das operações de compra e de venda.
Os registos nas contas de valores mobiliários devem conter, pelo menos, os seguintes
elementos: a quantidade transaccionada, o tipo de transacção (compra e venda), a data e a hora
da transacção, o preço unitário e a quantidade de acções detidas ao abrigo do contrato de
liquidez após a realização de cada operação.
O IF só pode transaccionar em execução de um contrato de liquidez durante o período normal
de negociação estabelecido pela entidade gestora do mercado regulamentado, não sendo
admitido transaccionar após o fecho do mercado e a sua actuação em leilões de abertura e de
fecho do mercado deve ser reduzida à eventual necessidade de proporcionar a concretização dos
preços de abertura ou de fecho em total respeito pelas expectativas de compradores e
vendedores. Não são permitidas operações de grandes lotes na execução do contrato de liquidez.
Não é permitido o registo de ofertas sem limite de preço nem ofertas aparentes e as ofertas são
válidas exclusivamente para a sessão em que forem introduzidas.
Não é permitido ao emitente transmitir qualquer outra instrução ao IF respeitante a decisões de
comprar ou vender. Caberá ao IF estabelecer a sua estratégia de actuação, devendo o emitente
suportar os riscos inerentes ao mercado. No entanto, o IF tem por obrigação aferir
permanentemente os níveis de preços no mercado e ajustar a sua actuação de acordo com a
tendência do mercado. Uma incorrecta percepção quanto ao valor que o mercado atribui às
acções poderá criar desequilíbrios entre os valores monetários disponíveis para adquirir e o
132
número de acções próprias disponíveis para venda. O IF informa diariamente o emitente sobre
os movimentos e saldos das contas.
A execução do contrato de liquidez deve ser suspensa se, durante a sua vigência for aprovado e
iniciado um programa de aquisição de acções próprias, se for realizada uma oferta pública de
acções ou se tiver sido anunciada uma oferta pública de aquisição sobre as acções do emitente.
As transacções realizadas não têm de cumprir as condições fixadas pelo artigo 5º do
Regulamento (CE) nº 2273/2003 da Comissão. A estas transacções não são aplicadas as
restrições previstas no artigo 6º do mesmo diploma. Porém, terão de ser cumpridas as seguintes
condições:
i) As ofertas inseridas nos leilões de abertura e de encerramento da sessão não podem exceder
10% da quantidade média transaccionada nas 20 sessões normais de bolsa imediatamente
antecedentes;
ii) A quantidade transaccionada ao abrigo do contrato de liquidez nos últimos 60 minutos da
sessão de bolsa não pode exceder 30% da quantidade total transaccionada ao longo da parte
restante da sessão de bolsa;
iii) No sua totalidade, as ordens de compra dadas ao abrigo do contrato de liquidez ao longo de
uma sessão de bolsa não podem exceder 25% da quantidade média transaccionada nas 20
sessões normais de bolsa imediatamente antecedentes;
iv) As ordens de compra em execução do contrato de liquidez não podem exceder o mais
elevado dos dois preços seguintes: a) Cotação do último negócio independente anterior; b)
Preço mais elevado de entre as ofertas de compra independentes existentes;
v) As ordens de venda em execução do contrato de liquidez não podem ser inferiores ao mais
baixo dos dois preços seguintes: a) Cotação do último negócio independente anterior; b) Preço
mais baixo de entre as ofertas de venda independentes existentes;
vi) Sem prejuízo do disposto em iv) e v), o spread máximo entre as ofertas de compra e de
venda inseridas em execução do contrato de liquidez não pode exceder 5% ou, se inferior, o
spread máximo permitido pelas regras do mercado regulamentado para os liquidity providers ou
pessoas similares.
Consideram-se ofertas independentes todas aquelas que não são executadas em cumprimento do
contrato de liquidez, nem resultem de operações de carteira própria do IF ou sejam por este
inseridas no âmbito de gestão discricionária de carteiras de terceiros.
Não cumprir com as condições indicadas seria abrir a porta a comportamentos susceptíveis de
133
gerar indicações enganosas sobre a oferta e a procura da acções e falsear a negociação. Os
comportamentos fora destas balizas como, por exemplo, o fecho de ofertas do IF entre si para a
conta do emitente poderão ser considerados actos de manipulação de mercado e, se for o caso,
violação do dever de defesa do mercado.
Do contrato de liquidez deverão constar, no mínimo os seguintes elementos:
a) identificação do valor mobiliário objecto do contrato, designadamente quanto à sua natureza,
espécie, categoria, valor nominal unitário, quantidade emitida e quantidade admitida à
negociação;
b) identificação das partes contratantes;
c) indicação das obrigações assumidas pelas partes contratantes, nomeadamente, a informação
que o IF deverá transmitir periodicamente ao emitente para efeitos de acompanhamento da
execução do contrato e permitir ao emitente cumprir as suas obrigações legais e consentâneas
com a prática de mercado e a proibição de transmissão de informação privilegiada pelo emitente
ao IF;
d) data prevista para o início da realização das operações, o prazo durante o qual se devam
executar e o número de prorrogações admitidas;
e) indicação da quantidade de valores mobiliários e de valores monetários inicialmente afectos à
execução do contrato, bem como os limites máximos e mínimos (se aplicável) de intervenção no
mercado, tanto diariamente como acumulado até ao termo do contrato;
f) a forma de actuar em relação a quaisquer desequilíbrios nos saldos de quantidades de acções
ou de valores monetários que coloquem em risco o objecto do contrato de liquidez;
g) indicação das contas de valores mobiliários e de valores monetários tituladas pelo emitente e
dedicadas à execução do contrato;
h) termo de responsabilidade do IF em como possui uma organização interna susceptível de
garantir a execução do contrato de liquidez de forma independente de qualquer outra área de
actividade adstrita a negociação de carteira própria, a negociação por conta de outrem e à gestão
discricionária de carteiras de clientes;
i) a forma de remuneração do IF, a qual não pode diminuir a sua independência face ao
emitente.
Antes de iniciar as transacções em execução de contrato de liquidez, a entidade emitente deve
publicitar – como informação privilegiada - os detalhes do contrato celebrado com os
intermediários financeiro, no que respeita: i) à identidade do intermediário; ii) à importância
monetária e à quantidade de valores mobiliários colocadas à disposição do intermediário
134
financeiro; iii) à quantidade máxima de acções que pode ser acumulada em carteira em
execução deste contrato; iv) o mercado e as acções a que respeita; e v) o prazo de vigência do
contrato. Qualquer alteração ao contrato durante a vigência do mesmo, a sua suspensão ou
expiração também devem ser comunicados como informação privilegiada.
Tanto as entidades emitentes, como os intermediários financeiros que executam os contratos,
têm de manter um registo individualizado das operações realizadas por um período de 5 anos
contados desde a data de encerramento das contas que lhe estavam adstritas e que deve coincidir
com o fim dos deveres e obrigações das partes no contrato.
As entidades emitentes comunicarão ao mercado, trimestralmente, as operações realizadas ao
abrigo do contrato de liquidez, indicando para cada transacção, o intermediário financeiro que a
realizou, a quantidade transaccionada, o tipo de transacção (compra e venda), a data da
transacção, o preço unitário e a quantidade de acções detidas ao abrigo do contrato de liquidez
após a realização de cada operação. Esta comunicação deve ser realizada através do sistema de
difusão da CMVM (na secção relativa à comunicação de transacção de acções próprias).
Além da cópia do contrato de liquidez que deve ser enviada à CMVM pelo emitente, a CMVM
poderá solicitar a cada emitente e a cada intermediário financeiro toda a informação que
necessitar para acompanhar a execução dos contratos de liquidez. Os contratos de liquidez não
se destinam a reforçar a quantidade de acções próprias, podendo a CMVM ordenar a suspensão
da sua execução se encontrar irregularidades no seu cumprimento ou indícios de abuso de
mercado.
A declaração de prática de mercado aceite é feita ao abrigo do regime da manipulação de
mercado e do dever de defesa do mercado e é feita sem prejuízo da aplicação das regras de
abuso de informação e da imposição das respectivas consequências legais.
135
Razões pelas quais a prática em questão poderia constituir manipulação de mercado:
Os contratos de liquidez envolvem a negociação com acções próprias mas não correspondem
aos objectivos enunciados no Regulamento (CE) 2273/2003 da Comissão de 22 de Dezembro,
não podendo beneficiar da exclusão de proibição prevista no artigo 8º da Directiva 2003/6/CE
do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de Janeiro (MAD). A realização de operações ou a
colocação de ofertas com o objectivo de aumentar a liquidez de acções no mercado, sendo
realizada fora dos mecanismos previstos na lei ou nas regras de mercado para o fomento de
liquidez pode ser considerada uma prática de manipulação de mercado e, se for o caso, violação
do dever de defesa do mercado, dada artificialidade que pode ser introduzida no mercado em
termos de volumes e de preços.
Lista (não exaustiva) de factores que devem ser tomados em consideração pela
autoridade competente para aferição das diferentes práticas susceptíveis de
ocorrer em mercado regulamentado ou em OTC:
a) O grau de transparência da prática em causa em relação ao mercado no seu conjunto.
A transparência das práticas de mercado por parte dos participantes constitui um critério
fundamental a ter em conta para determinar se uma dada prática pode ser aceite pelas
autoridades competentes. Quanto menos transparente for a prática, menos hipóteses terá de ser
aceite. No entanto, por razões estruturais pode acontecer que existam, nos mercados não
regulamentados, práticas menos transparentes do que práticas semelhantes em mercados
regulamentados. Estas práticas não devem, apenas por esse facto, ser consideradas inaceitáveis
pelas autoridades competentes. [Preâmbulo (2) da Directiva 2004/72/CE da Comissão de 29 de
Abril]
Conclusão CMVM:
Para lá do cumprimento da lei comercial aplicável a operações com acções próprias e a
sociedades abertas, o emitente deve divulgar ao mercado, através do sistema de difusão de
informação da CMVM e do seu site:
a) Antes de iniciar as transacções em execução de contrato de liquidez, deve publicitar os
136
detalhes do contrato celebrado com os intermediários financeiro, no que respeita: i) à identidade
do intermediário; ii) à importância monetária e à quantidade de valores mobiliários colocadas à
disposição do intermediário financeiro; iii) à quantidade máxima de acções que pode ser
acumulada em carteira em execução deste contrato; iv) o mercado e as acções a que respeita; e
v) o prazo de vigência do contrato.
b) Qualquer alteração ao contrato durante a vigência do mesmo, a sua suspensão ou expiração
também devem ser comunicados.
c) As operações realizadas ao abrigo do contrato de liquidez devem ser comunicadas
trimestralmente, indicando para cada transacção, o intermediário financeiro que a realizou, a
quantidade transaccionada, o tipo de transacção (compra e venda), a data da transacção, o preço
unitário e a quantidade de acções detidas ao abrigo do contrato de liquidez após a realização de
cada operação.
Uma cópia do contrato de liquidez deve ser enviada pelo emitente à CMVM previamente à
divulgação ao mercado exigida antes do início da execução do mesmo.
b) A necessidade de salvaguardar o jogo de forças do mercado e uma interacção adequada
entre a oferta e a procura.
As práticas de mercado que entravarem a interacção entre a oferta e a procura, limitando as
possibilidades de reacção dos outros participantes em determinadas operações são
especialmente susceptíveis de prejudicar a integridade do mercado, sendo, assim, menos
provável a sua aceitação pelas autoridades competentes. [Preâmbulo (1) da Directiva
2004/72/CE da Comissão de 29 de Abril]
Conclusão CMVM:
A prática não entrava a interacção entre a oferta e a procura. As operações concretizadas pelo IF
ao abrigo da prática em apreço assumem a natureza de reacção a intenções de compra ou de
venda introduzidas no mercado por investidores terceiros e que, não fosse a intervenção do IF,
poderiam não conseguir realizar os negócios que legitimamente procuravam ou de criarem
desequilíbrios na oferta ou na procura pelo simples facto de não existirem outras ofertas, de
contraparte, concorrenciais no mercado.
137
Os contratos de liquidez podem ter um impacto na interacção entre a oferta e a procura legítimas
no mercado e assim alcançar um mercado regular para acções que, de outra forma, seriam
consideradas ilíquidas.
c) A intensidade do impacto da prática de mercado em causa sobre a liquidez e a eficiência
do mercado.
As práticas de mercado que melhorem a sua liquidez são mais susceptíveis de serem aceites dos
que as práticas que a reduzam. [Preâmbulo (1) da Directiva 2004/72/CE da Comissão de 29 de
Abril]
Conclusão CMVM:
O objectivo da prática é o incremento da liquidez e da eficiência do mercado.
d) Em que medida a prática em causa tem em conta os mecanismos de negociação do
mercado em questão e permite aos participantes neste mercado reagirem de forma
adequada e oportuna face à nova situação do mercado por ela criada.
Conclusão CMVM:
Para efeitos de cumprir o contrato celebrado, o IF actua em mercado regulamentado, do qual é
membro, de acordo com as regras em vigor nesse mercado e dentro dos períodos normais de
negociação mas, com alguns princípios de actuação adicionais destinados a proteger o regular
funcionamento do mercado.
A declaração de prática de mercado aceite em Portugal envolve um conjunto de características
destinadas a reforçar o dever de defesa do mercado, nomeadamente:
i) As ofertas inseridas nos leilões de abertura e de encerramento da sessão não podem exceder
10% da quantidade média transaccionada nas 20 sessões normais de bolsa imediatamente
antecedentes;
138
ii) A quantidade transaccionada ao abrigo do contrato de liquidez nos últimos 60 minutos da
sessão de bolsa não pode exceder 30% da quantidade total transaccionada ao longo da parte
restante da sessão de bolsa;
iii) No sua totalidade, as ordens de compra dadas ao longo de uma sessão de bolsa não podem
exceder 25% da quantidade média transaccionada nas 20 sessões normais de bolsa
imediatamente antecedentes;
iv) As ordens de compra em execução do contrato de liquidez não podem exceder o mais
elevado dos dois preços seguintes: a) Cotação do último negócio independente anterior; b)
Preço mais elevado de entre as ofertas de compra independentes existentes;
v) As ordens de venda em execução do contrato de liquidez não podem ser inferiores ao mais
baixo dos dois preços seguintes: a) Cotação do último negócio independente anterior; b) Preço
mais baixo de entre as ofertas de venda independentes existentes;
vi) Sem prejuízo do disposto em iv) e v), o spread máximo entre as ofertas de compra e de
venda inseridas em execução do contrato de liquidez não pode exceder 5% ou, se inferior, o
spread máximo permitido pelas regras do mercado regulamentado para o liquidity provider ou
pessoas similares.
Não são permitidas operações de grandes lotes na execução do contrato de liquidez. Não é
permitido o registo de ofertas sem limite de preço nem ofertas aparentes e as ofertas são válidas
exclusivamente para a sessão em que forem introduzidas.
e) O risco que a prática em causa representa para a integridade dos mercados directa ou
indirectamente relacionados, regulamentados ou não, em que o instrumento financeiro é
negociado à escala da Comunidade.
As práticas de mercado inerentes a um dado mercado não devem comprometer a integridade dos
outros mercados da Comunidade que lhe estejam, directa ou indirectamente, associados,
independentemente de estarem ou não regulamentados. Por conseguinte, quanto maior for o
risco para a integridade de um mercado associado da Comunidade, menor será a probabilidade
de que estas práticas sejam aceites pelas autoridades competentes. [Preâmbulo (3) da Directiva
2004/72/CE da Comissão de 29 de Abril]
139
Conclusão CMVM:
Além da cópia do contrato de liquidez que deve ser enviada à CMVM pelo emitente, a CMVM
poderá solicitar a cada emitente e a cada intermediário financeiro toda a informação que
necessitar para acompanhar a execução dos contratos de liquidez. Os contratos de liquidez não
se destinam a reforçar a quantidade de acções próprias, podendo a CMVM ordenar a sua
suspensão se encontrar irregularidades no seu cumprimento ou indícios de abuso de mercado.
Tanto as entidades emitentes, como os intermediários financeiros que executam os contratos,
têm de manter um registo individualizado das operações realizadas por um período de 5 anos
contados desde a data de encerramento das contas que lhe estavam adstritas e que deve coincidir
com o fim dos deveres e obrigações das partes no contrato.
O IF deve responsabilizar-se pela independência dos seus colaboradores adstritos à execução do
contrato de liquidez.
Não é permitido ao emitente transmitir qualquer outra instrução ao IF respeitante a decisões de
comprar ou vender. Caberá ao IF estabelecer a sua estratégia de actuação, devendo o emitente
suportar os riscos inerentes ao mercado. No entanto, o IF tem por obrigação aferir
permanentemente os níveis de preços no mercado e ajustar a sua actuação de acordo com a
tendência do mercado e aplicar-se na correcta percepção quanto ao valor que o mercado atribui
às acções para não criar desequilíbrios entre os valores monetários disponíveis para adquirir e o
número de acções próprias disponíveis para venda. O IF informa diariamente o emitente sobre
os movimentos e saldos das contas.
O IF só pode transaccionar em execução de um contrato de liquidez durante o período normal
de negociação estabelecido pela entidade gestora do mercado regulamentado, não sendo
admitido transaccionar após o fecho do mercado e a sua actuação em leilões de abertura e de
fecho do mercado deve ser reduzida à eventual necessidade de proporcionar a concretização dos
preços de abertura ou de fecho em total respeito pelas expectativas de compradores e
vendedores.
O contrato de liquidez deve ser suspenso se, durante a sua vigência for aprovado e iniciado um
programa de aquisição de acções próprias, se for realizada uma oferta pública de acções ou se
tiver sido anunciada uma oferta pública de aquisição sobre as acções do emitente.
140
f) O resultado de qualquer inquérito sobre a prática de mercado em causa, realizado pela
autoridade competente ou qualquer outra autoridade referida no nº1 do artigo 12º da
Directiva 2003/6/CE, em especial quando a prática em questão infringiu as regras ou as
disposições destinadas a evitar o abuso de mercado ou não respeitou os códigos de
conduta, tanto no mercado em causa como nos mercados com ele relacionados, directa ou
indirectamente na Comunidade.
Conclusão CMVM:
Os contratos de liquidez têm vindo a ser celebrados embora o seu número seja desigual
consoante a jurisdição em que são celebrados. Uma prática de mercado com idênticas
características foi considerada aceite em França pela Autorité des Marchés Financiers, enquanto
outras práticas similares estão em processo de aprovação nos Países Baixos pela Autoriteit
Financiële Markten pelo Ministério das Finanças, onde passou por processo de consulta
pública, e em Espanha pela Comisión Nacional del Mercado de Valores.
Em Portugal a prática também segue um processo de consulta pública, não havendo até ao
momento qualquer sinal de quaisquer posições contrárias à aceitação desta prática de mercado.
Até à data, no âmbito das funções de supervisão da CMVM, não foi obtida qualquer conclusão
que fosse contrária à aceitação dos contratos de liquidez como prática de mercado.
g) As características estruturais do mercado em questão, nomeadamente o seu carácter
regulamentado ou não, os tipos de instrumentos financeiros negociados e o tipo de
participação nesse mercado, em especial o grau de participação dos pequenos investidores.
Conclusão CMVM:
A prática de mercado apenas diz respeito a acções admitidas à negociação em mercado
regulamentado, nos quais o envolvimento de investidores não qualificados pode ser
significativo.
141
A prática de mercado permite aumentar a probabilidade dos investidores encontrarem uma
contraparte com objectivos lícitos na sua actuação em acções de reduzida liquidez, sem risco
acrescido para os investidores.
A crescente integração das plataformas de negociação suscita um esforço acrescido de inovação
para evitar assimetrias de práticas em espaços de negociação comuns a mais do que uma
jurisdição, pelo que a prática de mercado denominada “contratos de liquidez” é aceite pela
CMVM.
Princípios fundamentais
Princípios fundamentais a ter em consideração pela Autoridade Competente para se
assegurar que as práticas de mercado aceites não contrariam a integridade dos mercados
mas, permitem o desenvolvimento da inovação e da dinâmica dos mercados financeiros:
As potenciais práticas de mercado aceites não devem ser excluídas de um processo de aceitação
apenas por falta de aceitação em momentos anteriores.
O regular funcionamento do mercado e a defesa da sua integridade são alcançados pela busca
incessante de eficiência e boas práticas de actuação pelos intervenientes no mercado.
As Autoridades Competentes devem monitorizar o impacto das práticas de mercado em face de
parâmetros tais como o preço médio ponderado para os instrumentos financeiros verificado
diariamente em sessões de mercado, preço diário de fecho e a sua evolução num período, e
condições específicas de mercado, antes de aceitar a prática de mercado.
Elementos condicionais
Elementos condicionais quanto à legitimidade das razões para realização das operações
e quanto á adequada execução das mesmas.
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Os princípios acima referidos foram tomados em consideração pela CMVM na aceitação da
prática de mercado denominada “contratos de liquidez”.
Compete à CMVM a supervisão das transacções executadas ao abrigo da prática de mercado
aceite e o acompanhamento do impacto da mesma sobre o mercado, devendo, para o efeito,
solicitar a colaboração da entidade gestora do mercado regulamentado em causa.